A peleja do Nordeste contra São Paulo

O segundo turno da eleição presidencial pode se transformar num plebiscito entre o Nordeste dito atrasado e o rico e populoso estado de São Paulo. Enquanto este permitiu a espetacular virada que levou Aécio Neves ao segundo turno, a região de cultura mais homogênea e arraigada, principalmente, contribuiu com parcela vigorosa dos votos que garantiu a Dilma Rousseff vencer o primeiro turno com quase 42% dos votos totais.

Não é por outra razão que os dois candidatos veem nesses dois eleitorados o fiel da balança que pode decidir o pleito do próximo dia 26. Em oito dos estados do Nordeste a presidenta conseguiu votações espetaculares, atingindo picos de 70% no Piauí,Maranhão e Ceará. Mesmo na exceção que foi o Pernambuco de Eduardo Campos, onde venceu Marina, a candidata à reeleição conquistou mais de 44% dos votos. Se não repetiu o mesmo fenômeno na região Norte, na maioria dos estados amazônicos Dilma também venceu com folga.

Em São Paulo, consagrado reduto tucano, Aécio conseguiu votação superior a 44% do eleitorado. O que torna essa votação espetacular é o fato de o estado concentrar formidáveis 32 milhões de votos. Mas quando marcha unido o Nordeste é mais forte, com um eleitorado superior a 38 milhões de votantes.

Essa força do Nordeste, região onde vivem as pessoas mais reconhecidas e gratas aos benefícios sociais conquistados nos 12 anos dos governos Lula e Dilma, provoca a ira de brasileiros de outras regiões e outros estados, especialmente, e justamente, do estado de São Paulo.

A vitória esmagadora da petista sobre o tucano nas regiões Norte (onde ela teve 50,52% dos votos e Aécio, 28,26%) e Nordeste (onde Dilma ganhou com 59,58% dos votos e o tucano, 15,40%), gerou uma onda de comentários preconceituosos nas redes sociais contra os moradores da região. Nordestinos foram chamados de burros, preguiçosos, mendigos e outros adjetivos depreciativos.

O colunista social do jornal mineiro "O Tempo", Paulo Navarro, radicalizou nos comentários, chegando a sugerir que fosse realizado um plebiscito para separar as regiões Norte e Nordeste do restante do país. Ele não deve ter levado em conta que em seu estado, Minas Gerais, Dilma também obteve a maior parte dos votos.

Entre outras atribuições preconceituosas propagadas através da internet, os usuários também demonstraram desinformação. A imensa maioria das postagens ligou a imagem do Nordeste e do Norte a uma possível dependência do programa Bolsa Família. Teriam evitado falar essa bobagem se tivessem levado em consideração que dois dos três estados com maior quantidade de beneficiados pelo programa não estão nessas regiões. São Paulo é o segundo maior beneficiário do programa, com 1 milhão e 200 mil pessoas, e Minas é o terceiro, com 1 milhão e 100 mil.

Mas o ápice da estultice xenófoba vem de uma comunidade de quase 100 mil usuários de uma conta no Facebook que se declaram profissionais da classe médica brasileira. Com o título de "Dignidade Médica", as postagens do grupo pregam "castrações químicas" contra nordestinos e a demissão de profissionais com menor nível hierárquico, como recepcionistas de consultório e enfermeiras, se a eleição for vencida pela petista.

Entre postagens de revolta com a situação econômica do País e xingamentos a nordestinos, os participantes confessam que fazem campanha pró-Aécio até dentro do próprio consultório, "público ou privado", buscando convencer os seus pacientes. Um usuário protesta: "70% de votos para Dilma no Nordeste! Médicos do Nordeste causem um holocausto por aí! Temos que mudar essa realidade!".

Assim, São Paulo e Pernambuco são estados-chave no segundo turno da eleição presidencial. Para Aécio Neves, o solo pernambucano é a porta de entrada para diminuir a diferença no Nordeste, região onde Dilma Rousseff teve 12 milhões de votos a mais. O desempenho do tucano no estado foi pífio, "5,9%", mas Marina teve 2,3 milhões de votos, capital político pelo qual ele pretende brigar.

Já o desafio da petista é melhorar a votação em São Paulo, onde ficou 4,2 milhões de votos atrás do adversário. Mas entre o Nordeste a São Paulo há Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral e onde a votação foi parelha, com vitória da candidato à reeleição e uma humilhante derrota do ex-governador local.

Nas regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, Aécio manteve-se à frente da petista. Ele venceu com margem apertada no Sudeste, onde terminou com 39,4% e Dilma com 32,43%; no Sul, com 47,21 contra 36,32 para a presidente; e no Centro-Oeste, onde obteve 40,99 das intenções e a candidata do PT, 32,55% dos votos válidos.

Principal pilar dos votos pela reeleição da presidente Dilma Rousseff, a região Nordeste vive um momento economicamente importante não sofre a retração atacada pelos candidatos oposicionistas. Segundo cálculos do Banco Central, a economia nordestina cresceu 2,55% no segundo trimestre do ano, na comparação com o primeiro, que já havia mostrado expansão de 2,12%.

São taxas sem paralelo no restante do país. Nenhuma das demais regiões obteve dois trimestres consecutivos de alta, e as taxas, mesmo quando positivas, foram bem mais modestas. Os dados do BC e IBGE não permitem detalhar o que distingue os resultados do Nordeste e do Brasil, mas ajudam a entender por que as críticas à política econômica dilmista têm eco menor na região. E porque o eleitor nordestino quer claramente a continuação desse governo. Para revolta dos paulistas.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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