O LICEU SERGIPENSE

Os vários capítulos da história da educação em Sergipe revelam um lento e profundo atraso, que vem gerando prejuízo significativo para as novas gerações de sergipanos. Embora as margens dos rios Real, Piauí, Vaza-Barris, Sergipe, Cotinguiba, Japaratuba e São Francisco, tenham sido ocupadas ainda no século XVI, com criatórios de gado e de cavalo, com lavouras de cana-de-açúcar e outras, a educação de todo o século XVII e XVIII esteve a cargo dos jesuítas, dos missionários dos aldeamentos, ou de pessoas comuns, revestidas de boa vontade, tentando fixar o conhecimento possível. Até 1820, quando teve o seu território, entre os rios Real e São Francisco, desmembrado da Bahia, Sergipe contava com um número reduzido de aulas de primeiras letras, e pouquíssimas cadeiras de Latim, a língua e a gramática, como atesta Dom Marcos Antonio de Souza, que foi vigário em Siriri, na sua Memória sobre a Capitania de Sergipe, de 1808. As cadeiras de Latim eram, na verdade, um reforço ao culto público, uma das responsabilidades do poder no Brasil. O Latim era a língua oficial da catequese, da religião, da celebração das missas, no vínculo com a hierarquia romana. A criação de outras cadeiras, nas principais vilas sergipanas, como Estância, Laranjeiras, Santa Luzia, Lagarto, Propriá, Santo Amaro, e na cidade de São Cristóvão não formalizavam a existência do ensino secundário, ou preparatório. Cadeiras de Retórica, que reforço da Gramática Latina, não significava muito, ao lado das cadeiras de primeiras letras, masculinas e femininas, que existiam e que eram criadas ou removidas no território sergipano. A primeira tentativa de organização de curso secundário privilegiava o ensino normal, a preparação de professores para as aulas (ou classes) existentes. Uma tentativa malograda, mas que jamais desapareceu do rol dos interesses sergipanos. O Liceu Serqipense, ou Liceu de Sergipe, ou Liceu Provincial, ou ainda Liceu de São Cristóvão é a primeira escola, propriamente dita, organizada para oferecer aos alunos um preparo em diversas matérias. Criado em 1847, 9 anos depois da criação da Escola Normal (Lei nº 15, de 20 de março de 1838), O Liceu começou a funcionar em 1848, oferecendo o ensino de Filosofia, Retórica, Geometria, Latim e Francês. As cadeiras de Geografia e História e de Língua Inglesa foram providas e entraram em funcionamento em 1850. Um Curso de Comércio, anexo à cadeira de Língua Inglesa, regida a partir de 1850, acabou em 1853, com o falecimento do professor. O funcionamento do Liceu dependeu de professores, que eram poucos, entravam freqüentemente de licença, e eram penalizados com substituições. Ainda assim, era a única escola secundária, e por ela passaram dezenas de alunos que seguiram adiante, nos cursos superiores do País, construindo biografias respeitáveis. Basta citar, como exemplo, que o poeta Pedro de Calasans, bacharel pela Faculdade de Direito do Recife, estudou no Liceu Sergipense. Outros vultos, como Joaquim Esteves da Silveira, poeta que morreu aos 23 anos, Manoel Cardoso da Costa Lobo, médico que participou como cirurgião-mor da Guerra do Paraguai, Manoel da Silva Rosa Junior, general, que tanto participou da campanha do Paraguai como estava ao lado de Deodoro da Fonseca, na proclamação da República, João Batista da Costa Carvalho, Benvindo de Pinto Lobão, Ernesto Pinto Lobão Cedro, todos ilustres magistrados, João Batista de Carvalho Daltro, célebre monsenhor da vigararia de Lagarto, Elisiário Prudencio da Lapa Pinto, poeta, médico homeopata, Geminiano Paes de Azevedo, professor, Graciliano Aristides do Prado Pimentel, advogado, Dionísio Rodrigues Dantas, também advogado, Manuel Luiz Azevedo de Araújo, advogado e professor, com quem o ensino secundário de Sergipe ganhou organização, foram estudantes do Liceu Sergipense. Bastaria, portanto, preparar alunos como os que foram citados e muitos outros que freqüentaram as diversas aulas, para fazer do Liceu Sergipense uma grande casa de ensino. Tanto maior, quanto foi o esforço dos seus professores, dos diretores, notadamente o padre José Golçalves Barroso, que ao mesmo tempo era Diretor da Biblioteca Provincial, criada em 1848, e por mais de uma vez deputado provincial. Impressiona como uma pequena escola, instalada numa casa alugada, em São Cristóvão, então capital da Província, possa ter reunido tantos alunos, enfrentando e superando tantas crises, com falta de professores e outras dificuldades, tenha operado um ensino que revelou o primeiro grupo de intelectuais sergipanos, uma geração que um pouco antes de Tobias Barreto, outros ao mesmo tempo, deu a Sergipe um lugar destacado na vida cultural brasileira. Nos primeiros anos foram poucos os alunos, mas com o funcionamento regular a matrícula cresceu, mantendo-se com boa freqüência. Em 1850, por exemplo, teve 68 alunos, em 1951, por conta do cólera, baixou o número de alunos para 55, em 1852 subiu para 96, em 1853 estava com 66 matrículas, o que comprova a vitalidade da escola, superando os desafios e realizando um dos mais notáveis feitos educacionais de todos os tempos, até ser extinto, em 1855, quando a capital foi transferida, de São Cristóvão para Aracaju. O governo provincial tentou descentralizar o ensino secundário, tirando alguns professores do Liceu e mandando-os para Laranjeiras e Estância, onde foram instalados dois colégios, com internato, para oferecer matrículas aos jovens que dispunham apenas do colégio em São Cristóvão. A experiência fracassou e revelou que a questão não estava na distância da escola, na localização do Liceu, mas nos entraves burocráticos, na falta de professores preparados. Durante 15 anos, convivendo com algumas ações isoladas, Sergipe esperou para ver nascer e contar com o Atheneu, uma escola com outra organização, abrangência e alcance, e com uma história exitosa de mais de 130 anos, mas que guardou muito da experiência do Liceu Sergipense. Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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