Prof.ª Dr.ª Andreza Maynard
Universidade Federal de Sergipe
Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)
Nos últimos meses temos ouvido a expressão “novo normal”. Ela se refere à Covid-19, que se espalhou rapidamente por vários países e impôs uma mudança nos hábitos cotidianos de milhares de pessoas. Ela também alude a situações de readequação das sociedades diante de crises, como a Primeira e Segunda Guerra Mundial, quando o perigo, era explicito e não havia o que contestar. Mas em 2020 a ameaça, o vírus, é invisível a olho nu.
Atenta às estratégias mais eficazes contra a propagação do Coronavírus, a OMS tem recomendado o distanciamento social, o uso de máscaras e a adoção de hábitos mais estritos com a higiene em geral. Enquanto isso acompanhamos as notícias sobre as medidas adotadas pelos países para evitar o contágio, vemos os profissionais da saúde assumirem a linha de frente no atendimento aos infectados e somos impactados com números que consternam e assombram.
As duas guerras mundiais também causaram medo e tristeza. A Primeira Guerra (1914-1918) estabeleceu um novo padrão de enfrentamento bélico. Foram utilizadas armas modernas, produzidas em escala industrial, os civis se tornaram alvo dos exércitos nacionais e entre 20 e 30 milhões morreram. O mundo não foi o mesmo depois disso.
Quando a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) começou, as pessoas tinham noção do que poderia acontecer. Numa entrevista concedida para o Imperial War Museum, o inglês Harry Alpress afirmou: “Nós sabíamos que a guerra estava chegando, verdadeiramente, em nossos corações”. Ainda em 1938 muitas trincheiras inglesas foram construídas, assim como abrigos antibombas foram pensados para proteger os civis antes do início do conflito.
No contexto da Segunda Guerra havia um “novo normal”. Os trabalhadores passaram a carregar máscaras de proteção contra gases venenosos e as malas estavam sempre prontas caso fosse necessário evacuar rapidamente um bairro, ou cidade. Houve situações em que foi preciso escapar da morte só com a roupa do corpo. A vida importava mais que os bens materiais. Apesar disso, aproximadamente 85 milhões de pessoas morreram durante a Segunda Guerra. O mundo havia mudado de forma intensa, o que levou as sociedades a adotarem uma nova postura diante da realidade do pós-guerra.
Em 2020 palavras de origem inglesa, como home office, homeschooling, lockdown e lives, estão na ordem do dia. Uma nova realidade nos coloca a necessidade de pensar outras práticas. A pandemia impôs mudanças, mas também expos nossas fraquezas. Nem todos tem condições de permanecerem isolados em casa. De acordo com dados do IBGE (2019), entre os brasileiros mais pobres 60% residem em moradias em que falta ao menos um serviço de saneamento básico.
Num país com desigualdades sociais gritantes, há os que entendem a gravidade da situação, querem e podem manter as normas de segurança; existem os que entendem, querem e não tem condições de se proteger; há os que fingem se importar e os que nem isso fazem. No dia 28 de abril de 2020 o Brasil ultrapassou o número de 4.653 óbitos observados na China. Registrou-se a morte de 5.017 brasileiros por Coronavírus e o país inteiro ouviu um “E daí?”, dito pelo presidente, ecoar sobre a dor de milhares de famílias.
O Brasil enfrenta a Covid-19 pela primeira vez, assim como outros países. Todos estão preocupados com a economia mundial, mas a prioridade tem sido a saúde das pessoas. Estamos experimentando uma situação de crise gravíssima e é preciso colocar a preservação da vida humana em primeiro lugar. Este é o “novo normal”.