Musiqualidade

R E S E N H A

 

Cantor: FRANCIS HIME

CD: “O TEMPO DAS PALAVRAS – Ao Vivo”

Gravadora: BISCOITO FINO

 

Francis Hime (Foto:Divulgação)
Ainda na infância, o cantor e compositor carioca Francis Hime iniciou seus estudos de piano clássico no Conservatório Brasileiro de Música. Foi, no entanto, nos anos sessenta, após algum tempo aprimorando a técnica de instrumentista na Suíça, que ele enveredou pelo caminho da música popular. Seu primeiro parceiro foi Vinicius de Moraes e, logo em seguida, ele participou de vários festivais de música, tendo suas criações interpretadas por nomes como Elis Regina, Jair Rodrigues e o grupo vocal MPB-4. O reconhecimento nacional, contudo, surgiu somente na década seguinte quando começou a desenvolver parcerias com Chico Buarque. São de autoria da dupla pérolas do nosso cancioneiro, tais como “Trocando em Miúdos”, “Atrás da Porta”, “Embarcação”, “Meu Caro Amigo” e “Vai Passar”, entre outras. Deu-se, então, o seu período áureo criativo, durante o qual ele lançou ótimos discos, alguns deles já relançados em formato CD. Sua obra fonográfica, no entanto, escasseou-se nos anos noventa, por conta de modismos oportunistas que assolaram o mercado nacional. Francis somente voltou a lançar trabalhos com frequência na virada do século com o surgimento da gravadora Biscoito Fino, dirigida por sua esposa, a também cantora Olívia Hime, e hoje o celeiro maior da música de qualidade brasileira.

Em 2009, para comemorar os seus setenta anos, Francis lançou um CD duplo: um trazia o repertório baseado em canções inéditas e o outro apresentava versões para piano solo de composições que ele havia feito para o cinema. Esse trabalho deu origem a show apresentado no Sesc Pinheiros, o qual, devidamente documentado, chegou recentemente ao mercado em CD e DVD. O registro em vídeo é bem mais abrangente e abre espaço para o Francis pianista, fazendo surgir por trás dele projeções de alguns dos filmes cujas trilhas levaram a sua assinatura. Já o repertório do CD (intitulado “O Tempo das Palavras – Ao Vivo”), no qual Francis se faz acompanhar por músicos do quilate de Gabriel Improta (guitarra), Jorge Helder (contrabaixo), Diego Zangado (bateria), Marcelo Bernardes (sax tenor) e Dirceu Leite (clarinete e sax soprano), é composto por dezesseis faixas que, de forma bastante apropriada, fazem uma espécie de resumo da carreira do artista.

Da lavra mais recente, merecem destaque os sambas “Cinema Brasil”, composto com Joyce, inspirado tema que perfila diversos nomes de personagens e películas que marcaram o cinema nacional, e a bela homenagem “Pra Baden e Vinicius”, parceria com Paulo César Pinheiro, em que a melodia, ainda que em moto-contínuo, termina soando arrebatadora. No terreno das canções de cunho sentimental, “Existe um Céu” (gravada originalmente por Simone para a trilha sonora da telenovela global “Paraíso Tropical”, de 2007) ganha contornos de obra-prima, firmando-se como uma das melhores parcerias de Francis com o já constante colaborador Geraldo Carneiro. A delicada “O Sim pelo Não”, composta com Edu Lobo, se transforma em outro dos pontos altos do recém-lançado projeto.

No campo dos resgates, sempre é alvissareiro reouvir “Anoiteceu”, de Francis e Vinicius de Moraes, agora abrilhantada pelos vocais de Malu Von Krugel e Eliza Lacerda, e “Amor Barato”, outra ótima parceria com Chico Buarque, gravada por este no seu álbum “Almanaque”, de 1982.

Francis está cantando bem melhor e, embora sua voz não esteja entre as mais potentes nem seu timbre encha os ouvidos de prima, ele sabe se fazer cativar por conta de interpretações convincentes. De fato, sua obra merece respeito e o novo trabalho vem ratificar isso em muito boa hora!

 

N O V I D A D E S

 

Áurea Martins (Foto: Divulgação)
· “De Ponta Cabeça” é o título do belo CD que chegou há pouco tempo às lojas através da gravadora Biscoito Fino e que mostra a grande cantora Áurea Martins (infelizmente, ainda tão pouco conhecida pelo público em geral) mergulhando em dezesseis canções cujas letras são assinadas por Hermínio Bello de Carvalho (as melodias são de gente do porte de Moacyr Luz, Pixinguinha, Vital Lima, Vidal Assis e Cláudio Jorge). Ainda com voz firme e poderosa, apesar das sete décadas de vida, Áurea interpreta, nesse seu quarto disco de carreira, as dores de amores que são distribuídas entre sambas, boleros e até blues. Os melhores momentos desse bem-vindo álbum (cujos inspirados arranjos são assinados por Lucas Porto) ficam por conta das faixas “Me Diz, Ô Deus”, “Judiarias”, “Isso É Que É Viver” e “Bola no Bola”, esta uma canção que serviria como uma luva para a eterna Elis Regina deitar e rolar. Entre as músicas mais conhecidas estão “Cobras e Lagartos” (uma criação de Hermínio com Sueli Costa), que aparece em registro delicado, bem diferente da interpretação visceral dada, nos anos setenta, por Maria Bethânia, “Pressentimento” e “Mas Quem Disse Que Eu Te Esqueço?” (parcerias com Elton Medeiros e Dona Ivone Lara, respectivamente), as quais surgem reunidas em medley. Imperdível!

