A mais remota instituição representativa dos médicos de Sergipe, em funcionamento de forma ininterrupta celebra
neste 27 de junho oitenta e cinco anos de existência. Refiro-me à Sociedade Médica de Sergipe – SOMESE – que tive a honra de presidir por dois mandatos, de 1993 a 1997.
Na verdade, ela não é a primeira entidade representativa da classe médica de Sergipe. Em 1911 surge a primeira tentativa com a criação da Sociedade de Medicina de Sergipe, sob o comando dos médicos Daniel Campos e Helvécio de Andrade. Não dura muito, apenas um ano, mas nesse curtíssimo tempo consegue publicar a primeira revista médica do estado.
Nova tentativa de organização associativa vai acontecer oito anos depois, com a criação da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Sergipe, em julho de 1919, agora sob o comando do médico clínico Francisco Quintiliano da Fonseca, com a participação ainda de jovens médicos que começavam a se destacar no cenário da nossa medicina, entre eles os cirurgiões Eronides Carvalho, Juliano Simões e, especialmente, Augusto Leite.
Na década de 20, até a data da inauguração do Hospital de Cirurgia, ocorrida em 1926, a entidade exerce papel preponderante na elaboração das políticas de saúde do governo Graccho Cardoso. Nesse período de efervescência científica, Graccho traz a Aracaju o sanitarista Paulo de Figueiredo Parreiras Horta, auxiliar de Osvaldo Cruz, que implementa importantes ações de saneamento e controle de endemias e que culmina com a criação do instituto que mais tarde, em justa homenagem, receberia o seu nome. Com o funcionamento do novo hospital, Graccho oferece a Sergipe finalmente um verdadeiro “ambiente cirúrgico”, nas palavras agradecidas de Augusto Leite.
Curiosamente, a partir daí, a entidade vai entrando em declínio e ninguém mais ouve falar dela. Somente em 27 de junho de 1937, graças ao empenho do Dr. Augusto Leite na liderança do processo, surge a atual Sociedade Médica de Sergipe – a SOMESE – com sua diretoria sendo empossada na sede da Biblioteca Pública.
No período da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) não há registros de ações importantes da entidade médica, somente em 1945 ocorre o que pode ter sido o primeiro movimento organizado da categoria. Uma reunião plenária, com a participação de vários médicos, sob o comando de Eraldo Lemos e Antônio Garcia, define as principais ações de luta da categoria: a criação do conselho de classe, (que na oportunidade a maioria dos presentes se manifestou contrária e não o aprovou), a implantação de um piso salarial e a fixação de médicos nas cidades do interior do Estado.
Augusto Leite mantém-se por doze anos no comando da Somese, sendo substituído em 1949 pelo pediatra José Machado de Souza. Seu sucessor, o alienista João Batista Perez Garcia Moreno, assume a presidência em 1952. Em 1953, ele lidera um movimento para a criação de uma escola médica em Sergipe e chega a criar uma associação mantenedora, mas as condições políticas da época não favoreceram a efetivação do sonho da faculdade.
A partir da segunda metade da década de 50, a SOMESE experimenta uma de suas fases mais áureas, de grande prestígio político. Seu presidente, o Dr. José Machado de Souza, exerce o cargo de vice-governador do Estado, no governo do udenista Leandro Maciel. Machado, com o apoio decisivo de Carlos Firpo, médico e diretor do Hospital Santa Isabel e ex-prefeito de Aracaju, passa o comando da SOMESE para o cirurgião Canuto Garcia Moreno. A partir dessa administração, forma-se um bloco forte e consistente que vai comandar a medicina de Sergipe por uma década, com realizações de grande importância para o seu desenvolvimento, destacando-se a fundação da Faculdade de Medicina em 1961, instalada por Antônio Garcia Filho, após superar indiferenças e obstáculos de todas as naturezas. À época, ele também presidia a Sociedade Médica de Sergipe.
Ainda na década de 50, nacionalmente, a classe médica se organiza com a fundação da Associação Médica Brasileira – AMB, em São Paulo e um sergipano participa ativamente desse momento histórico, fazendo parte inclusive de sua primeira diretoria: Eraldo Machado de Lemos. Justiça se faça, desde a década de 40, seu nome sempre é citado em todos os movimentos médicos do Estado.
A SOMESE ainda não possuía sede própria, suas reuniões aconteciam na Biblioteca Pública e no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e somente em 1968, na administração de Hugo Gurgel, com a ajuda do Governador Lourival Baptista, isso vem a acontecer. À frente da SOMESE até 1969, Hugo conta com o apoio de valorosos companheiros, como Alexandre Menezes, Gileno Lima, José Leite Primo e Dalmo Melo.
A SOMESE participa ainda dos primeiros passos para a fundação do Sindicato dos Médicos, criado na década de 60 e apoia a instalação da Unimed Aracaju, fundada em 1984. Nos primeiros anos, essas duas instituições funcionaram gratuitamente na sede da Somese. A tradicional entidade ainda tem participação decisiva e fundamental para a fundação da Academia Sergipana de Medicina, ocorrida no final do século XX – 9 de dezembro de 1994 -, graças à determinação e ao esforço do médico Gileno da Silveira Lima. Ainda hoje a Academia funciona na sede da SOMESE, com seu total e irrestrito apoio.
As diretorias da SOMESE que se sucedem de Hugo Gurgel até então, cada uma com suas características e realizações, menos ou mais empreendedoras, vêm mantendo acesa a chama do associativismo médico, com inestimáveis serviços prestados à comunidade. No momento em que se comemora essa efeméride, não custa cobrar dos colegas médicos o compromisso em prestigiá-la, participando com entusiasmo da vida de sua entidade maior.
Traçando um paralelo histórico, não foi por acaso que as duas maiores conquistas da medicina sergipana do século passado, a meu ver, o Hospital de Cirurgia e a Faculdade de Medicina, tiveram como fundadores respectivamente presidentes da Somese de então, em pleno exercício de suas funções: os doutores Augusto Leite, comandando a Sociedade de Medicina e Cirurgia e Antônio Garcia Filho, liderando a Sociedade Médica de Sergipe. Difícil imaginar o grande desenvolvimento da Medicina sergipana nos nossos tempos sem a presença marcante, atuante, agregadora e decisiva da SOMESE.