Frei Apolônio de Todi
Cearense de Quixeramobim, Antonio Vicente Mendes Maciel nasceu em 1830. Teve uma vida normal no Ceará, trabalhando em várias funções: caixeiro, comerciante,notário e rábula solicitador, antes de dedicar-se ao Catolicismo Popular. Deixou o Ceará com problemas com as Justiça, passou por Pernambuco, e chegou a Sergipe, por volta de 1874, já com séquito de fiéis seguidores e sobrevivendo de esmolas. Depois de peregrinar pelo interior de Sergipe e da Bahia, por cerca de 13 anos, alojou-se, em 1887, com seus adeptos, no arraial de Bom Jesus (atual Crisópolis – BA) organizando a sua primeira CIDADE SANTA. Em 1893 mudou-se para o Monte Santo, nome dado pelo missionário Apolônio de Todi a serra de Piquaraçá, também na Bahia, situada entre os rios Itapicuru e Vaza-barrís e lá reuniu seus adeptos na sua segunda CIDADE SANTA – CANUDOS, onde viveu, pregou, liderou o povo e lutou, até a morte, em 1897, aos 67 anos.
O missionário capuchinho Apolonio de Todi (1747-1828), na Bahia desde 1780, com passagens importantes por Itabaiana, Propriá, Pacatuba, Japaratuba, Ilha de São Pedro, Água Azeda, Geru e Lagarto, em Sergipe, em carta enviada ao dr. Baltazar da Silva Lisboa, provavelmente de 1819 ou 1820, que foi publicada pelo destinatário no seu ANAIS DO RIO DE JANEIRO (1835) relata que em 1785 chegou aos pés da Serra do Piquaraçá, achando uma fazenda de gado e uma casinha de palha, que atendia ao vigário que aparecia de quatro em cinco anos e, que era usada como Casa de Oração. O capuchinho logo começou a armar uma capela de madeira e fazer uma latada para a Missão. Mandou fazer cruzes grandes e no fim da Missão, no Dia de Todos os Santos (1º de novembro de 1780) fez o Sermão da Procissão da Penitência e daí às três horas da tarde se principiou a Procissão da Penitência, indo colocando as cruzes de modo e na distância que ordenam os Sumos Pontífices. E quando se chegou à metade da colocação das Cruzes de Nosso Senhor, repentinamente se levantou, de uma baixa que descia do Monte, um furacão de vento tão violento, que não só apagou as lanternas que cada um trazia, mas foi preciso botarem-se no chão, especialmente as mulheres, que vinham atrás. Continua Apolonio de Todi: “E assim como todo o povo ficou espantado, gritei que não temessem, mas que invocassem Nossa Senhora do Amparo que aqui traziam, e no mesmo instante, fazendo o sinal da Santa Cruz com a mesma Santa Imagem sossegou e prosseguimos à procissão, se acenderam as lanternas, se acabaram de colocar as Cruzes, e procissionalmente sempre rezando se desceu do Monte, e às oito horas da noite se chegou ao lugar da Missão, subi o púlpito, fiz o Sermão da conclusão da Procissão da Penitência, e no fim exortei o povo que no Dia Santo viesse visitar as Santas Cruzes, já que vivia em tão grande desamparo das coisas espirituais, morrendo todos sem confissão, e os meninos sem batismo & c. E aqui sem pensar em nada disse, que daqui em diante não chamassem mais Serra do Piquaraçá, mas sim MONTE SANTO.”
Apolonio de Todi completa, na Carta, a notícia, dizendo: “Portanto, apenas eu de lá parti, Deus para fazer conhecer que era obra sua e não do Missionário, principiaram a aparecer na extensão das Cruzes arcoíris de cinco cores, azul, amarelo, branco, roxo e vermelho. O que vendo o povo ficou admirado e principiou a visitar as Santas Cruzes, e chegando à Cruz do Calvário, e beijando-a, logo viam que ficavam bons os que estavam doentes. Espalhou-se este boato, e com isto, e com arcoiris que apreciam, principiaram a concorrer os doentes, que era um comninuado concurso ainda de bem longe, vindo cegos, aleijados ainda em rede , e todos ficavam bons.”
Por causa de sua obra, Apolonio de Todi foi mandado de volta ao Monte Santo, pelas autoridades eclesiásticas da Freguesia de Tucano. Sua função era a de fazer cal para fechar os Passos com uma pequena Capelinha e para se fazer a Igreja. É ele quem conclui: “ O que tudo se fez facilmente e brevemente, porque o povo, cheio de fervor, e concorrendo deus a todo o povo, se fazia tudo em um instante, que em poucos meses se fez o que nunca se pensava.”
Aquele chão do sertão da Bahia era um território místico antigo, quando Antonio Conselheiro pisou firme com sua gente. Era uma terra de utopias, que sintetizou três mitos: o da Cocanha, o do Sebastianismo, e o das Santidades. O mesmo Monte Santo, que durante alguns anos era reconhecido como Belo Monte, abrigou o célebre capuchinho italiano e seus fiéis das santas missões, e o nordestino Conselheiro, com suas regras e místicas. O reduto santo, destruído e inundado, cenarizou um dos mais comoventes dramas dos brasileiros.