Ultimas partes: O caso Fragmon Carlos Borges

As duas últimas partes (VII e VIII) do ensaio  inédito, Intelectuais comunistas e socialistas sergipanos, do jornalista e pesquisador GILFRANCISCO. .Sem dúvida grande contribuição para preencher as lacunas existentes por falta de pesquisadores que se propõem a enfrentar os empoeirados arquivos de nossas instituições.

                                                           (Parte – VII)

GILFRANCISCO (69)
                                                         Engajamento

Iniciei minhas pesquisas sobre os intelectuais comunistas sergipanos com o livro Flor em Rochedo Rubro: o poeta Enoch Santiago Filho, publicado em 2005 pela Secretaria de Estado da Cultura, onde reunir poemas e textos inéditos do homenageado, além de comentários críticos sobre sua obra, registrando desta forma alguns intelectuais comunistas sergipanos que viviam em torno do grupo Mensagem dos Novos de Sergipe que atuou no cenário cultural e político de Sergipe, desde fins da década de 30 até a publicação da revista Época (Mensário a Serviço da Cultura e da Democracia), que circulou entre 1948/1949. O periódico tinha como colaboradores militantes ou simpatizantes comunistas sergipanos como: Aluysio Mendonça Sampaio, Alina Paim, Alberto Barreto de Melo, Austrogésilo Porto, José Menezes Campos, Jenner Augusto, Márcio Rollemberg Leite, Nelson de Araújo, Paulo de Carvalho Neto entre outros.

  Flor em Rochedo Rubro não despertou nenhum interesse por parte dos professores da área de literatura que estudasse o período modernista em Sergipe. A única crítica veio através do professor do Gabinete Português de Leitura (BA) e da Uneb, Thiago Martins Prado, ao afirmar que “Na crítica da literatura sergipana, o que mais se aproxima dessa postura é o livro Flor em Rochedo Rubro, de Gilfrancisco. O estudo emparelha diversas fontes e testemunhos a respeito do poeta Enoch Santiago Filho e, ao fazer isso, constrói uma imagem fragmentária do artista sergipano que apresenta possibilidades múltiplas de reescritura de sua obra e de sua biografia vindas das lacunas não aproveitadas pelo estereótipo da completude que baseia o discurso oficial. A historiografia literária construída em Flor em Rochedo Rubro, muito ao contrário de projetos como os de Jackson da Silva Lima, é encarada entro de perspectivas microscópicas sustentadas por várias fontes capazes de desenrolar outros ângulos que, diversas vezes, são contraditórios entre si e ainda mais com o discurso consolidado em relação ao poeta Enoch. Alimentar as contradições, nesse caso, é respeitar a multiplicidade de vozes que tentam enunciar, com os meios e as formações que lhe são cabíveis, uma história possível”. (69)

De posse de fontes primárias sobre a geração Mensagem dos novos de Sergipe, escrevi alguns artigos sobre os seus membros: Nélson de Araújo, Aluysio Sampaio, Amando Fontes, Enoch Santiago Filho, Jenner Augusto, Alina Paim, Renato Mazze Lucas, Walter Sampaio, Hélio Nunes da Silva, José Sampaio, Paulo de Carvalho Neto. (70) Apesar de não estarem ligados ao Partido Comunista, nem possuir quaisquer simpatia por sua ideologia os poetas José Amado Nascimento (1916) e Santo Sousa (1919-2013), produziram uma poesia de temática social, este último, produtor de uma poesia mística e filosófica chegou a colaborar no nº3 (janeiro, 1949) da revista Época, com o poema Noite no Beco e publicou em 1964, Pássaro de Pedra e Sono, livro que representa um momento único de intenso lirismo, onde encontramos o espírito mais fundamente criador da poesia de Santo Sousa, sobre o rumo dos homens. (71)

José Amado Nascimento faz parte de um grupo seleto de intelectuais católicos sergipanos, que sufocado pela fé religiosa buscou realizar uma produção poética versada no conhecimento de humanidades. Poemas como Miséria, Augúrios, Poema do menino sem pai, o poeta vai de ônibus, vou-me embora pra Brasília entre outros, atestam não somente o seu humanismo como a ironia, outra face que caracteriza sua poesia. (72) Ambos os poetas oram incluídos no livro de Austrogésilo Santana Porto, O Realismo Social na Poesia em Sergipe, publicado em 1960.

