Musiqualidade

R E S E N H A

Cantor: EDU LOBO
CD: “EDU 70 ANOS”
Gravadora: BISCOITO FINO

Filho de pai pernambucano (o compositor Fernando Lobo, autor de sucessos do nosso cancioneiro, como “Chuvas de Verão”, “Nega Maluca” e “Ninguém me Ama”), o cantor e compositor Edu Lobo, não obstante ter nascido em terras cariocas, traz certamente o DNA que o faz ter tamanha familiaridade com ritmos nordestinos, a exemplo da ciranda, do frevo e do baião. Tanto que seu primeiro instrumento foi o acordeão, somente depois de algum tempo tendo passado a se dedicar ao violão. No início de sua carreira, chegou a formar um grupo com Dori Caymmi e Marcos Valle, mas foi a sua primeira parceria com Vinicius de Moraes, feita em 1962, que o possibilitou a gravar, naquele mesmo ano, o primeiro compacto (o LP de estreia, “A Música de Edu Lobo por Edu Lobo”, somente viria três anos depois). Em seguida, outro parceiro, Ruy Guerra, levou-o a uma linha mais combativa e, juntos, criaram pérolas como “Canção da Terra”, “Reza” e “Aleluia”. Mais adiante, Edu compôs trilhas para teatro e participou de festivais de música popular, conseguindo alcançar o primeiro lugar tanto em 1965, com “Arrastão” (outra parceria com Vinicius, a qual ganhou arrebatadora interpretação de Elis Regina), como em 1967, com a obra-prima “Ponteio” (feita com Capinam, defendida por ele ao lado de Marília Medalha). Entre 1969 e 1971, morou nos Estados Unidos, onde aprofundou seus estudos musicais, tendo trabalhado, nessa época, com Sergio Mendes e Paul Desmond.
Quando retornou ao Brasil, passou a lançar discos e fazer shows com assiduidade e, a partir de 1983, começou a compor de forma sistemática com Chico Buarque, o que resultou em quatro trilhas para espetáculos (“O Grande Circo Místico”, “Dança da Meia Lua”, “O Corsário do Rei” e “Cambaio”).
Em agosto do ano passado, Edu completou sete décadas de vida e foi esse o mote para a realização de uma apresentação especial realizada no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, a qual, devidamente registrada, aportou recentemente às lojas, através da gravadora Biscoito Fino, em um CD que acondiciona dezenove faixas sob a direção musical do pianista Cristóvão Bastos.
O show contou com convidados especialíssimos. Maria Bethânia (com quem Edu dividiu um disco em 1966) reviveu a seminal “Pra Dizer Adeus” (de Edu e Torquato Neto) e pôs sua voz abençoada a serviço da bonita “Cirandeiro” (de Edu e Capinam). Participação afetiva, o filho Bena Lobo dividiu os vocais da animada “No Cordão da Saideira” e da já citada “Ponteio”. Já Chico Buarque, inequivocamente sentindo o peso dos anos no vigor da voz, cantou três grandes músicas feitas pelos dois: “A História de Lily Braun”, “Lábia” e “Choro Bandido”. Nome mais recentemente idolatrado pelos medalhões da MPB, a cantora Mônica Salmaso surgiu irretocável em “A Mulher de Cada Porto”, “Valsa Brasileira” e “Coração Cigano”. Juntos, todos entoam, ao final, “Na Carreira” (essas últimas quatro canções também são parcerias com Chico).
Edu ainda apresentou “Pé de Vento”, um tema instrumental de primeira qualidade, resgatou “Chegança” (criada ao lado de Oduvaldo Viana Filho) e jogou luzes sobre a belíssima “Noite de Verão” (outra com Chico), música belíssima que inexplicavelmente passou batida quando de seu lançamento. Ainda sozinho, ele abriu espaço para novas releituras de “Beatriz” e “Frevo Diabo” (outras feitas com Chico), “Vento Bravo” (letrada por Paulo César Pinheiro), “Ave Rara” (parceria com Aldir Blanc) e “Canto Triste” (composta com Vinicius).
Trata-se, assim, de um projeto revisionista muito bem-vindo que, de maneira oportuna, louva um dos nossos maiores artistas. Fundamental em toda e qualquer cedeteca que se preze. Salve, Edu Lobo!

