Carta para Luciano Lima

Aracaju, 14 de abril, de 2010

 

Queria fumar um pouco. Você sabe que não possuo nenhuma vocação pro cigarro, nasci de uma mãe fumante, viciada desde os 14 anos em Hollywood, mas que não passou nenhum gene defeituoso na fumaça para mim. Essa vontade que tenho em acender um cigarro me vem desde sempre, principalmente quando estou para esperar algo acontecer. Tanto você quanto eu somos impacientes e extremamente agoniados perante os acontecimentos da vida.

Sabe quando o tempo esfria e você está ali, aguardando uma carona, ouvindo em seu Ipod um som qualquer , sem fazer nada? Deve ser por isso que as pessoas fumam – para preencherem um tempo existente que não possui utilidade nenhuma na vida. Esperar acontecimentos é algo fora de série e se não temos uma revista, um livro ou um bom papo com um estranho torna-se uma verdadeira brigada para a maldade.

Fui mal esses dias. Tive uma dor de garganta infeliz e descontei em algumas pessoas próximas. Você sabe que não me sobra nenhuma paciência quando estou doente e, Luciano, desde a mudança de casa tenho problemas de saúde. Algo como se não pudesse ficar bem depois de tanto lutar por minha independência. Será que tem alguma relação gastar tanta energia em prol de algo e depois se sentir esgotado?

Tem dias que não dá nem pra sair da cama. E mesmo cheio de pendências nos trabalhos fico completamente dopado pelos remédios que tomo. Fiz exames e não deu nada demais, apenas estafa mental. Ando esgotado e queria muito encontrar com você pra poder falar sobre meus pequenos-problemas. A certeza de que existem misérias maiores que as minhas me faz sair de casa e enfrentar um dia de trabalho. Mesmo o corpo parando, fica difícil estabelecer com a mente qualquer inércia. Ela teima em trabalhar.

Estava lembrando esses dias dos nossos verões, na casa de praia de Eduardo e Vânia. Aquele grupo de amigos me dá uma nostalgia danada. Sinto a voz de Dani bem perto do meu ouvido. Quase sinto o cheiro da maresia agora. Éramos tão inocentes perante a vida. Era como se nada mais nos importasse e que se o mundo acabasse ali, tudo bem, a gente não faria nenhum estardalhaço. Amigos se bastam, Luciano. Pena que só aprendi isso hoje, depois de ter perdido vários dos nossos.

Não quero nesta carta parecer triste, mas é que ultimamente tenho sentido falta das pessoas que me eram mais próximas. Uma ausência sem fim, do tipo que nos faz adoecer. Será que minha garganta dolorida é reflexo desses pensamentos? Nunca tive vocação para a alegria, você sabe. Mas estou me cansando da tristeza. Meus sambas são todos tristes, minhas piadas jamais serão ingênuas. Meus sonhos estão se concretizando e não sei mais o que fazer com eles.

Acho que precisaria viajar pra bem longe. Só. Talvez chamasse apenas um amigo. Será que você não estaria disposto a enfrentar nossas crises-amigáveis-do-passado? Na verdade não posso exigir de nenhum amigo que me acompanhe, isso é bobagem minha. Talvez desespero.

 Me veio uma pontada no peito agora que só perde pras pontadas que sinto em meu pescoço. Lu, a dor da garganta deixou sequelas nos músculos do pescoço. Sinto como se estivesse uma pressão gigantesca dos dois lados. Preciso descansar e me desculpe se não escrevi uma carta onde tivesse expressado meu amor por você, como o irmão mais antigo que tenho. Desculpe escrever falando sobre neuras que me acompanham há mais de uma década. Desculpe não ter sido o amigo de antes, nem conseguir sorrir como eu fazia. Mas é que a vida anda tão complicada para nós que trabalhamos com a mente, que não sinto nenhuma vontade de justificar nada pra ninguém. Apenas para meus queridos amigos.

 

Att,

 

 

Jaime Neto.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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