MUSIQUALIDADE, por RUBENS LISBOA

M U S I Q U A L I D A D E

 

 

R E S E N H A     1

 

Cantoras: VÁRIAS

CD: “FLORES DO CLUBE DA ESQUINA”

Gravadora: EMI

 

Um projeto inédito envolvendo vários nomes da nossa música é sempre muito bem-vindo. E um que reúne, dentre o cast selecionado, várias ótimas cantoras emergentes somando-as a algumas mais consagradas não deve passar em branco, ainda mais quando o objetivo é homenagear o Clube da Esquina, lendário movimento musical mineiro que, no início da década de setenta, apresentou ao Brasil nomes como Milton Nascimento, Lô Borges e Beto Guedes, dentre outros, e entrelaçou sons mineiros com jazz, rock, MPB e o espírito dos Beatles. Foi em torno dessa idéia que o produtor Guto Graça Mello arregimentou doze cantoras que registraram com novos arranjos músicas que fizeram parte do álbum duplo homônimo, originalmente lançado em 1972.

O recém-lançado CD, que se intitula “Flores do Clube da Esquina”, como todo álbum que congrega artistas de personalidades próprias e díspares, traz momentos mais adequados que outros. Isso é natural até porque a música, subjetiva em si só, permite que algo que toque alguns lá no íntimo possa passar rasteiro em outros e vice-versa. Portanto, qualquer crítica negativa a esse tipo de projeto, geralmente esboçado por críticos azedos e de mentalidade arraigada (que levantam a toda hora, de forma descabida, a tal da falta de unidade), cai por terra quando se extrai que não se faz disso prioridade, nem se poderia; muito pelo contrário, aqui é justamente essa multiplicidade de momentos e possibilidades que dá brilho à coisa.

Dito isto pelo que de necessário se entende fazer, há que se ressaltar que os nomes escolhidos, via de regra, souberam honrar a tarefa que lhes foi incumbida. Tanto que o projeto recebeu o aval do próprio homenageado maior, Milton Nascimento, que aparece como convidado especial em dois bons momentos: as faixas “Nuvem Cigana” e “Um Gosto de Sal”, nas quais divide os vocais com Marina Machado e Fernanda Takai, respectivamente. Além dele, o único nome masculino presente é Seu Jorge, bem à vontade na releitura de “Me Deixa em Paz”, ao lado de Teresa Cristina, registro que foi incluído na trilha sonora da telenovela global “Beleza Pura”. Entre momentos mais suaves (Vanessa da Mata em “Um Girassol da Cor do seu Cabelo”, acompanhada somente pelo piano de João Donato, e Marina de La Riva em “Dos Cruces”) e outros de pegada mais forte (Meg Stock em “Nada Será Como Antes” e Ivete Sangalo em “Cravo e Canela”), destacam-se Mariana Baltar (irretocável em “Cais”) e Roberta Sá (deliciosa em “Tudo que Você Podia Ser”). Completam o repertório as canções “Paisagem na Janela” (com Luíza Possi), “O Trem Azul” (com Marjorie Estiano) e “San Vicente” (com Shirle de Moraes).

Um bom lançamento que traz para as vozes atuais canções já antigas que fazem parte da história do nosso cancioneiro. Vale a pena conhecer!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantores: VÁRIOS

CD: “DOCES CARIOCAS”

Selo: ABACATEIRO

 

Diferentemente do CD acima (que também condensa intérpretes diversificados, mas foi encampado por uma gravadora multinacional, no caso a EMI), o álbum “Doces Cariocas” é o resultado de uma espécie de cooperativa levada a cabo por alguns intérpretes independentes (quase todos radicados no Rio de Janeiro, daí o porquê do título escolhido) que, juntos, resolveram abrir um selo musical, no caso o Abacateiro, para através dele pôr no mercado os seus trabalhos. Neste projeto em particular – frise-se – a galera, ao aderir à idéia de criar um disco coletivo, terminou por alcançar um resultado muito bacana.

Já na faixa de abertura, Alexia Bomtempo e Pierre Aderne unem as suas vozes para apresentar o inspirado samba “Quanto Tempo” que questiona, com doses equilibradas de inteligência e criatividade, até onde pode ir a capacidade de superação e aceitação do ser humano. A música seguinte, a boa “O Que Será Que Te Excita?” mostra os carioquíssimos Rogê e Luis Carlinhos pisando com insuspeita segurança em terreno permeado por pegada nordestina, demonstrando que as vertentes musicais deste imenso Brasil, ao se intercalarem, terminam por apresentar ótimas surpresas. A delicada faixa-título, de nítida influência tribalista, é defendida pelo seu autor, Marcelo Costa, compositor que, ao lado de parceiros, assina nove das dez faixas que compõem o trabalho. A exceção é “Olhos d”Água”, mediana composição que surge nas vozes de Ingrid Vieira e Pierre Aderne. É novamente de Marcelo, agora ao lado de Pierre, a responsabilidade pelos vocais de ”Blackbird e Asa Branca” que, como o próprio título já sugere, tenta criar uma ponte entre Beatles e Luiz Gonzaga. O destaque aqui fica por conta das intervenções de flauta feitas pelo exímio Felipe Pinaud. Em “Valsa do Vestido”, alicerçados sob delicada poesia erótica, as vozes de Domenico e Silvia Machete se encontram em um dos melhores momentos do álbum. Já “Chuvisco” ressalta o talento de Alexia, mas ao mesmo tempo mostra o maior entrave que ela vai enfrentar: vencer as possíveis e incontestáveis comparações que já surgem entre o seu timbre e os de Paula Toller e Marisa Monte. Wilson Simoninha, o artista mais conhecido dentre os artistas aqui citados, é o convidado de Marcelo e Pierre para interpretar a faixa “Feito à Mão”, outro ótimo momento. Em seguida, o curioso sambinha “O Canário e o Curió”, nas vozes de Alvinho Lancellotti e Marcelo Costa, vem ressaltar o lado mais divertido da turma. O disco termina com “Tava”, contagiante tema com toda pinta de hit que recebeu o acústico registro de Pierre e Marcelo.