Devido a ligações partidárias e uma amigável correspondência que mantive entre 2003/2008, com o poeta Aluysio Mendonça Sampaio, conduzido por outro poeta, Wagner Ribeiro, organizei em 2006 livro Os Irmãos Aluysio e Walter Sampaio, encontra-se dividido em duas partes: A primeira dedicada a Aluysio Sampaio (julgamento crítico, antologia (prosa) e subsídios biográficos). A segunda dedicada a Walter Sampaio (julgamento crítico, antologia (prosa e poesia) e subsídios biográficos).

Em 2008 publiquei dois livros, A Romancista Alina Paim (coleção Base, nº3, Edições GFS) e O Contista Renato Mazze Lucas (coleção Base nº4, Edições GFS). (73)  Ambos os livros trata pela primeira vez do levantamento biográfico sobre esses dois militantes comunistas. Os livros apresentam textos inéditos ou esparsos do início de suas carreiras literárias. Apesar da formação cultural e intelectual ter sida adquirida na Bahia, Alina Paim publicou seu primeiro romance em 1944, pela Editora Leitura, ligada ao Partido Comunista e em 1955 A Hora Próxima, romance publicado pela Editorial Vitória. Quatro anos antes enquanto pesquisava no município de Cruzeiro, Minas Gerais, para escrever o livro que iria retratar a vida e as lutas dos ferroviários, das mulheres que se deitam nos trilhos da estrada de ferro e exigem pão para seus filhos. Pois bem, foi denunciada pelo juiz da localidade e expediu um mandado de prisão para Alina Paim.  Autora de dez romances, alguns traduzidos para o russo, mandarim e alemão. Foi Alina Paim que em 1944 levou Paulo de Carvalho Neto a Graciliano Ramos, responsável pela leitura de originais dos jovens escritores comunistas, para que o mesmo desce parecer sobre o seu primeiro romance. A romancista sergipana militou na imprensa comunista, contribuição favorável para a divulgação de sua obra: Época (SE), Literatura (RJ), O Momento (BA), Momento Feminino (RJ).

Renato Mazze Lucas, médico psiquiatra colabora primeiramente no jornal A Verdade, no final dos anos 40 e na década de 50 na Folha Popular, onde publica seus contos. Autor de dois livros Anum Branco e outros contos (1961), prefaciado por Astrojildo Pereira e Anum Preto (1967), ambos publicados pela editora do Partido. Renato esteve preso por duas vezes no 28º BC. Para nova edição, reestruturei todo o livro, inclusive mudando o título para O Tempo na História – Renato Mazze Lucas. Acrescentei novos textos, poemas, contos, críticas sobe ambos os livros, depoimentos, ofício e entrevista com a viúva, D. Helena, resultando na duplicação do número de páginas da edição anterior.

Agremiações culturais de jovens intelectuais na Imprensa Estudantil: Grêmio Clodomir Silva & Mensagem dos Novos de Sergipe, pesquisa concluída em 2012, aborda os anos 30, 40 e 50, onde são estudados mais de quarenta jornais estudantis de instituições públicas e particulares, sua relação com o Estado Novo, censura e impressão dos jornais, divulgação das ideias comunistas nos Grêmios culturais, além de acompanhamento da trajetória desses alunos “jornalistas”, os quais muitos se revelaram profissionalmente na imprensa comunista.  Os jornalistas comunistas eram preparados, leais e disciplinados. Na verdade o Partido Comunista Brasileiro existiu durante a maior parte de sua história como um partido político ilegal. Por esta razão, dominar técnicas de ação política clandestina se tornou, para o Partido, uma questão de vida ou morte. Contei com dois textos na apreciação do professor José Lima e do jornalista Ivan Valença, ambos louvaram a pesquisa não somente pelo ineditismo do assunto, mas pela linguagem jornalística com que foi tratado o tema.

