Sergipe, pátria de filósofos, filólogos, historiadores, fundadores e intérpretes da cultura brasileira é, também, um útero de poetas. Pedro de Calasans, Bitencourt Sampaio, Tobias Barreto, Fausto Cardoso, Hermes Fontes deixaram seus nomes na galeria dos grandes poetas do Brasil, e ainda hoje suas obras são citadas e estudadas. Pedro de Calasans, nascido na região da Estância, mereceu de Fausto Cunha um alentado estudo crítico na obra coletiva A Literatura no Brasil, dirigida por Afrânio Coutinho. Fausto Cunha chega a considerar Calasans um “cassimiriano avant la letre”, na transição da poesia romântica para o realismo. Bittencourt Sampaio, filho de Laranjeiras, consagrou sua poesia em peças musicais – modinhas, hinos acadêmicos, canções – como a bela Quem Sabe, versos musicados pelo maestro Carlos Gomes, imortalizados nas vozes brasileiras. Tobias Barreto publicou Dias e Noites em 1881, apresentando-se como poeta, quando já havia feito nome como pensador e como crítico. Ainda hoje a poesia de Tobias Barreto é recitada por todo o País. Outro filósofo poeta foi Fausto Cardoso, nascido no engenho São Félix, em Divina Pastora, que lamentavelmente não deixou livro de versos editado. Os jornais e revistas, de várias partes do Brasil e as antologias, guardam os seus poemas. Hermes Fontes, que nasceu em Boquim, viveu no Rio de Janeiro como poeta, sendo dos mais queridos e lidos do seu tempo, que foram as três primeiras décadas do século XX. O professor José Costa organizou uma Antologia Poética de Hermes Fontes, que a Secretaria de Estado da Cultura editou e lançou, há poucos dias. É uma oportunidade para que os sergipanos, de todas as idades, especialmente os que estão nas escolas, tomem conhecimento da obra do poeta da Fonte da Mata, que também teve versos musicados, como os clássicos do cancioneiro brasileiro Luar de Paquetá e A Beira Mar, em parceria com Freire Júnior. Autor de 10 livros de poemas e um de crônicas, Hermes Fontes conviveu com a glória do reconhecimento público, num cenário de renovação estética patrocinado pelos organizadores da Semana de Arte Moderna, de fevereiro de 1922, em São Paulo. Crítico, Hermes Fontes assinou artigos sobre fotografia, e outros temas da atualidade antes mesmo de lançar seus primeiros livros de poesia, que consagrariam sua obra de escritor (Aos que vêm, após mim, ébrios do sonho da arte/ pagar tributo à dor, que retempera/ os que se vão/ exaustos de buscar, por toda parte/ essa quimera/ sonho dos nossos sonhos – perfeição). A Antologia Poética de Hermes Fontes quebra o silêncio e encurta a distância entre o poeta e os leitores, fixando um retrato fiel da sua contribuição à literatura nacional. Também pela Secretaria de Estado da Cultura saiu Retrato Diverso, de Jozailto Lima, vencedor do Prêmio Santo Souza. Jozailto Lima, nascido na Bahia, nas cercanias de Feira de Santana, de onde mudou-se para Sergipe, em 1990, enturmando-se nos jornais, por vocação e formação, o que significa pagar o preço dos dois ofícios: o de poeta, sem datas e sem freios, e o de jornalista, metido no cotidiano dos fatos, muitos deles requerendo opiniões. Esse bifurcamento profissional tem realçado mais o jornalista do que destacado o poeta. E ainda que ele seja bom nos dois trabalhos, será como a poesia que ele dará maior e mais definitiva contribuição às letras sergipanas, restituindo um crédito que José Sampaio deixou em Feira de Santana, quando por lá mostrou sua mala de caixeiro viajante e seus papéis de poeta. Retrato Diverso é, em sua essência, um livro de poesia (Zincam as tardes/ trincam os cristais e as cristaleiras/ desentocam tanajuras e trovões/ espalham chuvas, expelem verões/ encoivaram estações, e labaredam-se: / canto que incensa e encandeia), com todos os ingredientes de uma arte que faz do mundo e da vida temas e problemas, como matéria prima que transpira e inspira, como se o poeta, do alto dos seus versos, pudesse ordenar o caos, mudar o mundo, reinventar a realidade. O livro de Jozailto Lima é digno do prêmio que recebeu, com a chancela de Santo Souza, o bruxo do Siqueira Campos, poeta maior por não ser da terra, ser da língua, não ser dos fatos, ser das cosmogonias, aedo como Orfeu, seu personagem. Marcelo Ribeiro publicou 5 livros em 5 anos, o último foi Motivos diversos, coleção de 93 poemas curtos (Querida vg rogo empenho captura meus evadidos pensamentos pt) e de versos curtos (A cidade dorme/ o mar se oferece/ o barco se perde…/ ao longe, o bêbado/ urina sobre rochas/ desequilibrando o horizonte). O livro é o melhor testemunho da evolução do poeta no domínio da linguagem. Alguns contém sentenças, como se fossem códigos informais, balbuciados na leitura. O poeta consolida a poesia e comparece ao público portando suas novidades, seus motivos, no cotidiano de sua reflexões. Marcelo Ribeiro conta com a colaboração de Silvio (Silvio Marcelo Cruz Ribeiro, seu filho), que fez a capa e tem feito outras artes, sempre com o brilho faiscante do talento. Vozes do Alvorecer é um livro de estréia, de Carlos Costa. O poeta carrega a responsabilidade de ser filho de um poeta – Eunaldo Costa -, não podendo seguir a velha trilha que um dia, inspirado em José Sampaio, o pai tomou para si, como a repetir Enock Santiago Filho e Santo Souza, dois descendentes do autor de Nós Acendemos Nossas Estrelas. Todo começo é bom, quando o ofício se faz consciente e Carlos Costa tem palavra e verso para construir seu próprio caminho e fazer do poema instrumento de comunicação (No mundo/ de abstrações/ e fragmentado/ em becos férteis/ de lirismo/ germina a poesia). São quatro livros, quatro poetas, tomando lugar nas estantes da literatura sergipana fiéis ao tempo já vivido, em busca de leitores. Versos como água, como diria Sampaio, ao alcance de qualquer ouvido, na festa permanente da criação. Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”