As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal promulgaram, na última quinta-feira (26/02/2015), a emenda à constituição n° 85, que altera diversos dispositivos da Constituição da República para “atualizar o tratamento das atividades de ciência, tecnologia e inovação”.
Com efeito, a emenda à constituição n° 85:
a) incluiu a competência comum da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal para proporcionar os meios de acesso à tecnologia, à pesquisa e à inovação (Art. 23, V) e a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação (Art. 24, IX);
b) autorizou que a transposição, o remanejamento ou a transferência de recursos de uma categoria de programação para outra, no âmbito das atividades de ciência, tecnologia e inovação, com o objetivo de viabilizar os resultados de projetos restritos a essas funções, poderão ser admitidos, mediante ato do Poder Executivo, sem necessidade da prévia autorização legislativa (Art. 167, § 5°);
c) incluiu nas competências do Sistema Único de Saúde (SUS) incrementar, em sua área de atuação, a inovação (Art. 200, V);
d) incluiu as atividades de estímulo e fomento à inovação como podendo receber apoio financeiro do Poder Público, além de permitir que as atividades de pesquisa, de extensão e também as de estímulo e fomento à inovação realizadas por universidades e/ou por instituições de educação profissional e tecnológica possam receber apoio financeiro do Poder Público (Art. 213, § 2°);
e) incluiu o dever de o Estado promover e incentivar a capacitação científica e a inovação (Art. 218, caput);
f) incluiu o dever de o Estado apoiar a formação de recursos humanos na área de inovação, inclusive por meio do apoio às atividades de extensão tecnológica, e de conceder aos que dela se ocupem meios e condições especiais de trabalho (Art. 218, § 3°);
g) incluiu o dever de o Estado estimular a articulação entre entes públicos e privados, nas diversas esferas de governo, na execução das atividades de desenvolvimento científico, pesquisa, capacitação científica e tecnológica e inovação (Art. 218, § 6°);
h) incluiu o dever de o Estado promover e incentivar a atuação no exterior das instituições públicas com vistas à execução das atividades de desenvolvimento científico, pesquisa, capacitação científica e tecnológica e inovação (Art. 218, § 7°);
i) incluiu o dever de o Estado estimular a formação e o fortalecimento da inovação nas empresas, bem como nos demais entes, públicos ou privados, a constituição e a manutenção de parques e polos tecnológicos e de demais ambientes promotores da inovação, a atuação dos inventores independentes e a criação, absorção, difusão e transferência de tecnologia (Art. 219, parágrafo único);
j) incluiu a possibilidade de União, Estados, Distrito Federal e Municípios firmarem instrumentos de cooperação com órgãos e entidades públicos e com entidades privadas, inclusive para o compartilhamento de recursos humanos especializados e capacidade instalada, para a execução de projetos de pesquisa, de desenvolvimento científico e tecnológico e de inovação, mediante contrapartida financeira ou não financeira assumida pelo ente beneficiário, na forma da lei (Art. 219-A);
k) instituiu o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), que será organizado em regime de colaboração entre entes, tanto públicos quanto privados, com vistas a promover o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação (Art. 219-B), cabendo à lei federal dispor normas gerais sobre o SNCTI (Art. 219-B, § 1°) e cabendo aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios legislar concorrentemente sobre suas peculiaridades (Art. 219-B, § 2°).
O Presidente do Senado Federal, Senador Renan Calheiros, enalteceu a promulgação da emenda constitucional n° 85: “A emenda que nós promulgamos é um marco para o desenvolvimento científico no nosso País. Ao alterar e adicionar dispositivos na Constituição e atualizar o tratamento dado a ciência, tecnologia e a inovação, permite que o Brasil de uma arrancada nos conhecimentos científicos, setor ainda muito carente na nossa cultura”.
Penso que a instituição do “Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação”, como de resto a maiorias das inovações aos temas da tecnologia e inovação, por meio de emenda à constituição, tem efeito muito mais simbólico do que qualquer outra coisa.
Afinal, a Constituição já estabelecia ser de competência comum de todos os entes federativos proporcionar os meios de acesso à ciência (Art. 23, inciso V). A definição do papel de cada ente federativo nessa atribuição constitucional poderia muito bem ter sido efetuada por lei complementar, nos termos do que dispõe o parágrafo único do mesmo Art. 23: “Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional”.
O “Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação”, portanto, poderia ter sido instituído em lei complementar, que, ademais, já poderia detalhar a sua articulação entre as diferentes esferas de governo e instituições públicas e privadas da área da ciência, tecnologia e inovação, tal como a emenda n° 85 determinou que seja feito por lei federal.
A emenda constitucional n° 85, portanto, é mais um capítulo do que Marcelo Neves chama de “constitucionalização simbólica” e reflete o crônico problema brasileiro referente ao excesso de normatização constitucional acompanhado da falta de sua concretização.