A mais recente publicação aconteceu no apagar das luzes de 2014, Época (1948-1949) Revista Modernista de Época, Edição GFS. Reunir neste livro nove textos escritos por sete cavaleiros integrantes da geração de Mensagem dos Novos de Sergipe, que retratam sobre as angústias e conflitos dos intelectuais sergipanos no pós-guerra. Ocorre neste período o que classificamos como a terceira diáspora na literatura sergipana, quando muitos intelectuais migram para a região Sul do país: Aluysio Sampaio, Armindo Pereira, Hélio Nunes da Silva, Nélson Correia de Araújo, Paulo de Carvalho Neto (um pouco antes), Walter Sampaio e outros. Dediquei um capítulo sobre os espancamentos sofridos em abril de 1949 e janeiro de 1951 pelo estudante e jornalista do semanário A Verdade, Fragmon Carlos Borges. Apresentei ainda fichas policiais da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Sergipe de vários intelectuais sergipanos, membros do Partido Comunista Brasileiro, perseguidos ou presos pela repressão do governo de José Rollemberg Leite.

Concluída em 2013, a pesquisa sobre Anísio Dário, a chacina da Rua João Pessoa, foi sugerida pelo professor Antonio Bittencourt Junior, secretário de Direitos Humanos do Estado, que pretende com este livro lançar durante a instalação da Comissão da Verdade, que teria o nome de Anísio Dário. Apresentado pelo professor do curso de Direito da UFS Afonso Nascimento e do advogado, articulista do Jornal da Cidade e Conselheiro do TCE, Clovis Barbosa de Melo, o livro enfoca um período negro na historiografia sergipana, (1947-1951), anos de perseguições, prisões e mortes no governo de José Rollemberg Leite (1912-1996) e que continua negligenciado pelos que estudaram a história política de Sergipe. Foi justamente no primeiro ano do seu tumultuoso governo que ocorreram inúmeras arbitrariedades, inclusive o assassinato do operário comunista Anísio Dário em plena Rua João Pessoa, durante um comício em que o povo protestava contra a cassação do vereador Carlos Garcia e do deputado Armando Domingues, ambos eleitos pelo Partido Comunista Brasileiro.

Concluindo o ciclo, retomo o tema, Intelectuais Comunistas Sergipanos – o caso Fragmon Carlos Borges. Mais uma vez recorri ao professor Afonso Nascimento estudioso desse período político abordado, para tecer alguns comentários acerca do tema em questão. O livro trata de antigos e insolúveis problemas sobre os ideais e as lutas democráticas do povo sergipano, quando enfrentou o sistema autoritário em busca de direitos humanos e das liberdades democráticas, foram rechaçados com balas, espancamentos e sucessivas prisões. O livro encontra-se dividido em quatro partes: I. Espancamentos, II. Onze textos publicados na Imprensa Comunista (os textos apresentados foram publicados nos anos 40, 50 e 60, em Aracaju e no Rio de Janeiro), III. Jornais Sergipanos fechados pelo DIP, IV. Novas Investidas contra a Imprensa Popular.

