É muito pouco!

Leio notícia do Folhapress: “O DETRAN de São Paulo informou ontem que foram instaurados 2.965 processos administrativos em 2009 contra motoristas que foram flagrados em blitze de lei seca no Estado”.

 

Segundo a notícia, em 99% dos casos o condutor teve sua carteira de habilitação retida. Houve um aumento substancial desses números em relação ao ano anterior; em 1998 foram instaurados 1.415 processos e em 1.999 atingiu 2.965; um aumento de quase 110%.

 

Houve neste aumento um acréscimo de fiscalização? Possivelmente sim, embora os dados não comprovem tal eficiência do DETRAN e dos seus mecanismos de controle.

 

A notícia não esclarece se houve aumento no número de blitze realizadas, aparelhos etilômetros utilizados, ou acréscimo de exames realizados.

Sabe-se apenas que é crescente o número de contraventores prenunciando já uma guerra perdida.

 

Passado o medo de ser flagrado em pileque, o condutor de veículo talvez esteja sendo estimulado a não mudar seus hábitos. Isto é; a lei do bafômetro só atingiu o motorista que em regra insiste em cumprir rigorosamente as leis, todas as leis e, sobretudo, as leis do trânsito.

 

O indivíduo contumaz contraventor está convidado a persistir nos seus maus hábitos, e por consequência bebendo em demasia antes de dirigir.

Por quê? Poderá perguntar alguém que se gaba da eficiência do mecanismo fiscalizador flagrando cada vez mais.

 

Porque, longe de decrescer, está crescente o número de contravenção no trânsito. Uma simples constatação rotineira do nascer ao levantar do sol comprova isso, com ou sem eclipse, que possa esconder tais abusos. Um simples semáforo contempla crescentes desrespeitos às suas cores. Um jeitinho justifica o estacionamento em local proibido, uma parada em fila dupla, uma interrupção de tráfego, uma descontinuidade de cruzamento, um deslocamento em contramão, uma violação da passagem de pedestre, e saia de baixo senão você se arrebenta!

 

Interessante porque os órgãos gestores do trânsito não vêem, nem constatam. Acham que tudo vai ser consertado com boas maneiras de persuasão e conselhos.

 

E tanto isso é verdadeiro que a própria notícia da Folhapress permite inferir: No ano passado o DETRAN de São Paulo expediu 3.388 intimações e notificações para comparecimento à sede do órgão em procedimento de processo de suspensão do direito de dirigir.

 

Destes processos, apenas 278 foram concluídos, cerca de 8,2% do total. Para onde foram os 91,8% restantes? Estão inconclusos por prescritos ou não iniciados por impossível notificação de intimação? Com certeza, o motorista contraventor continua risonho e fagueiro, dirigindo sem carteira e convidado a continuar bebericando seu trago também.

 

Ou seja, a lei do bafômetro, por sua pena branda, só atinge quem não gosta de delinquir e foi flagrado no engano. E este resultado e é tão verdadeiro que dos 278 processados, 224 foram reavaliados, isto é foram “punidos” com aulas tolas, uma espécie de castigo infantil de crianças mimadas.

 

Outros 53 condutores tiveram sua carteira suspensa e um, unzinho só, teve a carteira definitivamente cassada por reincidência em infração; ou seja, um em 3.388 mereceu a pena capital de perder a carteira habilitacional.

 

Tudo isso não é uma constatação da falência da legislação? O que impede este único condenado de continuar a dirigir?

 

Acho que o problema do trânsito não se resolve com palavras doces e aulas de bons hábitos. Isso só serve para dar emprego desnecessário, querendo promover uma educação fora da escola, quando é no banco escolar que se deve aprender a conviver e respeitar as regras, sem as quais a vida resta barbárie; uma barbarização montada em muitos cavalos força de potência.

 

É pouco, muito pouco, o resultado fiscalizatório do trânsito. O dado revela que não está sendo levado a sério. Prenuncia-se uma guerra já perdida. As penas são brandas e até as multas parecem que são sonegadas com facilidade.

 

Parece que há qualquer coisa que obstaculiza a punição e ninguém o denuncia, e isso vem estimulando o erro.

 

Pelo que se constata, a solução para segurança no mundo parece vir da fiscalização impessoal mediante censores eletrônicos.

 

Contra isso já se alevantaram os nossos advogados na defesa dos seus prováveis contraventores clientes, vendo-lhes um mercado promissor.

 

Assim, um semáforo vigiado por câmera para flagrar violadores, por exemplo, deve vir previamente com um aviso em letras garrafais da sua presença. Um sinal de contramão também. Idem para os estacionamentos proibidos, etc, etc. Se não tem o aviso prévio gaiato não há fato nem multa.

