“Lado a lado”: história e ficção

(Foto: Divulgação)

A revolta da Vacina, a Revolta da Chibata, cenários de um Brasil que se constituiu republicano no final do século XIX e início do século XX, desfilam pelas telas globais e são seguidamente mencionados em aulas de História por crianças e adolescentes. As relações entre o ensinado pelo professor de História e o assistido pelos alunos na novela global reveste-se de uma existência real com cores, sons e emoções, diferentemente do texto histórico que parece não despertar o mesmo interesse. E, ambos, tanto o texto histórico como a narrativa de ficção “Lado a lado”, referem-se às ações humanas no tempo. O filósofo francês Paul Ricoeur, na obra “Tempo e Narrativa”, discute o que aproxima e o que afasta a narrativa histórica da narrativa de ficção.

Ricoeur defende que a História toma emprestado à ficção a imaginação, e a ficção empresta à História o caráter de probabilidade e verossimilhança que a configuram. Assim, ambos os gêneros narrativos realizam empréstimos um ao outro, sendo que a narrativa de ficção possui a flexibilidade de configurar outros tempos, como o da alma, do mundo, o subjetivo e o objetivo, que a História, devido ao seu caráter invariável de inscrição do tempo da alma no tempo cósmico, não consegue configurar.

Os textos de ficção narram experiências humanas no e com o tempo, configurando o tempo vivido e sentido pelos personagens engendrados pela intriga, oferecendo a possibilidade aos alunos de experienciar o tempo. A narrativa de ficção, sempre acontece num determinado tempo histórico, contextualizando uma época, com seus valores e costumes. Os textos de ficção não podem ser desconsiderados, pois podem ser portadores de uma riqueza de elementos que contribuem para tornar a História  e o seu ensino mais atrativos, mais envolventes e mais significativos para o ouvinte/leitor.  A narrativa de ficção também pode ser questionada e até contestada junto aos nossos alunos desde que sempre se tenha presente que se trata da construção de um autor, que viveu/vive numa determinada época, com seus valores e que é um entre muitos olhares que ele lança sobre um contexto histórico.

A narrativa histórica por sua vez, não pode ser vista em oposição à narrativa de ficção, mas como um outro gênero, composto por outros elementos, mas que toda a narrativa é a construção/reconstrução de um olhar, mais especificamente do historiador, que a partir de seleções relativas ao tema, abordagem, documentos, provas, etc., elabora uma narrativa, mas que não é necessariamente a única. Lembremos da história das vozes silenciadas, daquelas que nunca puderam contar a sua história e que até hoje não conhecemos, e talvez assim possamos justificar que nenhuma história é melhor ou mais verdadeira que a outra, mas que as histórias contadas/narradas são a expressão de uma cultura, de um tempo, de um lugar… entre outras/os.

Marizete Lucini
Professora do Departamento de Educação e
do Núcleo de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Sergipe

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