Maria Luiza Pérola Dantas Barros
Doutoranda em História Comparada (PPGHC/UFRJ)
Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)
E-mail: perola@getempo.org

Uma cidade pacata, com pessoas honestas e solidárias: era assim que autoridades, como o chefe de Polícia Enoch Santiago, descreviam Aracaju no início dos anos 1940. Talvez essa descrição não dê conta de apresentar uma cidade que passava por um crescimento populacional considerável, com uma vida social pulsante e um comércio de proporções significativas, com destaque para as ruas João Pessoa e Laranjeiras.
Casas de comércio diversas, cinemas, cafés, bares, restaurantes ou mesmo pontos de encontro, como a Ponte do Imperador, eram locais de sociabilidade que existiam na cidade nesse período e reuniam desde homens de negócio a senhoras que consumiam os filmes hollywoodianos. Um outro comércio também se destacava: a prostituição. Combatida pelas medidas higienistas do Estado Novo (1937-1945), essa era uma prática conhecida em locais de Aracaju como o Vaticano, o Beco dos Cocos ou mesmo a Zona do Bomfim.
Nacionalmente, a cidade era ainda apresentada como uma “festa para os olhos” , devido à modernização pela qual passava. Podemos ter uma ideia de tal processo modernizador por meio de periódicos ilustrados, como a Revista da Semana que, na edição de 30 de setembro de 1939, fazia circular, entre seu numeroso público leitor, as feições de uma Aracaju em que os “cornoros arenosos, de conformação caprichosa, cederam o passo ás ruas e avenidas ideadas com rigorismo mathematico, numa opulencia de perpendiculares e paralelas”. Um processo que, afirmava-se, ocorria a passos largos, fazendo com que as casas rudimentares e modestas cedessem lugar ao modernismo arquitetônico, dando feições à cidade de algo que saía de “uma pagina de conto de fadas”, e que se transformava “como se tivesse uma vara de condão a modificar-lhe o aspecto”.
Porém não tem como falarmos da cidade nesse período sem remeter ao episódio dos torpedeamentos das embarcações brasileiras, pelo submarino alemão U-507, entre 15 e 17 de agosto de 1942, no litoral sergipano e baiano, no contexto da Segunda Guerra Mundial (1939-945). Em poucos dias, mais de 600 pessoas perderiam suas vidas, seus parentes buscariam respostas, e muitos corpos e pertences passariam a chegar às praias sergipanas, como a Praia de Atalaia.
Em pouquíssimo tempo, a cidade precisaria se adaptar àquela nova conjuntura, o que sucedeu àquele evento certamente fez que de conto de fadas, Aracaju parecesse saída de um conto policial: Nelson de Rubina, um conhecido comerciante de artigos diversos, se destinou, na manhã de 18 de agosto, à Praia de Atalaia e furtou três anéis de uma daquelas vítimas.
Há mais de 80 anos, esse fato resultou em investigações envolvendo pessoas conhecidas da época, e na prisão de Rubina. Hoje, tal fato é o cerne do livro que vem a público, intitulado: O senhor dos anéis na Aracaju que viu a guerra: o caso Nelson de Rubina (1942-1943), objetivando pensar o cotidiano de Aracaju no contexto que antecedeu os torpedeamentos em 1942 em nosso litoral, como essas notícias foram divulgadas na imprensa local, nacional e internacional, e o desenrolar propriamente dito do feito de Nelson de Rubina.
Assim como eu me impactei outrora com a descoberta de toda essa trama em nossa cidade, espero que muitas outras pessoas possam conhecer esse fato que também faz parte da nossa história, enquanto aracajuanos, sergipanos, brasileiros. Uma boa leitura!
A versão e-book dessa obra, que atende aos parâmetros de acessibilidade para pessoas com baixa visão, já está disponível para download gratuito e pode ser acessada clicando aqui.
Texto produzido no âmbito do Projeto “O senhor dos anéis na Aracaju que viu a guerra: o caso Nelson de Rubina (1942-1943)”, coordenado pela Profa. Ma. Maria Luiza Pérola Dantas Barros, apoiado pela Fundação Cultural Cidade de Aracaju (FUNCAJU), a partir do edital nº 009/2023 Paulo Gustavo em Aracaju.