A Bossa de Paulo Lobo

Paulo Lobo tem grandes dotes artísticos: escreve bem e dá graça a um personagem lusitano – Apolônio – com suas cartas feitas com o material do cotidiano de Sergipe e de Aracaju, é, por excelência, o cantor de Aracaju e tem intimidade com a cidade de Inácio Barbosa, como se pode observar em Ruas de Ará, hino informal que simboliza a capital sergipana. Não bastasse o jornalismo, a literatura, a música, a interpretação, Paulo Lobo é um publicitário e teria, por isto mesmo, um adjetivo a mais, qualificador do conjunto do seu trabalho.

Tendo que dividir o tempo entre várias tarefas, para garantir a sobrevivência, Paulo Lobo colocou, algumas vezes, sua carreira em xeque, duplicando-se em casos públicos, agências de propaganda, e outras aventuras, incluindo as de organização e as editoriais. O mesmo ocorre com Neu Fontes, que trocou a carreira de compositor e de cantor, para dirigir um estúdio e trabalhar sob encomenda. Em parte, ocorre isso também com Nino Karva, que de microfone em punho faz reportagens para a TV Aperipê, para dar prática ao novo curso acadêmico que faz.

Paulo Lobo tem uma discografia consagrada e por ela é reconhecido de Aracaju para o Estado e além das fronteiras sergipanas. O lançamento, durante a Feira do Livro, de 2007, do seu novo CD – Loboratório – arredonda a obra, e contribui para confirmar uma versatilidade, que sinonimiza o talento, a técnica, a consciência da criação musical. No novo CD o autor, compositor e cantor mostra-se cheio de bossa, à vontade nos sambas que tomam as faixas, duas delas em parceria, uma com Ilma Fontes – Quer saber?, outra com Ronaldson – Musa querubim -, que são dois dos melhores escritores da terra. Há, por conta dos 200 anos da chegada da Família Real portuguesa ao Brasil, compôs com o próprio Dom João VI, o Funk da Independência. Nas demais, ela responde, integralmente, pela qualidade do repertório que canta.

A bossa de Paulo Lobo mescla sambas de raiz, batidas de bossa nova, citação de samba-canção, aquele ritmo dos enamorados de outras décadas, que deu ao Brasil páginas antológicas de Adelino Moreira, nas vozes de Nelson Gonçalves e de Carlos Nobre, de Evaldo Gouveia e Jair Amorim, por vários cantores, Waldick Soriano, por ele mesmo, como outros que apareceram mais como intérpretes, como foi o caso de Altemar Dutra. Navegando em águas exigentes, Paulo Lobo dá braçadas tranqüilas, próprias de que sabe o que faz e tem confiança no bom gosto do que é feito. O CD não é bom, é ótimo e em seu conjunto, que envolve arranjo e participação instrumental, está a prova da qualidade, e ainda sobra para o trombone de Caúca e a percussão de Pequeno.

Loboratório, de Paulo Lobo, é um belo momento da arte musical sergipana, que precisa ser tocado, muito tocado, divulgado, presenteado, para que cumpra com uma função pedagógica, afirmativa de um trabalho seio, maduro, bonito, a altura do que o Brasil produz de melhor, na atualidade. Esta contribuição sergipana não é única, pois Santo Souza, um dos maiores poetas da língua portuguesa, que trata da condição humana, publicou, também no ano passado, aos 88 anos, Ésquilo na tormenta, um dos seus melhores livros. E não parou aí, escreveu, aos 89 anos, Deus ensangüentado, no mesmo nível estético do anterior, o que equivale a uma promessa de nunca parar de escrever. João Melo, perto de completar 87 anos, o grande produtor, o Cantor Máximo de Sergipe, como diziam os fãs, nas décadas de 1940, no rádio, e de 1950, na discografia, continua de violão em punho, rebuscando cantigas da terra e do coração, ao lado de uma família afinada com os seus acordes. São expressões que atestam a identidade de Sergipe com a inteligência, as artes e a cultura.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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