Brasil progride com a comunidade LGBT, diz pesquisadora venezuelana

Tamara Adriane, professora da Universidade Central da Venezuela (Fotos: Portal Infonet)

A advogada e professora venezuelana Tâmara Adriane foi uma das convidadas para participar do 1º Seminário Internacional em Direitos Humanos, Jurisprudência e Cidadania LGBT, que começou na quarta-feira, 20, e vai até esta sexta-feira, 22.

Ela veio à capital sergipana para falar sobre os temas ‘Transexualidade, Travestilidade e Saúde’ e ‘Linhas Gerais da Jurisprudência LGBT nos Tibunais de Proteção dos Direitos Humanos’, fazendo uma abordagem das questões na América Latina. Para o Portal Infonet, Adriane traçou um panorama do Brasil, em comparação com os países da América Latina, sobre os avanços que a comunidade LGBT conquistou nos últimos anos.

Portal Infonet – Qual é a situação atual dos direitos que a comunidade LGBT tem no Brasil em comparação com os demais países da América Latina?
Tamara Adriane – A situação do Brasil, não é a melhor neste momento, mas é uma situação de progresso. É um dos Estados que mais fez para a proteção internacional dos direitos LGBT em nível da OEA e da ONU. Neste momento, na América Latina, entretanto, os casais do mesmo sexo têm proteção completa e, quando eu falo completa, falo de matrimônio, com adoção, co-maternidade e co-paternidade. Isso é possível na Argentina e no Distrito Federal do México. No Uruguai há leis que preveem a adoção com co-partenidade. Uma situação parecida com a decisão do STF no Brasil ocorre na Colômbia, no Equador, onde há o direito do reconhecimento dos aspectos civis das uniões homoafetivas nas mesmas condições das heteroafetivas.

Tamara profere nova palestra sobre Direitos Humanos

Infonet – E com relação aos transexuais, a situação do Brasil também segue neste mesmo rumo?
TA –
Quanto ao reconhecimento dos direitos das pessoas transexuais, a situação do Brasil é intermediária. Neste momento, os países que têm mais avanços são México, também no Distrito Federal, e no Uruguai. Há, nesses lugares, leis onde uma pessoa transexual pode mudar de sexo na documentação sem a cirurgia genital. O reconhecimento é da identidade e não da genitalidade. O que acontece no Brasil é parecido com outros países da região, como Colômbia e Equador, onde uma pessoa transexual pode mudar o nome apenas depois da cirurgia. Praticamente 70% da população LGBT da América Latina é coberta neste momento por leis de verdade.

Infonet – E onde está, digamos, o atraso nessa questão?
TA –
Os países mais atrasados são os da America Central, Venezuela, Chile, Bolívia, Peru e Paraguai. No entanto, a Bolívia tem uma constituição que reconhece como a não discriminação contra as pessoas, especialmente por orientação sexual e questões de gênero.

Seminário começou na quarta-feira, 20, e vai até a sexta-feira, 22

Infonet – Apesar de o Brasil estar em uma situação intermediária, a comunidade LGBT não teve aprovada a lei que criminaliza a homofobia. Isso não é contraditório, posto que o país é visto como um dos que mais mata homossexuais?
TA –
A homofobia, a discórdia, é produto do ódio. As mulheres sabem muito bem o que é discriminação e ódio, que faz com que na América Latina todos os dias pelo menos uma mulher seja morta nas mãos de uma pessoa que diz amá-la. Eu te amo, então eu te mato. Essa situação não é diferente com os transexuais, as lésbicas e os homossexuais. A violência constante e agravada pela situação da orientação sexual tem as mesmas conseqüências das violências contra a mulher.

