Musiqualidade

R E S E N H A     1

 

Cantora: ANNA LUÍSA

CD: “GIRANDO”

Gravadora: UNIVERSAL

 

São várias as cantoras que surgem, dia após dia, neste imenso país de dimensões continentais, tentando sobressair e conseguir um lugar de destaque. Uma das mais interessantes e promissoras da nova safra é Anna Luisa, jovem intérprete carioca de voz lânguida e segura que, desde os treze anos, estuda canto. Descoberta pela produção do programa “Fama”, levado ao ar, anos atrás, pela Rede Globo, recusou o convite de participação, o que, por vias tortas, terminou fazendo com que a gravadora Deckdisc a convidasse para gravar, em 2003, um CD de formato acústico no qual revisitou quatorze temas famosos de novelas, a exemplo de “Juventude Transviada”, “Menino do Rio” e “Brasil”. Não foi, decerto, um trabalho de peso, servindo tão somente para lhe dar uma certa cancha. Dois anos após, no entanto, a cantora pôs nas lojas, de maneira independente, o excelente “Do Zero”, sugestivo título que dava a idéia de que ela estaria a zerar tudo e, a partir dali, sim, começar de fato sua carreira fonográfica. Aquele álbum trouxe ótimas canções de inspirados compositores, tais como “O Osso” (de Rodrigo Maranhão) “Um Par” (de Rodrigo Amarante) e a faixa-título (uma parceria entre Pedro Luís e Seu Jorge). O disco lhe concedeu considerável visibilidade no eixo Rio-São Paulo, embora no restante do país seu nome ainda continue a carecer de reconhecimento.

Visando a preencher tal lacuna, acaba de chegar ao mercado, através da gravadora Universal, o novo CD da artista que (igualmente aos anteriores) leva a assinatura de Rodrigo Vidal na produção. Intitulado “Girando”, é composto por uma dúzia de faixas que denotam claramente o caminho artístico que Anna pretende seguir.

É fato que a comparação com a já aclamada Roberta Sá se torna inevitável. Amigas na vida particular (foram, inclusive, colegas na Uni-Rio), seus timbres realmente se assemelham. Idem para a opção de ambas pela qualidade musical de seus trabalhos. Mas cada uma, a seu modo próprio, vem tentando construir uma carreira sólida, livre das imposições do mercado. Numa análise mais superficial, enquanto Roberta centra seu trabalho no samba e suas variações, Anna tenta uma diversidade maior, buscando inspiração em ritmos que vêm do Nordeste. Também boa compositora, no novo álbum ela assina o afoxé “Bailarina do Mar”, além da animadinha “Folguedo” (com o já citado Rodrigo Vidal), da ciranda “Seu Moço” (com Edu Krieger) e do xote “Pedido ao Tempo” (com Emerson Mardhine).

Embora não possua o vigor do CD anterior, não dá para deixar de reconhecer que o atual trabalho vem confirmar o talento de uma intérprete que sabe valorizar as canções escolhidas. Os arranjos não são grandiloqüentes, porém conferem a cada uma das faixas o que sua natureza lhes pede. Alguns deles trazem nova roupagem a temas conhecidos e o fazem com resultados satisfatórios. É o caso das releituras da bela “Parabolicamará” (uma das grandes canções de Gilberto Gil que parecia ter ganhado registro definitivo de seu autor, mas que termina apresentando novas dimensões na gravação de Anna) e do contundente samba-rock “Cachaça Mecânica” (inspirada parceria de Roberto e Erasmo Carlos, que ficou famosa na voz do Tremendão). Outras regravações são “No Cordão da Saideira” (frevo gostoso que conta com a participação especial de seu criador, Edu Lobo, nos vocais) e “Os Pingo da Chuva” (tema pinçado do baú lisérgico dos Novos Baianos). Como se pode depreender, Anna tenta fazer do ecletismo um ponto de referência, equilibrando os planos sem fazê-los soar deslocados. A pluralidade de sua arte revela o tamanho de sua coragem em beber de salutares fontes diversas.

E também a turma da chamada nova geração se faz presente no repertório, concretizando-se em dois dos melhores momentos do CD: a irresistível “Tonta” (de Eugênio Dale) e a contagiante “Baião Digital” (de Rodrigo Maranhão).

Anna Luisa se faz universal por valorizar o regional. Com conhecimento de causa e intimidade com vários gêneros musicais, ela faz parte de um grupo de jovens artistas que resgatam e atualizam valores da música brasileira. Bem bacana!

 

 

R E S E N H A     2

 

Cantor: ANTHONIO

CD: “BRICABRAQUE”

Gravadora: INDEPENDENTE

 

No dicionário, bricabraque quer dizer “vendedor de bugigangas”. Praticamente desconhecido, é este o termo que batiza o terceiro CD de Anthonio, artista mineiro que já traz em sua bagagem uma experiência musical considerável.

Revelado ao público através do show “Tambores de Minas” quando, acompanhando Milton Nascimento, percorreu o Brasil durante quase dois anos, já ali o artista pôde mostrar todo o seu talento, revezando-se como bailarino, percussionista e solista da música “Caçador de Mim”. Em seguida, atuou como protagonista da ópera “A Fogueira do Divino”, de Tavinho Moura e Fernando Brant, junto com a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, e como solista do espetáculo cênico-musical “Missa dos Quilombos”, de Milton, Pedro Tierra e D. Pedro Casaldáliga, junto com a Companhia de Teatro Ensaio Aberto, no Rio de Janeiro.

O primeiro CD, que levou apenas seu próprio nome no título e foi dirigido por Antonio Villeroy, chegou ao mercado em 2001. Três anos depois foi a vez de ser lançado o segundo álbum, “Candombe System”, produzido por Ruben di Souza. Ambos os trabalhos misturavam tradições mineiras com programações eletrônicas numa tentativa de atar os nós entre o tradicional e o moderno.

O novo disco, uma produção independente pilotada pelo competente violonista Weber Lopes, é composto por quatorze faixas, todas elas de autoria do escritor e compositor Antenor Pimenta, inspirado autor ainda pouco conhecido no campo da música popular.

Anthonio mostra-se um intérprete seguro, capaz de dar conta das intrincadas melodias apresentadas. Dono de uma boa e agradável voz (embora não possua um timbre exatamente marcante), sua experiência como ator decerto lhe permite mergulhar de forma apropriada no universo próprio de cada uma das canções. O trabalho gráfico, simples e eficiente, emoldura um projeto de muito bom gosto, o que se traduz através dos arranjos que valorizam as músicas, marcando-as em gêneros variados que terminam por dar um colorido todo especial ao disco.

Aliás, a pluralidade rítmica é o que mais se destaca, comprovando para o público em geral que Antenor é, de fato, um compositor ecleticamente inspirado. Com boas idéias expressas nas letras e temas que parecem não se repetir, o escritor (e agora compositor) também se mostra um hábil construtor de melodias.

A faixa-título é um dos grandes momentos do álbum: trata-se de um delicioso samba, daqueles que dá vontade de repetir sempre que a faixa acaba. Mas há outras canções que merecem ser destacadas como, por exemplo, a pseudo-caribenha “Tanglomanglo”, a suave “O Medo de Perder Você”, o forrozinho danado de bom “Canção de Artilharia” e especialmente “Sacatrapo”, que vem com uma pulsação única. Há as participações especiais da cantora Sarah Lopes na delicada faixa “Alma” e do próprio Antenor, que se faz presente nos vocais de “Festa na Periferia”.

Quem ainda não conhece a obra de Anthonio, está na hora de fazê-lo! Neste país de vozes femininas, é muito bom saber que existe um intérprete acima da média que vem desenvolvendo um trabalho de qualidade.

 

 

N O V I D A D E S

 

·                     Já nas lojas, através do selo Discobertas (do pesquisador musical Marcelo Fróes), o volume da série “Letra & Música” dedicado à obra de Renato Russo. São quatorze sucessos do líder da banda Legião Urbana pinçados de trabalhos anteriormente gravados por Leila Pinheiro, Pato Fu, 14 Bis, Léo Jaime e Os Paralamas do Sucesso, dentre outros.

 

·                     O compositor sergipano Márcio de Dona Litinha engatou duas de suas composições (constantes do repertório do grupo NaurÊa) no novo CD da banda carioca Bangalafumenga. Unidas em um medley (“Bonfim” e “Sexta-Feira”), as canções foram apresentadas ao pessoal do Rio pela nossa percussionista Elisa Nunes que há alguns anos reside em terras cariocas e integra a referida banda quando a mesma se apresenta com sua formação completa.

 

·                     Em 1980, Milton Nascimento, acompanhado do pianista Wagner Tiso, fez um show no estúdio da emissora de TV suíça RSTI. É o registro em vídeo dessa apresentação que acaba de chegar ao mercado através da pequena gravadora Coqueiro Verde. No repertório, canções consagradas na voz de Bituca, tais como: “Canção do Sal”, “Travessia” e “San Vicente”.

 

·                     A famosa dupla sertaneja Pena Branca & Xavantinho teve que ser desfeita em 1999 com o falecimento do segundo. Desde então, Pena Branca vem consolidando sua carreira solo, fato que mais uma vez pode ser constatado com o lançamento de seu novo CD “Cantar Caipira” que chega ao mercado através da gravadora Velas. O repertório é essencialmente inédito e autoral, mas há três boas regravações: “Jardim da Fantasia” (de Paulinho Pedra Azul), “Casinha de Palha” (de Godofredo Guedes, que vem a ser o pai do compositor Beto Guedes) e o tema folclórico “Cuitelinho” (adaptado por Paulo Vanzolini e que ficou famoso na interpretação de Milton Nascimento).

 

·                     A obra autoral do excelente musicista Mário Sève é visitada pela cantora Carol Saboya em “Chão Aberto”, recém-lançado CD que chega às lojas através do selo Sala de Som. Exímio executor de instrumentos de sopro (onde se destacam flauta e sax), Mário se mostra um inspirado criador de melodias, embora nem todas sejam de fácil assimilação. Todas as faixas são assinadas com parceiros como Edu Krieger, Chico César, Guile Wisnik e Mauro Aguiar, este uma agradabilíssima surpresa. Carol (que é filha do pianista Antônio Adolfo) canta bem legal com sua voz suave e doses exatas de técnica e emoção. Os melhores momentos ficam por conta da bela faixa-título, da contundente “Feito a Mão” e da delicada “Finais Possíveis”.

 

·                     O artista argentino Fito Paez realizou, no final de 2008, show no Canecão, no Rio de Janeiro, o qual, devidamente registrado, irá se transformar em CD e DVD ao vivo, os quais aportarão no mercado ainda neste primeiro trimestre. O projeto conta com as participações especiais de Milton Nascimento, Herbert Vianna, Vanessa da Mata e Ana Cañas.

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor


Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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