Cezar Britto fala dos três anos à frente da OAB

Cezar Britto
Depois de três anos à frente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto volta a advocacia trabalhista a partir desta terça-feira, 2. Mesmo em meio a muito trabalho e com a solenidade de posse que aconteceu na noite desta segunda-feira, 1º, – onde ele passou a presidência para o advogado Ophir Cavalcante – Cezar Britto respondeu algumas perguntas do Portal Infonet. Nesta entrevista, o advogado faz um balanço do mandato do Conselho Federal da OAB, da mudança no exame unificado, reformas política e jurídica, punição aos advogados e transparência nas eleições. Confira!

Portal Infonet- Gostaria que o senhor fizesse um resumo dos últimos três anos à frente da Ordem dos Advogados do Brasil? Considera que o saldo foi positivo?
Cézar Britto- Penso que sim, embora esse julgamento caiba a meus colegas. Entre outras conquistas, destaco: a luta vitoriosa contra o Estado Policial e em favor das liberdades; a luta igualmente vitoriosa em defesa das nossas prerrogativas profissionais, com a sanção da lei 11.767, que garantiu a inviolabilidade dos escritórios de advocacia, aprovada, por unanimidade, pelo Congresso Nacional; a Súmula 14, para que os advogados tenham acesso aos autos, acabando com os kafkianos processos e investigações secretos para o próprio interessado; a Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental junto ao Supremo Tribunal Federal para abertura dos arquivos da ditadura, no empenho de resgatar uma dívida histórica para com o povo brasileiro, em favor da verdade. Em suma, a continuidade da luta histórica da OAB em defesa da democracia, dos direitos humanos e da sociedade brasileira.

Infonet- O que muda na sua vida depois da presidência da OAB? O que leva de experiência? Mudou o pensamento sobre algum ideal?
CB- Volto à advocacia. Não “sou presidente”: “estou” presidente, como diria Eduardo Portella. Jamais perdi de vista a transitoriedade dos cargos. Sou advogado trabalhista, atividade em que realizo plenamente minha visão social da advocacia. A presidência nacional da OAB é experiência única, incorporada definitivamente ao espírito de quem tem o privilégio de exercê-la. No meu caso, não mudou minha forma de pensar: consolidou-a, acrescentou experiência, expandiu-a. Deu-me visão nacional dos problemas do Brasil e de sua advocacia, o que é um ganho intelectual e político considerável.

“Excesso de normas deixa o brasileiro confuso”, diz Cezar Britto
Infonet- O que muda com a realização do primeiro exame unificado no país? O senhor afirmou que o exame jurídico não será mais o mesmo depois dele. Por quê?
CB- Muita coisa. A medida, aprovada pelo Conselho Federal em outubro, já vinha sendo aplicada parcialmente em alguns estados. Estende-se agora a todos, estabelecendo isonomia na aferição da qualidade técnica dos futuros advogados e introduzindo questões contemporâneas de grande importância para sua formação ética e humanista, como direitos humanos e acessibilidade. O Exame unificado obrigará a que as instituições de ensino passem a dar maior atenção a essas disciplinas. Dentre as  novas exigências, está a obrigatoriedade de divulgação, no resultado final do Exame, do percentual de aprovação e da nota média de cada instituição. São dados fundamentais que vão contribuir para a melhoria da qualidade do ensino. A unificação fornece ao MEC, às faculdades e aos estudantes um acompanhamento mais eficaz da qualidade do saber jurídico oferecido no Brasil. A inovação permitirá o aprimoramento do conteúdo do ensino e compatibilizará os currículos universitários com as exigências da Comissão Nacional do Ensino Jurídico. O Exame deixa de ser meramente dogmático e passa a ser elemento influenciador do conteúdo curricular de cada instituição de ensino de Direito.

Infonet- O senhor disse que o excesso de normas deixa o brasileiro confuso e o distancia da Justiça. Como inverter isto? Seria a hora de conseguirmos imediatamente as tão sonhadas reformas política e jurídica?
CB- Com certeza. A primeira etapa da reforma do Judiciário apenas tangenciou as demandas da sociedade por uma Justiça mais ao seu alcance. Criou o Conselho Nacional de Justiça, que permite uma supervisão da sociedade sobre o Judiciário, o que é um avanço. Mas é preciso avançar mais. O cipoal da legislação processual permite que um mesmo processo obtenha inúmeros graus recursais, o que faz com que muitos prescrevam antes de ser julgados. Beneficia quem pode pagar bons advogados e protelar sentenças até que sejam arquivadas por decurso de prazo. O cidadão comum, que raramente pode dispor de um advogado, não se beneficia disso. Só os abonados, o que contribui para a impunidade, que é a grande chaga moral da vida brasileira.

Infonet- Existe um projeto de Lei 6196/09 tramitando na Câmara dos Deputados que estabelece que, apurada a ausência do advogado durante um processo, o juiz deverá

Cezar enquanto presidente(Foto:Agência Brasil)
comunicar o fato à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para o procedimento disciplinar e a imposição da multa. Isto reafirma que cabe à OAB punir maus advogados. O senhor concorda com isto? O que seria ideal?
CB- O ideal, claro, seria não haver maus advogados. Como há – assim como nas demais profissões -, é preciso dotar a sociedade de meios para se defender deles. A OAB, no seu papel institucional de, simultaneamente, casa do advogado e defensora da sociedade civil, dispõe de uma Comissão de Ética, sempre atenta aos eventuais desvios de conduta de seus filiados. Poucos sabem, mas a Comissão de Ética da OAB trabalha intensamente, punindo os que se desviam. Poucas corporações agem com o mesmo afinco.

Infonet- Num esforço para banir as doações ocultas das campanhas de 2010, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) planeja exigir que os candidatos informem o nome de todas as pessoas e empresas que contribuírem com dinheiro, bens e serviços. Hoje, muitas empresas fazem doações aos partidos que, por sua vez, as repassam aos candidatos. Na prestação de contas, porém, os candidatos não especificam a origem do dinheiro, mantendo o sigilo do colaborador. A proposta de proibir essa prática será votada pelo plenário do TSE até março, com grande chance de aprovação. Como a OAB irá se posicionar sobre este assunto durante as audiências públicas que irão ocorrer em fevereiro?
CB- Somos plenamente favoráveis a essa iniciativa, que, inclusive, surgiu há anos em nosso âmbito. Sempre propugnamos por transparência ampla, geral e irrestrita no ambiente eleitoral. Qualquer tentativa de ocultar do eleitor informações sobre partidos e candidatos constitui burla, que induz ao desvio do voto. Isso é ainda mais evidente no que tange ao financiamento. Por isso, na proposta de reforma política que enviamos ao Congresso no início de meu mandato, propusemos o financiamento público de campanha. O dinheiro que gastaremos com ele é bem menor que o gasto com a corrupção, cuja fonte principal é, sem dúvida, o financiamento privado – a maior parte em caixa dois – das campanhas. Não tenho dúvida de que a nova administração manterá esse ponto de vista.

Infonet- Quais são os planos para o seu futuro profissional?
CB- Volto a advogar. Estarei à disposição de meu sucessor, Ophir Cavalcante, que é meu amigo e um grande profissional, e foi um competente colaborador de minha administração, como diretor-tesoureiro. Na OAB, usamos a imagem da tocha olímpica: o presidente que sai a transmite ao que chega, sem antagonismos ideológicos ou políticos. A missão é a mesma; o que pode mudar é o contexto. Continuarei a fazer parte do Conselho Federal, como ex-presidente, à disposição desse e dos próximos presidentes que o sucederem.

Por Raquel Almeida


 

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