Ensaio sobre o adeus

O adeus é quase uma morte. Talvez assim o seja, pois chegamos próximos ao nada em si. O que antes existia dá lugar ao vazio, pois o adeus está embutido num buraco existencial, que faz apertar os músculos dos mais fortes dos bravos.

Só quando não conseguimos evitar o adeus é que chegamos mais próximos do que somos verdadeiramente. Assim, descobrimo-nos sozinhos e desamparados, sendo agora singular, o que antes era composto e dividido com o que deixamos para sempre.

Nós nascemos sozinhos e morreremos sozinhos, exceto em acidentes envolvendo outras vidas, se bem que ainda assim cada morte é única. Cada dono tem seu último sopro, seu adeus particular.

Toda despedida que dá margem ao reencontro não deveria ser demorada, muito menos chorada. O adeus é muito mais que isso – é a certeza do nunca mais, da distância eterna. Na Língua Inglesa, o bye é tchau. Enquanto o goodbye é o bom tchau?

Ele [o adeus] gosta de provocar mudanças. Todas as grandes transformações surgiram da já proclamada morte, que nasceu de um [adeus]. Durante as Grandes Guerras, por exemplo, os muitos adeuses emanados cabiam perfeitamente à falta de esperança que no momento perecia. [Adeus] não tem sinônimo. Vive sozinho esperando uma única oportunidade para sair e estragar ou ajeitar tudo.

Damos adeus nos aeroportos fazendo um mau uso dessa palavra. Criamos cena de adeus para tudo, quando poderíamos abreviar o sacal com beijinhos, tapinhas nas costas e um sorriso de até logo mais. Graças a Deus, temos no Português o nosso “adeus”, o “até logo”, o “tchau”, até o “até já já” pode ser usado se a despedida for brevinha-brevinha.

Ao Deus, todo o nosso verdadeiro adeus, porque apenas o Supremo compreende a dor ir sem voltar. Acho também que as mulheres que têm filhos sabem o que o adeus significa, ali na carne e no osso. Elas geram um fruto que em breve será cortado.

Saber dizer adeus sem olhar para trás é certamente a atitude mais sagaz do ser humano pensante. Deveríamos dizer mais adeus do que provocar vinganças (bobas), mas, enquanto formos fracos seremos capazes de submeter o outro ao nosso desgosto e assim permanecemos girando um círculo ruim que demorará a parar.

Não se vingue! Basta apenas olhar para o seu desafeto levantar a mão, virar e em seguida sair andando (ainda com a mão levantada), abandonando o desgosto que o outro lhe fez, sentindo a liberdade do quê não precisa ser mais aceito. Dê um gentil adeus!

[No dia em que fui mais feliz, eu vi um avião se espelhar no seu olhar, até sumir…]*

Até a semana que vem…

 

 

 

* Inverno – Composição de Adriana Calcanhotto/Antonio Cícero.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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