(68)  GILFRANCISCO: jornalista, pesquisador e professor universitário. Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. http://gilfrancisco.santos@gmail.com
(69)  Revisões para a crítica da literatura sergipana, Thiago Martins Prado. Aracaju, Jornal da Cidade, 14/15 de maio, 2006.
(70) Pequenos Mundos: Nélson de Araújo. Aracaju, Jornal da Cidade, 22/23 de setembro, 1999; O escritor Aluysio Mendonça Sampaio. Aracaju, Jornal da Cidade, 11 de março, 2000. Republicado. São Paulo, Revista da Literatura Brasileira, nº17; Amando Fontes e o proletáriado industrial. Aracaju, Jornal da Cidade, 4/5 de abril, 2001; O poeta Enoch Santiago Filho. Aracaju, Jornal da Cidade, 30/31 de outubro, 2001; A baianidade de Jenner Augusto. Aracaju, Jornal da Cidade, 6 de março, 2003; A RomancistaAlina Paim. Aracaju, Jornal da Cidade, 20/21 de abril, 2006; O Contista Renato Mazze Lucas www.informesergipe.com.br ; O poeta Walter Sampaio. Aracaju, Jornal da Cidade 21/22 de janeiro, 2007. Republicado. São Paulo, Revista da Literatura Brasileira, nº45, 2007; O poeta Hélio Nunes. Aracaju, Jornal da Cidade, 13/14 de janeiro, 2008; A poesia de José Sampaio. Aracaju, Cinform, 12 a 18 de julho, 2010; Paulo de Carvalho Neto, guerrilheiro das letras, blog sergipeeducacaoecultura.
(71) Ver, Santo Souza Pássaro de Pedra e Sono na Transversal do Tempo, GILFRANCISCO. Aracaju, Edições GFS, 2013.
(72)  José Amado do Nascimento – poeta, ensaísta e conselheiro, GILFRANCISCO. Aracaju, blog.claudionunes
(73) As pesquisas foram ampliadas, novos textos esparsos incluídos, além da apresentação de Vladimir Souza Carvalho, para uma 2ª edição.
(74)  O primeiro partido operário brasileiro foi fundado em 1º de fevereiro, 1890, na cidade do Rio de Janeiro e logo editam um jornal – O Echo Popular, que seria o instrumento básico de organização e construção do partido.

(Parte – VIII)

GILFRANCISCO (75)

O Caso Fragmon Carlos Borges

Fragmon Carlos Borges foi Jornalista, orador, dirigente do extinto jornal do Partido Comunista Brasileiro, A Verdade (SE), dirigido por José Waldson Campos, militou como secretário de divulgação e propaganda do partido. Estudioso da questão agrária, o sergipano de Frei Paulo, destacou-se como quadro do Partido Comunista Brasileiro de Pernambuco, tendo se tornado, depois de 1959, pessoa-chave na direção da Revista Novos Rumos (RJ). Morreu em São Paulo nos anos setenta, vítima de um infarto fulminante, quando vivia na clandestinidade imposta pelo regime militar de 1964. Fragmon Carlos Borges foi anistiado com fundamento no Art. 1º da Lei 6.683/79 de 28 de agosto de 1979.

Ligado ao grupo jovem de Mensagem dos Novos de Sergipe, do qual faziam parte Márcio Rollenberg Leite, Carlos Garcia, Aluysio e Walter Mendonça Sampaio, Nélson de Araújo, Paulo de Carvalho Neto, Enoch Santiago Filho, Fábio Silva, João Batista Lima e Silva, Lindolfo Campos Sobrinho, Alberto Barreto de Melo, Jenner Augusto, Florival Ramos, José Menezes Campos, Floriano Garangau, José Nunes Mendonça, Armindo Pereira e outros, dedicados às atividades culturais e a política partidária, simpatizantes ou membros do Partido Comunista Brasileiro, estavam todos envolvidos nos seguintes periódicos: Mensagem (órgão cultural, 1939), Símbolo (Órgão Cultural, 1939) e Época (Mensário a Serviço da Cultura e da democracia, 1948/1949).

Filho de Francisco Carlos Borges e Maria Lali Carlos Borges, Fragmon Carlos Borges, nasceu a 12 de abril, 1927 em Frei Paulo – SE, era parente próximo do engenheiro civil, formado na Bahia Josaphat Carlos Borges, ex- prefeito Municipal de Aracaju (1946/1947), nomeado pela interventoria Federal do coronel Antônio de Freitas Brandão, indicado pela UDN. Devido às qualidades morais e de caráter, técnico de reconhecida capacidade e propriedade, administrador seguro e cioso de suas tarefas, graças aos seus méritos de bom administrador foi nomeado para dirigir o Departamento Nacional de Estradas de Ferro – Seção Bahia. O Jornal do Povo em sua edição de 22 de abril contestou o seu nome para Prefeito de Aracaju, alegando desconhecer a terra, seus homens e sua força política:
“O Sr. Josaphat – disse o povo – foi o homem que na campanha eleitoral, há horas tardias da noite, afixou boletins anônimos pela cidade caluniando, em palavras grosseiras um candidato à Presidência da República; foi o homem que rasgou ostensivamente chapas do PCB e do PSD na 9ª seção eleitoral; foi o homem que desafiou ferroviários para brigar, em frente à dita seção; foi o homem que se esforçou, usando, para anular a mesma seção eleitoral, o que afinal conseguiu, sendo de notar que aquela foi à única votação anulada em Aracaju”.

Fragmon tinha outros irmãos também militantes comunistas, José Carlos Borges que recebera Menção honrosa por participar do concurso de contos, entre escritores da nova geração do jornal cultural Símbolo, com o conto Neblina. Outro irmão, Carloman Carlos Borges (Frei Paulo-SE, 11 de março, 1931 – Feira de Santana – BA, 3 de fevereiro, 2010) foi preso em 28 de agosto de 1951, aos 20 anos, pelo investigador de Polícia Sebastião Dantas Barreto, por ser o mesmo de alta periculosidade e perigoso agente comunista. O histórico da ficha policial diz o seguinte: “Carloman Carlos Borges, é irmão do comunista e agitador Fragmon Carlos Borges, também fichado nos órgãos de Segurança, por subversão, agitação e outros, constando ainda, que o mesmo fez viagem para Moscou em datas passadas, onde tirou curso”.

Carloman estudou o Ensino Fundamental em 1945 na Escola Técnica Comércio de Uberlândia (MG) em 1946 retorna a Aracaju e se matricula na Escola Técnica de Comércio de Sergipe, nos aos de 1959/1960 estuda na Escola Técnica Comércio de Botafogo (RJ) e conclui o curso em 1963 na Escola Técnica de Eletrônica Francisco Moreira da Costa (MG). Em 1968 obteve sua Licenciatura Plena em Matemática pela Universidade de Itajubá (MG), fez Mestrado e Doutorado em Matemática na Universite de Montpellier II, França. 

Fragmon Carlos Borges estudou também em Uberlândia, onde liderou expressivo movimento estudantil. Retornando à Aracaju nos anos 40 trabalhando na condição de representante de uma Companhia de aviação, Linhas Aéreas Brasileiras – LAB, símbolo de segurança, conforto e pontualidade, através da firma Carlos Borges & Cia, situada à Rua Laranjeiras, 87, tendo como sócio Tenison Freire. (76)  Homem de atitudes firmes, logo ao retornar ingressa no Partido Comunista, empenhando-se em convicta militância que não demorou surgisse incompatibilidade entre ele e seu sócio na agência. Não sabemos se Fragmon concluíra o curso na Escola de Comércio Conselheiro Orlando, que mudara de nome para Escola Técnica de Comércio que sempre funcionou na Rua Pacatuba, em virtude da existência de alguma pendência, certamente política. O Jornal do Povo, edição de 7 de maio de 1947 publicou a seguinte nota:

Convite à classe estudantil e ao Povo

Ficam convidados todos os estudantes de Sergipe e o povo em geral para assistirem a sessão da Congregação da Escola de Comércio Conselheiro Orlando, quarta-feira próxima, dia 7 as 7 horas da noite, onde será resolvido o “caso” do colega Fragmon Borges.
  A Comissão”.

    Em outubro de 1948 o jornalista Fragmon Carlos Borges encontra-se no Rio de Janeiro, enviado como Delegado para participar da 1ª Convenção Nacional de Defesa do Petróleo, e desse encontro publica na revista Época dois artigos: O Petróleo e a União Nacional (nº2, outubro/novembro, 1948) e Solução Dutra (nº3, janeiro, 1949). Meses depois, seria preso às dez horas da manhã de 29 de abril, em plena Rua Sã Cristovão, Centro de Aracaju quando foi abordado por três indivíduos e colocado em um carro de Praça, em seguida conduzido até o Mosqueiro. Após sofrer tentativa de morte na Praia do Mosqueiro, um povoado afastado do perímetro urbano da capital aracajuana pela Polícia de Sergipe, sobre a agressão ao jornalista Fragmon Carlos Borges, comandada pelo professor e chefe de Polícia, João Monteiro de Araújo, o senador Augusto Maynard Gomes (PSP) assim manifestou ao jornal A Manhã (Rio), republicado pelo Correio de Aracaju de 10 de maio:

“Ao que sei, trata-se de um elemento comunista que já vinha às voltas com a polícia, desde que esta teve de intervir no caso de um circo que devia realizar um espetáculo em favor do Congresso da Paz. O proprietário do circo, advertido pela Polícia de que se tratava de um movimento comunista, voltou atrás. Mas os agentes comunistas, inclusive o pseudo-jornalista, que quiseram restituir os bilhetas vendidos, o que deu motivo a uma queixa do gerente do circo contra os mesmos. É o que sei, por enquanto, sobre o assunto”.

Devido a repercussão das atrocidades em vários estados do país, o senador sergipano Walter Prado Franco (UDN), fez leitura em 3 de maio de uma publicação do jornal Correio da Manhã, denunciando o espancamento do jornalista Fragmon Carlos Borges, pela Polícia de Sergipe. Depois do incidente ocorrido, Carvalho Neto envia carta ao Governador do Estado de Sergipe, Moacir Sobral Barreto, relatando a arbitrariedade cometida por Monteirinho, vejamos um trecho da carta, publicada na edição do Correio de Aracaju de 6  e 10 de maio de 1949:

“Chegou à minha residência, barbaramente espancado pela Polícia o Sr. Fragmon Carlos Borges, jovem de minhas relações e descendente de uma das famílias de melhor conceito em nosso Estado. Surrado, humilhado, ocorrido, veio pedir o amparo do velho advogado, seu amigo, nesse angustioso transe de sua vida. Disse-me que o pretexto da surra que apanhara, numa cena horrenda de lampionagem, fora o de se lhe atribuir à ideologia comunista, circunstância que o Diário de Sergipe num preparo prévio, por mais de uma vez, tem assinalada”.

Segundo depoimento do compositor, produtor e cantor João Melo (1921-2010) no livro João Ventura Cidadão de Aracaju (2005), Fragmon Carlos Borges foi conduzido pelo jornalista e deputado Estadual Orlando Dantas às dependências da Assembleia Legislativa de Sergipe, nas seguintes condições:

“O líder popular estava sem camisa, com as costas sangrando; os pés descalços e cheio de hematomas pelo rosto. Orlando Dantas fez a denúncia da atrocidade mostrando que a vítima fora levada num caminhão da polícia até um terreno baldio na praia do Mosqueiro. Ali, depois de seviciado, foi largado. O jornalista Orlando Dantas saiu, junto a Fragmon para buscar assistência médica, sem esquecer-se de deixar o seu protesto naquela casa e o Jornal Gazeta de Sergipe, do dia seguinte, tornou o caso público”.

Perseguido pela força policial do governador José Rollemberg Leite, o jornalista do jornal A Verdade, Fragmon Borges foi mais uma vez surrado, na noite do dia 9 de janeiro de 1951. A agressão ocorreu na cidade de Itabaiana, onde existia um dos maiores núcleos do Partido Comunista no estado depois de Aracaju. Cercado por seis soldados do destacamento local que agiram sob o comendo do integralista Major Temístocles Cavalcante, mesmo em desvantagem Fragmon entrou em luta corporal para se defender, até ser acudido pela população local, que aos ouvir os gritos de socorro se dirigiram até à rua, pondo em fuga seus agressores. Conforme reportagem d’A Verdade, em sua edição de 19 de janeiro, esteve:

“Acompanhados de vários companheiros de trabalho, o jornalista Fragmon Carlos Borges visitou os jornais da cidade e alguns deputados na Câmara Estadual, onde foi levantado enérgico protesto pelo Deputado Orlando Dantas contra esta nova violência à sua pessoa. Ninguém mais, porém, ousou dizer uma palavra, nem o trabalhista Macedo. Sem dúvida está demonstrando ser um bom aliado do Sr. José Leite e Monteirinho”.

