Boteco Clarina

Raquel Anne Lima de Assis
Graduanda em História pela UFS
Integrante do Grupo de Estudo do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)
Bolsista voluntária do projeto Memórias da Segunda Guerra em Sergipe apoiado pelo CNPq e pela FAPITEC – Edital PRONEM/2011
Email: raquel@getempo.org
Orientador: Dr. Dilton Cândido S. Maynard (UFS/DHI)

Novela e vida real. Será que ela nos ocupa somente nos poucos minutos que sentamos na frente da televisão? Até que ponto ela interfere na nossa vida cotidiana? Talvez alguns respondam que nos momentos de bate-papo entre os amigos que expressam suas raivas e paixões pelos personagens ou a maneira como o autor está conduzindo a história. Isso realmente acontece em alguns de nossos momentos de conversas aleatórias. Alguns talvez se lembrem de nossas mães e avós sentadas na porta de casa falando sobre o assunto.

Mas com a internet a interação entre a ficção e o real tomou rumos diferentes. Por meio deste recurso é possível conversar sobre a novela com pessoas de qualquer parte do mundo e a qualquer hora do dia. Destas conversas, surgem as mais diversas emoções e opiniões de como a história está sendo contada. Até mesmo afloram propostas de como poderia (ou deveria) ser. Ou seja, fãs expõem seu modo de ver o mundo e recriam a história conforme essa sua percepção.

Mas não para por aí. Destas relações, surgem conversas, consequentemente, diversos assuntos são debatidos e até vínculos são criados. Um exemplo deste fenômeno é o que aconteceu com a novela “Em Família” , da Rede Globo, e os seus personagens, Clara e Marina. Essas duas formam um casal na dramaturgia que gerou insatisfação dos mais conservadores, mas também a paixão de um grupo de fãs. Estes criaram um blog, chamado Boteco Clarina. O site surgiu para debater sobre essas personagens de forma cômica, recriando diálogos e gerando debates. Esses debates originalizaram Chats, que funcionam 24 horas por dia. A qualquer momento que o usuário entra, sempre haverá alguém disponível para conversar.

Essas conversas iniciam sobre a novela, mais precisamente sobre o casal. São expostas diferentes opiniões, críticas e divagações. Quando alguma cena não agrada estes usuários, sentimentos de raiva são expostos ao mesmo tempo de felicidade quando outra cena mais agradável é exibida. Ou seja, diferentes emoções emanam neste “Boteco” geradas pela novela, mostrando assim que esta forma de ficção interage com a vida real e com os sentimentos destas pessoas. Fãs estes de diversas partes do mundo, sendo a maioria do Brasil, mas também há frequentadores de Portugal, Espanha e Alemanha, por exemplo.

A variedade também está na faixa etária, mas a sua maioria são adultos entre 20 e 30 anos. O que desmente a ideia de que se trata de uma ocupação de crianças e adolescentes. Portanto, existem pessoas das mais diversas culturas e formas de pensar. Há professores, advogados, médicos, programadores, designers, biólogos, estudantes universitários, psicólogos entre outros.

Mas não debatem somente Clara e Marina. Há conversas sobre preconceito, beleza, sexo, paqueras, filmes, séries, livros, músicas. Já as emoções não se dirigem somente para a dramaturgia, mas também entre eles. Porque vínculos e amizades são criados. Alguns já mantem essa relação por meio de outras redes sociais mais privadas, como Whatsapp e outros já chegaram a se conhecer. Mas como nem tudo são flores, há também algumas indisposições, devido ao choque de opiniões. Assim como ocorre nas nossas relações fora do ambiente digital.

Portanto, o Boteco Clarina nos mostra como os meios de comunicação, neste caso a televisão e a internet, proporcionam a interação de diversos povos, com diferentes concepções, visões de mundo e de formação. Não se enganem que trata-se de pessoas falsas por utilizarem de avatar e perfis fake. Pelo contrário, o virtual é real, porque a pessoa de fato está agindo sobre aquele ambiente expondo seu modo de pensar e agir. Claro que mentiras também existem, mas isso não ocorre somente no “mundo cibernético”, faz parte do ser humano em diversas relações sociais. Mesmo não vendo seus rostos e sabendo seus nomes, o real destas pessoas está agindo. Não precisamos saber o CPF e o RG para conhecer as diferentes culturas.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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