N O V I D A D E S

* As perdas decorrentes dos términos de relações amorosas e suas superações são os temas presentes nas letras de algumas das nove canções que compõem o repertório do primeiro CD da cantora e compositora Nubia Maciel (vocalista e fundadora do grupo paulistano Samba de Rainha), um trabalho independente que traz a assinatura de Gustavo Ruiz na produção musical e se intitula sugestivamente “Uma Qualquer”. São essas lamúrias que o ouvinte encontra nas faixas “Já Não Te Quero Mais” e “Peito Rasgado” (ambas de Oui Madame, a segunda composta com Nubia). Dona de bonita voz de timbre grave, a artista deverá ser comparada a Zélia Duncan, muito também pela pegada pop que o álbum assume em seu começo, mais fortemente nas faixas “Como É Bom Esse Amor” (dela em parceria com Robson Oliveira) e “Eu Amei” (outra de Oui). Mas é na sequência, quando flerta com um cancioneiro de cunho mais popular, que o disco realmente cresce, transformando as faixas “Às Vezes Não” (de Nubia e Aidée Cristina) e a canção-título (dela e Bianca Kovac) nos destaques do repertório apresentado. No campo das músicas mais animadinhas, há espaço para o pseudo-carimbó “Mexe Mexe” (composta pela artista ao lado de Oui) e para o samba “Alvo Errado” (parceria com Hailtinho Navio), dois bons momentos. Ao final, o rock “Medo de Olhar para Si” (do emergente Leo Cavalcanti) fecha o CD com insuspeitas inserções de cuíca e tamborim. Bem legal, o que faz com que se deva prestar atenção nessa carreira solo que ora se delineia!

* Abafado por outras comemorações de nascimento ocorridas em 2013, praticamente passou batido que o compositor Lupicínio Rodrigues, um dos maiores de toda a história da nossa MPB, completaria, se vivo estivesse, cem anos. Para marcar esta data, a gravadora Universal pôs nas lojas uma interessante compilação intitulada “Cadeira Vazia”, composta por dezesseis faixas. São fonogramas gravados por Elis Regina (a canção-título e “Maria Rosa”), Maria Bethânia (“Foi Assim” e “Loucura”), Gal Costa (“Volta” e “Um Favor”), Paulinho da Viola (“Nervos de Aço”), Gilberto Gil (“Esses Moços”), Caetano Veloso (“Felicidade”) e Elza Soares (“Se Acaso Você Chegasse”), entre outros, os quais terminaram por ganhar rigorosa remasterização. Lupicínio é dez e sua obra musical merece ser reverenciada!

* O quinto CD da carreira do cantor e compositor Zé Ricardo chega às lojas através da gravadora Warner Music. Intitulado “7 Vidas” e produzido por Moogie Canazio, o álbum é composto por dez faixas, nove delas inéditas e autorais, e mais a regravação de “Azul” (de Djavan). Bom cantor e compositor inspirado, Zé construiu um disco harmonioso do qual se destacam as faixas “Coração Gigante”, “Izabella”, “Você Fez Casa em Mim” e “Na Ponta do Pé” (esta uma parceria com Gabriel o Pensador).