Membro do Partido Comunista Brasileiro de Pernambuco na década de 50, quatro anos depois do atentado sofrido, passou a residir no aparelho de Marcos Antônio Coelho e Teresa Coelho, período em que casa-se com uma jovem companheira, sendo em seguida preso, torturado e severamente espancado na cabeça.  No final dos anos 50 Fragmon Borges passa a residir no Rio de Janeiro e rompe com o Partido Comunista para viver na clandestinidade, morrendo nos anos 70, vítima de enfarto. Segundo depoimento do jornalista Aluysio Sampaio “deixara vários filhos, que nasceram de seu casamento com uma companheira de cor”. (77)

Em 26 de agosto de 1961, Fragmon é preso na redação do jornal pela polícia carioca. Motivo: ser editor executivo e repórter de esquerda do semanário Novos Rumos, localizado a Avenida Rio Branco, 207 – 17ª andar, Rio de Janeiro. Em 13 de março de 1961 seu amigo e jornalista Rui Facó, escreve a punho sua última mensagem em vida para Fragmon em Buenos Aires, Argentina. Preso por várias vezes foi condenado há três anos juntamente com outros companheiros: Hércules Correia dos Reis, Walter Valadares de Castro, Amado Valentim do Nascimento, Antonio Guedes da Silva, Walter de Sousa Ribeiro, David Capistrano da Costa, Ronaldo Frate, Armando Zilar e Antonio Martini, todos inclusos nos arts. 7 e 9 da LSN. Fragmon teve suspenso os direitos políticos, publicados no Diário Oficial de 27 de fevereiro de 1967, p. 2359.

Por ocasião da prisão do tipógrafo Raimundo Alves de Souza (Batista, Petrônio ou Tanaka), conforme informação nº220 de 31 de janeiro de 1975, ficha individual, DOI/CODI/São Paulo, consta no item nº5 o seguinte depoimento:

“Fragmon Carlos Borges, que era jornalista lhe propusera trabalhos extra remunerados, o que foi aceito, sendo a primeira tiragem “Manifesto Político” panfletos em 4 vias acerca de reunião realizada pelo CC do PCB. Para tanto, o declarante foi conduzido de olhos vendados pelo citado jornalista, até a gráfica clandestina, sita na Estrada do Morro do Cavado, Caminho Anésia, Campo Grande – GB. Novos trabalhos sucederam-se até o fechamento do Diário Carioca em Dez/65. Fragmon “abriu” para Raimundo que era encarregado da feitura do jornal Voz Operária, em seguida convidou-o para tomar conta da referida gráfica e como aceitou a tarefa desta vez foi levado ao local já sem  as vendas nos lhos. Ali chegando conheceu Benedito de Tal (Bené) caseiro da indústria e Antônio de Tal, cunhado desse último.
O epigrafado, Antônio e Benedito de Tal montaram-na num subterrâneo para dar maior cobertura no trabalho. Com a morte do jornalista em pauta foi substituído nas funções de coordenador da Voz Operária, por Gutenberg Cavalcanti, que com o seu bom desempenho foi mantido pelo PC até a presente data”.

Através da Portaria nº 1.359, de 23 de agosto de 2006, publicada no Diário Oficial da União, nº163, p.64, edição de 24 de agosto de 2006, o Ministro de Estado da Justiça, no  uso de suas atribuições legais, com fulcro no artigo 10 da Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002, publicada no Diário Oficial de 14 de novembro de 2002 e considerando o resultado do julgamento proferido pela Comissão de Anistia, na 3ª Sessão realizada no dia 16 de janeiro de 2006, no Requerimento de Anistia nº 2001.02.00942, resolve:

“Declarar Fragmon Carlos Borges anistiado “post mortem”, sendo que a reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação mensal, permanente e continuada correspondente ao cargo de Redator 8, em Jornal de médio porte no Estado do Rio de Janeiro, caberá à requerente Doralice Maria de Santana Borges e demais dependentes, se houver, no valor de R$ 6.136,88 (seis mil, cento e trinta e seis reais, oitenta e oito centavos), com efeitos retroativos a partir de 12.09.1992 até a data do julgamento em 16.01.2006, perfazendo um total retroativo de R$1.064.543,85 (hum milhão, sessenta e quatro mil, quinhentos e quarenta e três reais e oitenta e cinco centavos), nos termos do artigo 1º. Incisos I e II da Lei nº 10.559, de 2002”. (Márcio Thomaz Bastos)