 

· Já se encontra disponível o EP “Cansado” do cantor e compositor baiano Alex Sant’anna, radicado em Sergipe há vários anos. O trabalho comprova um louvável amadurecimento musical do artista tanto na arte de criação como na de interpretação. Alex está cantando bem melhor e as quatro canções apresentadas são, de fato, inspiradas e muito bem acabadas, com destaque para “Basta Morrer” e “Engolindo Sapo” (esta conta com a participação especial do catarinense Wado, que reside em Maceió). Como bônus, surgem as faixas “Poesia de Barro” e “Aprendendo a Mentir”, ambas pinçadas do seu álbum de estreia, o bom “Aplausos Mudos, Vaias Amplificadas”. Vale super a pena conhecer!

 

· Chegou às lojas, no finalzinho do ano passado, “Navilouca – Ao Vivo”. Trata-se do novo projeto do grupo Pedro Luís e a Parede, lançado nos formatos CD e DVD através de uma parceria entre as gravadoras MP,B e Universal. O CD é composto por quatorze faixas, dentre as quais maravilhas como “Ponto Enredo”, “Santo Samba” e “Fazê o Quê?”, e conta com a participação de Herbert Vianna no medley que reúne ”Selvagem” e “Chuva de Bala”. Já o DVD, além do líder dos Paralamas do Sucesso, traz, como convidado especial, o cantor pernambucano Lenine na faixa “Pena de Vida” e apresenta, no total, dezesseis números.  

 

· Dado Villa-Lobos, ex-integrante da banda Legião Urbana, promete para o primeiro semestre deste ano o lançamento de seu segundo CD de estúdio, o qual terá Kassin como responsável pela produção e contará com as participações especiais dos Paralamas do Sucesso e de Chimbinha, o guitarrista da banda Calypso.

 

· Mais de um ano depois de lançado nos Estados Unidos, chegou recentemente ao mercado brasileiro “Haih… or Amortecedor…”, o primeiro álbum de estúdio do grupo Os Mutantes após trinta e cinco anos de jejum. O repertório conta com quinze faixas. E se, na edição nacional, entraram quatro canções inéditas (“Amortecedor”, “Zheng He”, “Call Me” e “Singin’ the Blues”), das treze músicas do produto original foram cortadas “Nada Mudou” e “Gopala Krishna Om”. Os melhores momentos ficam por conta de “Querida Querida”, “2000 e Agarrum”, “Anagrama” e “Samba do Fidel”, as quatro parcerias de Sérgio Dias e Tom Zé.

 

· O titã Sérgio Britto lançou recentemente, através da gravadora Universal, o seu terceiro CD. Intitulado “SP55” (nome de uma rodovia de São Paulo), o trabalho vem comprovar o que já se esboçara nos dois álbuns anteriores: que Sérgio é, realmente, um compositor inspirado. Produzido por Emerson Villani, o disco traz dezesseis faixas, mas apresenta, de fato, quatorze canções (é que duas delas surgem também em versões remix, assinadas por Drumagick, o duo paulista de drum”n”bass). Sérgio canta bem legal e dão um brilho especial ao projeto as participações especiais das cantoras Wanderléa na bossa “Essa Gente Solitária”, Negra Li em “Aqui Neste Lugar” e Marina De La Riva em “Pra Te Alcançar”, esta uma das melhores faixas, ao lado da instrumental “Skateboard”, do samba pop “Sérgio e Raquel” e da delicada “Águas Paradas”. A pegada roqueira aparece esporadicamente, como em “Tempo Não É Dinheiro” e a vida familiar do artista ganha papel de destaque não apenas nas fotos que fazem parte do encarte, mas também através de temas como “Nossa Religião” e dos acalantos “Júlia”, “Essa Onda Não Me Pega” e “Áh, Muleke!”. Prioritariamente autoral, o CD abre espaços para temas alheios com as releituras de “Iracema” (de Adoniran Barbosa), “Eres” (do grupo mexicano Café Tacuba) e “Ella Usó Mi Cabeza Como um Revolver” (da banda argentina Soda Stéreo).

 

· Filha do compositor e sanfoneiro Dominguinhos, a cantora Liv Moraes lançou recentemente, através da gravadora Atração, o CD intitulado “É Você”. Ela canta bem legal e o repertório dosa xotes e baiões com canções românticas. Produzido pela mãe Guadalupe ao lado do músico Sandro Haick, o álbum traz várias canções criadas pelo papai famoso (além da faixa-título, estão lá “São João Bonito”, “Fogueira no Quintal” e “Oi Lá Vou Eu”, parcerias com Anastácia, “Doce Princípio”, feita ao lado de Climério, e “Teu Carinho”, composta com a já citada Guadalupe), além de temas assinados por Caetano Veloso (“O Ciúme”), Petrúcio Amorim e Rogério Rangel (“Coração Menino”), Toninho Horta e Felipe Cordeiro (“Amar Como Te Amo”) e pela dupla Antônio Barros e Cecéu (“Chameguinho” e “Nem Que Pare o Coração”). Massa!

 

 

RUBENS LISBOA é compositor e cantor

Quaisquer críticas e/ou sugestões serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br  

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