* A cantora, compositora e violonista Badi Assad está lançando um CD voltado para a gurizada. Trata-se do independente “Em Cantos de Casa” que chega às lojas através do selo Quatro Ventos, trazendo a assinatura da própria artista na produção e direção musical. Ela é também a autora dos doze temas que compõem o álbum e de seus arranjos, os quais surgem adornados com violão, ukulele e contrabaixo, além de instrumentos de percussão confeccionados com materiais reciclados. A ideia é mostrar o cotidiano de uma criança através do mundo mágico de uma casa totalmente feita com instrumentos musicais. O baterista Guilherme Kastrup e o baixista Ricardo Prado surgem como convidados do repertório que tem, entre os seus destaques, as faixas “Logo de Manhã”, “Três Tristes Tigres”, “Qual É a da Água?” e “Corpinho Musical” (esta contando com a intervenção do sempre bem-vindo Marcelo Pretto).

* O selo carioca Discobertas pôs recentemente nas lojas o Volume 1 do projeto “Live Jazz in Rio – O Couro Tá Comendo””, registro ao vivo de apresentação realizada pelo pianista, compositor e cantor João Donato no extinto Studio RJ em dezembro do ano passado (o Volume 2, ao menos por enquanto, somente está sendo vendido nos shows do aclamado artista que nasceu no distante Acre). São treze faixas, dez delas autorais, através das quais o ouvinte poderá se deliciar com inspiradas parcerias feitas com Gilberto Gil (“Bananeira” e “Emoriô”), Martinho da Vila (“Gaiolas Abertas” e a bacanérrima “Suco de Maracujá”), Tom Jobim (“Quando a Lembrança me Vem”), Paulo André (“Nasci Para Bailar”) e Lysias Ênio (“Até Quem Sabe”). Acompanhado por instrumentistas virtuosos (Robertinho Silva na bateria, Luiz Alves no contrabaixo e Ricardo Pontes no sax e flauta), Donato mostra que se encontra em perfeita forma no alto de suas oito décadas de vida, fato constatado principalmente através dos vigorosos momentos instrumentais como “O Sapo” e “Malandro”. Um projeto fundamental para quem tem bom gosto!

* Elba Ramalho estreou, no dia 23 do mês passado, em Salvador (BA), nas companhias do grupo instrumental pernambucano Sagrama, do quarteto de cordas Encore, do baterista Tostão Queiroga e das sanfonas de Beto Hortis e Marcelo Caldi, o aguardado show “Cordas, Gonzaga e Afins”, ponto alto das comemorações dos seus trinta e cinco anos de carreira. Esse mesmo espetáculo será devidamente registrado ainda este mês, em apresentação a ser realizada em Recife (PE), para futuro lançamento nos formatos CD e DVD. O repertório do projeto entrelaça a obra de Luiz Gonzaga com músicas de Alceu Valença, Caetano Veloso, Geraldo Azevedo, Gilberto Gil, Lenine e Zé Ramalho, entre outros. Paralelamente, em estúdio carioca, sob a direção de Yuri Queiroga e do filho Luã, Elba está terminando de colocar as vozes nas faixas de seu próximo CD, o qual contará com as participações especiais do sergipano DJ Dolores, da cantora portuguesa Carminho e da nossa Nana Caymmi. Elba é dez!

* O cantor e compositor Alceu Valença tenciona lançar em breve um álbum (“As Quatro Estações de Alceu Valença”) que reunirá canções que serão disponibilizadas paulatinamente na web. A primeira delas, inclusive, já pode ser baixada: trata-se de “Quando o Amor Vai Embora”, um xote romântico que merece ser conhecido. Enquanto isso, está chegando às lojas o CD (também disponível em DVD) “Valencianas”, registro ao vivo de concerto sinfônico realizado em 2012 no qual o pernambucano teve algumas de suas músicas executadas pela Orquestra Ouro Preto, sob a regência do maestro Rodrigo Toffolo. Os arranjos majestosos misturam as cordas clássicas com instrumentos característicos da música nordestina (a exemplo de sanfona, zabumba e rabeca), revestindo com grande beleza canções já antológicas, tais como “Cavalo de Pau”, “Coração Bobo”, “Estação da Luz”, “Sete Desejos”, “Tropicana” e “Anunciação”.

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Canta Brasil”, veiculado pela Aperipê FM todas as segundas-feiras, às 10 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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