Fragmon Carlos Borges publicou o ensaio Origens Histórica da Propriedade da Terra – 1958, na revista Estudos Sociais, maio-junho, 1958, republicado em A Questão Agrária – textos dos anos sessenta, Carlos Marighella, Orlando Valverde, Paulo Schilling, Mário Alves, Rui Facó, Fragmon Carlos Borges. São Paulo, Edit. Brasil Debates, Coleção Brasil Estudos, 1980.  Neste ensaio, primeiro da coletânea, Fragmon Carlos Borges, em polêmica com Roberto Simonsen (1889-1948), industrial, historiador e político brasileiro, analisa o estatuto das capitanias hereditárias e das concessões das sesmarias, apontando seu caráter feudal no fato de que, por meio das “cartas forais, os donatários eram investidos de poderes quase absolutos”.

Alguns artigos publicados

O Petróleo e a União Nacional. Aracaju, Época nº2, outubro/novembro, 1948; A solução Dutra. Aracaju, Época nº3, janeiro, 1949; A Mensagem do Sr. José Rollemberg Leite. A Verdade. Aracaju, Ano II, nº33, 3 de Maio, 1950; Conquistar a Liberdade de Imprensa. A Verdade. Aracaju, Ano II, nº34, 10 de junho, 1950; Anísio Dário. Bandeira de luta do povo Sergipano. A Verdade. Aracaju. Ano II, nº55, 15 de dezembro, 1950; Como Comemorar o 53º aniversário do Cavaleiro da Esperança. A Verdade. Aracaju, Ano II, nº66, 23 de dezembro, 1950; O Povo defenderá o seu jornal. A Verdade. Aracaju. Ano III, nº71, 9 de junho, 1951; Comerciar com todos os países socialistas imperativo do momento que vivemos. Rio, Voz Operário nº448, 4 de janeiro, 1958; O problema da terra em Pernambuco. Novos Rumos, 1º de maio/junho, 1958; A grande propriedade territorial latifundiária. Novos Rumos, 2, julho/agosto, 1958; O problema da terra em Pernambuco – a terra dos índios. Novos Rumos, 3-4, setembro/dezembro, 1958; Um livro sobre a história e a economia de Pernambuco. Novos Rumos, 6, maio/setembro, 1959; Defender as liberdades. Rio, Novos Rumos, 9 a 13 de fevereiro, nº157, 1962; Olga Benário Prestes – Personagem de Romance. Rio, Novos Rumos, 9 a 13 de fevereiro nº157, 1962; O Movimento camponês no Nordeste. Novos Rumos, 15, dezembro, 1962.

(75) GILFRANCISCO: jornalista, pesquisador e professor universitário. Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. http://gilfrancisco.santos@gmail.com
(76) A peça publicitária da representação dos interesses da Companhia na capital sergipana apareceu no Sergipe-Jornal, em 28 de abril, 1947.
(77) Chão Perdido, Aluysio Mendonça Sampaio. São Paulo, Edições LB, S/D.

PARA QUEM NÃO LEU AS OUTRAS PARTES DO ENSAIO:

Parte I, publicada em 02 de Maio. Em: https://.infonet.com.br/claudionunes/ler.asp?id=172068

Parte II, publicada em 04 de Maio. Centro Operário Sergipano. Em: https://.infonet.com.br/claudionunes/ler.asp?id=172098

Parte III, publicada em 05 de Maio. O  Centro Socialista Sergipano. Em: https://.infonet.com.br/claudionunes/ler.asp?id=172156

Parte IV, publicada em 06 de Maio: Conferência Estadual do Comitê do PCB. Em: https://.infonet.com.br/claudionunes/ler.asp?id=172207

Parte V, publicada em 07 de Maio. As Ideias Socialistas. Em: https://.infonet.com.br/claudionunes/ler.asp?id=172260

Parte VI, publicada em 08 de Maio. O Partido Socialista Brasileiro. Em: https://.infonet.com.br/claudionunes/ler.asp?id=172320

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Frase do Dia
“Por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres.” Rosa Luxemburgo.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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