O pessoal concebeu um CD que se não é excepcional, cumpre muito bem a sua missão de cartão de visitas, descendo redondinho e comprovando o velho ditado de que a união faz a força.

 

 

N O V I D A D E S

 

·                     Os maiores sucessos do começo da carreira de Zélia Duncan foram canções assinadas em parceria com o multi-instrumentista Christiaan Oyens. Agora, ele se une ao surfista Teco Padaratz, que conheceu em Florianópolis no início do ano passado, para formarem a dupla El Niño que acaba de pôr no mercado um CD composto por doze faixas, três delas cantadas em inglês. São canções que, se a princípio podem parecer rasteiras, aumentam de tamanho após reiteradas audições, chegando algumas delas a se mostrarem aptas para alcançar as paradas de sucesso, como é o caso de “Espírito do Mar” e “Sem Medo de Errar”. Classificadas apressadamente como pop praieiro, o álbum apresenta boas idéias e alcança os seus melhores momentos com as faixas “Old Mind” (que conta com a participação especial de Armandinho), “Ano de Fé” e “Pés da Areia”.

 

·                     Pegando carona no lançamento de luxuosa caixa contendo toda a discografia da banda RPM (que comemora os 25 anos de seu surgimento), o cantor Paulo Ricardo aproveita para divulgar que já se encontra em estúdio registrando as canções que farão parte de seu próximo trabalho. Trata-se de um CD em que, ao lado de Toquinho, revisitará a obra de Vinicius de Moraes com um toque bem contemporâneo.

 

·                     O trio formado por Sá, Rodrix & Guarabyra está terminando de gravar um novo CD, recheado de canções inéditas, a maioria voltada para o chamado rock rural, estilo que fez com que os três artistas conhecessem o sucesso na década de setenta. Deve vir coisa boa por aí…

 

·                     Outro CD que já está saindo do forno é o do Cordel do Fogo Encantado. O quarto trabalho dos rapazes pernambucanos levará a assinatura de Carlos Eduardo Miranda na produção e deverá estar disponível até o final deste ano.

 

·                     Excelentes cantoras que correm à margem da cartilha insana que rege atualmente o mercado fonográfico, Alaíde Costa e Fátima Guedes reuniram-se recentemente em memorável show apresentado no Teatro Rival, no Rio de Janeiro, dentro do projeto “Grandes Encontros” e que irá se transformar em CD e DVD que chegarão às lojas até o final deste ano. Acompanhadas pelo piano de Itamar Assiere e ancoradas nas obras da própria Fátima, de Sueli Costa e de Tom Jobim, as cantoras desfiaram, no repertório escolhido a dedo, pérolas como “Chora Brasileira”, “Absinto”, “Cobras e Lagartos”, “Condenados”, “Retrato em Branco e Preto” e “Tanto que Aprendi de Amor”.

 

·                     Outro show surpreendente já visto pelo público carioca e que agora pega a estrada é “Ná Ozzetti canta Carmen Miranda”. Cantora geralmente associada a registros cool, a sempre correta Ná se mostra perfeitamente à vontade em repertório associado à alegria. Declarando-se fã de há muito da Pequena Notável, a paulista cercou-se de músicos que conhecem bem o seu canto – Dante Ozzetti (violão), Mário Manga (violoncelo, guitarra e violão), Sérgio Reze (bateria e percussão) e Zé Alexandre Carvalho (baixo acústico) – e mostrou uma faceta até então pouco conhecida que os seus admiradores poderão ouvir e ver, em breve, nos CD e DVD que serão gravados ao vivo. No repertório, canções que marcaram época, como “Na Batucada da Vida (de Ari Barroso e Luiz Peixoto), “E o Mundo Não se Acabou” (de Assis Valente) e “Touradas em Madri” (de João de Barros e Alberto Ribeiro), e outras pouco conhecidas, mas nem por isso menos interessantes, como “O Samba e o Tango” (de Amado Régis), “Imperador do Samba” (de Waldemar Pires) e Chattanooga Choo Choo” (de Warren e Gordon).

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais