As academias de letras têm, geralmente, dois quadros de sócios em suas Cadeiras: um efetivo, composto pelos fundadores e ocupantes, outro honorífico, ou de correspondentes. Na Academia Sergipana de Letras são 40 as Cadeiras efetivas e 20 as de sócios correspondentes. Nos últimos meses a ASL atualizou o seu quadro de sócios correspondentes, elegendo Mário Losano, professor de direito da Universidade de Milão, na Itália, José Esteves Pereira, professor de História das Idéias da Universidade Nova de Lisboa, de Portugal, José Octávio de Arruda Melo, jornalista e professor da Paraíba, que já tomaram posse, e mais Marta Biaggi, professora de direito, da Argentina, e Arivaldo Silveira Fontes, militar, professor e intelectual sergipano radicado no Rio de Janeiro. Na segunda feira, 3 de maio, toma posse na Cadeira vaga com a morte, no Rio de Janeiro, em 17 de agosto de 2003, do folclorista e escritor sergipano Paulo de Carvalho-Neto, o professor e crítico Bráulio do Nascimento. A agitação da vida moderna, que tem mudado hábitos de vida, não alterou a rotina de trabalho de Bráulio do Nascimento, um mestre brasileiro, que no dia 22 de março completou 80 anos, anunciando a edição do seu monumental Catálogo do Conto Popular do Brasil, obra que consumiu anos de pesquisas, anotações, confrontações, e que será fundamental como registo e documento da literatura popular, que vicejou na oralidade entre os brasileiros. Nascido na Paraíba em 1924, filho de militar do Exército brasileiro, Bráulio do Nascimento andou com a família por vários pontos do País, incluindo uma passagem por Aracaju, quando seu pai serviu no Quartel do 28 BC. Suas lembranças são as de que morava na rua do Gerú, e tinha para brincar as alvas areias do Morro do Bonfim, dunas acumuladas no centro da capital sergipana, marca antiga da paisagem, retirada há 50 anos, mais ou menos. Poucas pessoas se afeiçoaram tanto a uma terra, quanto Bráulio do Nascimento a Sergipe. Não bastassem as suas lembranças de menino, ainda hoje tão vivas, Bráulio do Nascimento demonstrou a amizade e a atenção pela terra sergipana, ao assumir, em 1974, a direção da Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, no Rio de Janeiro, substituindo ao diplomata Renato Almeida. A CDFB era, praticamente, a única entidade cultural em atuação, ainda que desfalcada de Edson Carneiro, seu dirigente afastado pelos militares que assumiram o Governo em 1964. A área cultural do Governo Federal foi reorganizada por volta de 1968, quando um grupo de intelectuais apresentou ao então presidente Costa e Silva um documento intitulado Diagnóstico Preliminar da Cultura. Daquele grupo sairiam o diretor do Instituto Nacional do Livro, general e escritor Umberto Peregrino, em lugar do acadêmico Augusto Mayer, o escritor baiano Adonias Filho, para a direção da Biblioteca Nacional, Manoel Diegues Júnior, para o recém criado PAC – Programa de Ação Cultural, logo depois transformado em Departamento de Ação Cultural e, mais adiante, engolido pela Funarte – Fundação Nacional de Arte, que reuniria ainda o antigo Serviço Nacional de Teatro e o Instituto Nacional de Cinema. A presença de Bráulio do Nascimento na direção da Campanha Nacional do Folclore é um ponto alto da administração brasileira, no contato com o povo, suas expressões, sua alma, o patrimônio imaterial, ainda hoje pouco conhecido. Livros, discos, cadernos de folclore, festas, eventos de debates marcaram os anos 74/82, da gestão de Bráulio do Nascimento na CDFB. Foi ele, com sua habilidade, quem conquistou adesões ao projeto de instalar a Campanha, um Museu, uma Biblioteca no prédio do velho Palácio do Catete, na rua do Catete, no Rio de Janeiro. Um sucesso, que praticamente recriou o interesse nacional pelas múltiplas manifestações da cultura popular. Por feliz coincidência coube a Bráulio do Nascimento entregar o prêmio Silvio Romero ao pesquisador sergipano Jackson da Silva Lima, vencedor do concurso com o livro Folclore Sergipano – Romanceiro, uma das obras referenciais da bibliografia brasileira, na tradição dos livros do também sergipano Silvio Romero, que foi quem primeiro coletou, organizou e publicou contos, cantos e romances populares do Brasil. Outro contato com Sergipe ocorreu em 1976, definindo a realização, em maio, do I Encontro Cultural de Laranjeiras, que vem há 29 anos liderando o interesse pela temática folclórica local, regional e nacional. Os Encontros Culturais de Laranjeiras se constituíram numa escola de folclore, influindo no debate sobre a cultura popular e produzindo uma massa crítica que reúne, aproximadamente, 400 textos, oxigenando a bibliografia brasileira, como fixou o próprio Bráulio do Nascimento, em 1995, ao organizar o volume especial dos Anais dos primeiros 20 anos do ECL. A edição de cadernos de folclore sobre a Taieira e sobre a Dança de São Gonçalo, de autoria de Beatriz Góes Dantas,, discos com a Taieira e o São Gonçalo, de Laranjeiras, a Chegança e a Zabumba, de Lagarto, o Álbum de Xilogravura, de Enéias Tavares Santos, dentre outros que obtiveram imediata repercussão. Com os Encontros e as publicações lançadas anualmente Sergipe passou a tratar a cultura do seu povo, de modo a inspirar que em todo o Brasil reacendessem o valor e a proteção ao universo do folclore. Cidadão de Laranjeiras e de Sergipe, por merecidos reconhecimentos, Bráulio do Nascimento colhe, agora, a homenagem que lhe é prestada pela Academia Sergipana de Letras, elegendo-o Sócio Correspondente, na vaga de um sergipano, dos seus mais diletos amigos e colaboradores, Paulo de Carvalho – Neto. É uma forma de Sergipe celebrar os 80 anos do professor, do crítico literário, do escritor, tantas vezes dedicado a temas sergipanos, do folclorista, do administrador, do cidadão, do amigo presente, sendo, como o é, um dos maiores nomes da cultura brasileira, como autor e como agente e empreendedor. A Academia, que já aclamou a idéia e formalizou o rito eleitoral, agora empossa, para fazer justiça ao trabalho, talento e contribuição do mestre. De uma geração de renovadores da literatura brasileira, como crítico da Revista Branca, ao lado do poeta Alberto da Costa e Silva, embaixador em vários países, ex presidente da Academia Brasileira de Letras, Bráulio do Nascimento migrou para o campo cultural do povo, organizando na Biblioteca Nacional, onde trabalhou por muitos anos, o volume da Bibliografia do Folclore Brasileiro, ainda hoje o mais completo guia de fontes da cultura popular. Os estudos sobre o conto popular, e sobre o romanceiro deram a Bráulio Nascimento uma notável fortuna crítica, expressa no Brasil e no exterior, nas obras mais importantes, dos mais acreditados autores. Tudo justifica o ânimo que a homenagem a Bráulio do Nascimento desperta. Aos 80 anos, sempre disposto, Bráulio do Nascimento não transige com seus afazeres. A única exceção é viajar, com a mulher Raimunda, uma vez por ano, para os Estados Unidos, para passar férias com o filho Alberto e a nora Irene, coincidentemente no período de realização do Encontro Cultural de Laranjeiras. No mais é a dedicação exclusiva, é o amor à cultura popular dos brasileiros. Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”