 

Por outro lado, os órgãos gestores do trânsito são de incompetência sem par. As cidades ainda carecem da mudança administrativa, afinal isto era seara dos Estados. Acabou-se o tempo das antigas inspetorias de veículos, quando o inspetor de trânsito era a figura mais destacada na cidade. Neste tempo o problema não era o trânsito, mas o inspetor.

 

Depois o problema suscitou usura de arrecadação, garfando recurso até de bicicleta que devia portar duas placas, uma da Inspetoria de Veículo e outra da Prefeitura, e o ciclista tendo que vigiar para não perder uma das placas. Neste tempo era comum o arresto de bicicletas sem placas em blitze móveis. Se brincasse até velocípede era tirado de menino.

 

Hoje, por disposição cidadã, o abacaxi de organizar o trânsito passou a ser descascado pelas Prefeituras, e ao que parece, estas ainda não absorveram a tecnologia competente e o pessoal qualificado para tal.  

 

Querem alguns, e a imprensa lhes é aliada, que o fluir do tráfego se faça sem amarras ou traumas.

 

Para estes, a calçada não pertence ao pedestre, a rampa de deficiente é espaço de motos e bicicletas, e as luzes semafóricas adornos alegóricos para colorir as ruas.

 

E porque o erro sempre é mais doce que o acerto, a maioria enveredará para tal se não houver uma resposta dos que se sentem ameaçados.

 

Assim, estamos dirigindo com medo e andando nas ruas em situação constrangedora, porque a desorganização do trânsito está se tornando um caso epidêmico de polícia.

 

E que terrível! Em pleno século 21, em pleno fastígio tecnológico, estamos virando mais bandidos que mocinhos! E precisando de aparato policial para nos acompanhar os passos! Num tempo em que se esperaria que os homens estivessem convivendo ordeira e pacificamente!

 

Que podemos fazer então? Desistir? Avançar no sinal vermelho também? Tomar cachaça antes de dirigir? Apelar para os deuses distantes? E ainda se fala que o nosso problema é de aquecimento global, esta nova religião de tolos!

 

É pouco! É muito pouco uma cidade ou um Estado como São Paulo só possuir um único punido por reincidência em embriaguez no trânsito!

 

É dizer que a nossa legislação neste particular é inócua.

 

Melhor seria que o veículo contraventor fosse desapropriado com rapidez e maior sensatez.

 

Mas por que a máquina, se ela é inerte e desprovida de vontade?

 

Pela mesma razão da apreensão e destruição das armas de fogo. As armas são utensílios e ferramentas fabricadas para a defesa do homem contra as feras, todas as feras que lhe são inimigas.

 

Os automóveis conduzidos como bólidos desrespeitando regras, matando e dilacerando circunstantes são armas igualmente perigosas. Mereciam ser retidas e desapropriadas pelo Estado, ou então ser incineradas como aconteceu recentemente num dos bairros de Aracaju, por sua população enfurecida.

Uma espécie de ira divina ou satânica destrambelhada atingiu um povo indefeso e sem esperança.

 

E ainda houve quem chamasse o corpo de bombeiros para apagar aquele fogo ilustrativo de desesperança na ordem e no saneamento do caos.

 

Que os órgãos gestores do trânsito se aliem aos bons motoristas coibindo os maus. Que sejam rijos na aplicação das multas! Que os semáforos sejam vigiados por câmeras, até para dirimir contendas de colisões! Que os pedestres sejam amparados e defendidos nas suas faixas! Que os sinais venham acompanhados dos mecanismos repressivos sem os quais viram gravuras sem força!

 

Que os guardas jamais se cansem de flagrar e multar o motorista imprudente, delinqüente e contraventor! Neste particular a multa é um mecanismo persuasório e educador. A sociedade sempre agradecerá! Mesmo quando a opinião publicada divergir. Sua divergência é igual a outras tantas opiniões. E há muitas opiniões que não merecem sequer atenção. A minha, por exemplo, deverá merecer o escarro da indiferença de muitos, sobretudo, dos que preferem a desordem do “laissez faire et passer dégénéré”.

 

Mas, é preciso que alguém externe sua insatisfação com esta degeneração de costumes e violação de regras.

 

Não devemos jamais ser condescendentes com o erro, achando-o tolo, numa espécie de jeitinho, de acomodação. Não há educação sem regras firmes e permanentes.

 

Por tantos casos constatados, e agora se embasando numa mera interpretação de uma notícia boba de rodapé de jornal, podemos dizer que é pouco.

 

Tem sido muito pouco o que os órgãos estatais tem feito para melhorar o nosso trânsito.

 

Dedico estas reflexões a Antonio Samaroni, um medico vitorioso que está melhorando sobremodo o trânsito de Aracaju, com muitas incompreensões inclusive. Afinal quem ousa consertar e por ordem nas coisas, igual a Oswaldo Cruz no seu tempo, recebe mais críticas que elogios.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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