90 Anos de um Grande Gesto

CULTURA                                                                                         Luis Antônio Barreto

 

O tempo esconde, com freqüência, gestos, atos, fatos que marcaram a história e deram a Sergipe momentos grandiosos de consciência cívica e social. A pesquisa, que investiga o cotidiano do passado, tem revelado faces positivas e marcantes, que precisam aflorar no conhecimento da sociedade atual. Neste ano de 2009, quando o Clube Esportivo Sergipe completa 100 anos de “lutas e glórias” afundado na responsabilidade de deixar a série D e voltar a destacar a representação desportiva do Estado, um grande gesto faz 90 anos: a doação, feita por Adolfo Rollemberg, da Fazenda e Usina Escurial, do terreno de sua propriedade, na zona sul de Aracaju, para construir o Campo de Futebol.

Uma reunião da Liga Desportiva Sergipana, na Capitania dos Portos, com a presença dos presidentes do Sergipe e do Cotinguiba, visando a construção imediata de um Campo que desse ao futebol as condições de disputa, como esporte popular. Adolfo Rollemberg estava presente à reunião, cedeu um terreno que tinha limites nas ruas Campos, Vila Cristina,  Monsenhor Silveira e Duque de Caxias, na metragem necessária para servir de praça de esportes. A reunião ocorreu no dia 27 de julho, e foi destacada no jornal Diário da Manhã, edição de 3 de agosto de 1919, tornando-se, a partir daí, de amplo domínio público o gesto de benemerência do empresário..

Homem rico, filho do grande José de Faro Rollemberg, neto dos barões de Japaratuba e de Estância, Adolfo Rollemberg estava há pouco tempo morando, solteiro, em Aracaju. Seu círculo de amizade, suas iniciativas, como a construção do Palacete da avenida Ivo do Prado, recentemente adquirido pela Ordem dos Advogados do Brasil – Secção de Sergipe, que está em restauração, como um dos mais belos casarões de Aracaju. Adolfo Rollemberg pensava em construir um Teatro e um Hotel que pudessem elevar os serviços da cidade. Os gestos magnânimos deram a Adolfo Rollemberg uma auréola de benfeitor. Por pura ironia, o benemérito do esporte sergipano, mais especificamente do futebol sergipano, morreu poucos dias depois da reunião que definiu a cessão do terreno para a construção do Campo de Futebol, no dia 3 de agosto, sem concluir sua casa, nem ver qualquer iniciativa prática para a construção do campo, e sem materializar suas idéias de investimentos. Um “insulto apoplético”, como registra a crônica da época, barrou-lhe a caminhada. Assistido pelas irmãs e outros familiares na casa do cunhado e médico Francisco Fonseca, não resistiu e morreu na tarde de 3 de agosto de 1919, comovendo a família e o círculo grande de amigos.

Durante décadas, o Campo Adolfo Rollemberg, este foi o nome que tomou e fez conhecida a praça de esportes, murada e com bancadas de madeira, foi o único “estádio” dos jogos das equipes sergipanas. Havia um outro pequeno campo, o Vitória, onde alguns jogos eram realizados, mas foi no Campo do Adolfo que além do Sergipe e do Cotinguiba, surgiram outras equipes de futebol – Vasco, Paulistano, Olímpico, Etéa, Confiança, dentre outros – que alimentaram os campeonatos, iniciados precariamente no ano anterior.

 Adolfo Rollemberg não viveu para ver seu gesto ser transformado na principal alavanca do futebol sergipano. Não viveu para testemunhar que a área de terrenos cedida foi ocupada, no curso do tempo, por construções de casas modernas, dinamizando a moradia na zona sul aracajuana. Seu nome é guardado num campo estadual, construído no bairro Matadouro.

A doação do terreno, condicionada pelo doador a um pagamento mensal, simbólico, de quinze cruzeiros, às Damas de Caridade da Igreja do São Salvador, foi pública, divulgada e contou com o testemunho dos participantes da reunião da Capitania dos Portos, em presença do Almirante Amintas José Jorge. Quase quarenta anos depois, no entanto, familiares de Adolfo Rollemberg tentaram, na justiça, barrar uma ação de Usucapião, de autoria dos dois maiores beneficiários, o Clube Esportivo Sergipe e o Cotinguiba Esporte Clube. A demanda judiciária não favoreceu a família de Adolfo Rollemberg, apesar de ser levada a julgamento federal.

O futebol sergipano, e muito especialmente os clubes Sergipe e Cotinguiba, devem muito a Adolfo Rollemberg, que com seu gesto marcou a história do futebol e, por conseqüência, de todos os clubes que foram surgindo, com suas cores, seus atletas, empolgando as torcidas que lotaram, ao longo do tempo, o Campo do Adolfo e outras praças desportivas. O nome de Adolfo Rollemberg deveria receber homenagens, de inteira justiça, e ser sempre lembrado, pelo despreendimento, pela benevolência, pelo despojamento, incomuns em Sergipe.

O Clube Esportivo Sergipe contou, ao longo de sua bela história, com outros beneméritos, como João Hora de Oliveira, que viabilizou o atual estádio do clube, localizado na avenida Augusto Franco (antiga avenida Rio de Janeiro) que leva, muito justamente, o seu nome, como um grande patrono, apaixonado pelo “mais querido” do futebol sergipano.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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