“Alexander Nevsky”(1938)

Rafael Costa Prata
Graduado em História pela Universidade Federal de Sergipe
   Colaborador do Vivarium (Laboratório de Estudos da Antiguidade e do Medievo – Núcleo Nordeste)
E-mail: rafaelcostaprata@hotmail.com

Que ligação teria uma película do gênero épico medieval com os eventos que delinearam a chamada Segunda Guerra Mundial, aparentemente tão distantes no tempo?!

No ano de 1938, o cineasta russo Sergei Eisenstein resolveu realizar um de seus maiores projetos: a filmagem da vitoriosa vida do príncipe russo Alexander Nevsky. Ambientado no século XIII, o filme retrata a vitoriosa campanha militar realizada por este príncipe frente a invasão dos chamados cavaleiros teutônicos, num momento em que o Império Russo mostrava-se bastante fragilizado.

Esse foi o fio condutor geral deste filme, cujo papel, foi muito além de representar uma realidade bélica do antigo império russo medieval. Este filme é mais “contemporâneo” do que se possa imaginar. Acontece que, quando Eisenstein idealizou o filme, recebera de imediato o patrocínio do ditador russo Josef Stalin, pois aquele acreditava que tal filme exerceria uma grande influência patriótica no povo russo, frente as possíveis associações que se poderia obter entre a narrativa épica descrita e a realidade russa em questão.

Em suma, as vésperas da eclosão da Segunda Guerra Mundial, o quadro geopolítico anunciava um possível confronto entre a Rússia de Stalin e a Alemanha de Hitler. Desta maneira, os cavaleiros teutônicos de ontem converteriam-se nas tropas alemãs do presente em questão, prestes a invadirem o território russo. De outro modo, de forma subliminar, passava a se configurar uma bem quista associação entre Stalin e Alexander Nevsky, dois líderes que em tempos diferentes, guiaram destemidamente o Império Russo a gloriosa vitoria frente aos alemães.

Foi com esse apelo emocional, e sobretudo ideológico, que a película em questão foi pensada para ser exibida em 1939, entretanto, os rumos da história impediram sua concretização. A assinatura do Pacto Molotov – Ribentropp entre a Alemanha e a Rússia, ocorrido no dito ano de 1939, que assinara um acordo de não – agressão entre as nações, mudou a orientação, de modo que a película foi então “engavetada” pelo Estado Russo, tendo sido proibida então sua exibição nos cinemas daquele país.

Aquele filme que havia sido imensamente patrocinado e ansiosamente aguardado como arma ideológica pelo governo russo, convertera-se então em um “artefato cultural” a ser escondido, em vista da nova orientação geopolítica que se configurara a partir daquele ano.

O grande cineasta russo Sergei Eisenstein, cujas películas sempre estiveram carregadas de forte sentido ideológico, em destaque os clássicos “O encouraçado Potemkin”(1925) e “Outubro”(1928), teve de esperar por dois anos para que sua película saisse da gaveta para ser exibida para o grande público russo. Mas isso só ocorreu porque novamente o quadro geopolítico se reconfigurou; em 22 de junho de 1941, a Alemanha rompe o acordo e invade o território soviético na chamada Operação Barbarossa.

E foi então que, em virtude daquele rompimento, o filme “Alexander Nevsky” ganhou novamente projeção tendo sido imediatamente resgatado e relançado na segunda metade do ano de 1941, para atender aos propósitos iniciais de sua produção. Talvez, nenhuma outra película tenha “sofrido” tanta intervenção em sua trajetória de exibição por conta das alterações ocorridas no quadro geopolítico mundial.

Esta película aparentemente de suposto “conteúdo medieval”, acaba por nos falas mais sobre os meandros históricos a sua época de produção do que o período retratado na película. Assim, após tantas idas e vindas, “Alexander Nevsky” pôde cumprir seu propósito inicial: servir como “uma apologia da Rússia stalinista” (MACEDO, 2009, p.21).

Para saber mais:
MACEDO, José Rivair ; MONGELLI, L. M. (Orgs.) . A Idade Média no Cinema. 1ªed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2009. v. 01. 268 p .

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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