Temos 70, 80 anos lutando pela igualdade da mulher e contra a violência de gênero, mas ainda não foi possível evitar a violência, mas a mesma coisa acontece com o racismo. A diferença racial acabou na maioria dos países da América latina no século 19, e ainda hoje o racismo existe; a violência racista também existe. Os crimes de ódio contra as pessoas existem nos dois casos, a diferença é que neste momento, neste país, e na maior parte dos países do mundo, é muito mal visto dizer coisas contra as pessoas por causa da cor. Difundir a violência e o ódio por pessoas por causa da cor racial existe há muito tempo.

Isso, agora, neste século, é mal visto, é considerado um crime, um genocídio. Mas a violência contra a comunidade LGBT não é considerada por muitas pessoas no mesmo nível de ódio; não é considerada um mal. Não é ainda um crime verdadeiro para muita gente matar alguém por ser gay.

Infonet – E qual seria a saída para que esse quadro seja virado?
TA –
Temos que convencer as pessoas pela educação, de que nos podemos educar as pessoas para lidar com ódio. Durante toda a história se educou para o ódio contra os gays, as lésbicas, os negros. Nesse momento é necessário educar para a tolerância, para o respeito, do mesmo jeito que se educa para a tolerância pela cor. Somos mais de 10% da população de todos os países. Alguns falam de 15% a 25%, mas é uma minoria muito importante. Uma minoria maior que a maior parte das minorias sociais. Então, é necessário educar para a tolerância, para o respeito. É necessário aos educadores transmitirem que ninguém é igual, que todos são diferentes. É necessário e produtivo entender a diferença entre as pessoas.

Infonet – No Brasil, a visão é de que é necessário tornar o preconceito crime para que haja o respeito à diferença, assim como funciona hoje com a questão racial. Mesmo que haja um trabalho de educação, é necessária a criminalização?
TA –
Eu acredito que o agravante específico dos crimes de ódio, para todos os crimes de ódio, tem que existir. Se alguém agride, mata uma pessoa por origem racial, porque é mulher, porque é gay – ou porque percebe que é gay, porque pode ser real ou percebida; o que ocorreu em São Paulo é uma situação percebida, porque pensaram que pai e filho eram um casal gay -, esse crime de ódio tem que ter uma consequência especial, uma punição agravada, uma pena adicional ou particular por causa do ódio. Não é possível que possa existir uma sociedade em que se possa matar uma pessoa porque não gosta dela. Se eu n gosto de você, eu lhe mato. Eu não gosto porque você é gay, lésbica, então eu mato. Isso não é motivo. Mas se isso acontece, tem que haver uma resposta criminal particular. Mas o mais importante é a educação.

Entendo que um esquema de educação pode promover uma mudança social muito importante, tão importante como quando a mulher saiu das casas, da cozinha, para trabalhar, para entrar nas universidades, entrar no mundo político. Para que essa igualdade seja uma devida igualdade, nos precisaremos de muito tempo, porque o racismo ainda existe. Não é uma coisa que vai mudar de um dia para o outro.

Infonet – Mas há algum país latino com leis específicas para a discriminação à comunidade LGBT?
TA –
Sim, existem leis contra a homofobia nos países vizinhos como Bolívia, Uruguai. Há disposições mais restritivas na Argentina, e também no Equador. O México também tem leis que são contra a homofobia, expressamente.

Infonet – Então ao passo que o Brasil está em uma situação intermediária, também há atrasos?
TA –
Sim. Nesse aspecto o Brasil está atrasado. O Brasil reconhece direitos matrimoniais, mas n reconhece a co-maternidade e a adoção. Reconhece a identidade, mas só após a mudança de sexo. Isso não é suficiente de acordo com os tratados internacionais atuais. Não há uma lei que coíba a discriminação pela orientação sexual ou de gênero, como nos outros países da região. A lei colombiana, por exemplo, tem tribunais especiais para julgar discriminações sexuais.

Por Diógenes de Souza

Portal Infonet no WhatsApp
Receba no celular notícias de Sergipe
Acesse o link abaixo, ou escanei o QRCODE, para ter acesso a variados conteúdos.
https://whatsapp.com/channel/
0029Va6S7EtDJ6H43
FcFzQ0B

Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais