Sobre a delicadeza entre as pessoas, na atualidade, contam uma estorinha: “Dizem que, certa vez, uma senhora encontrava-se num coletivo e não havia um só assento desocupado. Inesperadamente, um jovem, que estava confortavelmente instalado à sua esquerda, levantou-se e, dirigindo-se a ela, educadamente, disse: “senhora, por favor, sente-se no meu lugar”. O choque com aquela gentileza foi tão grande que a passageira, incrédula e emocionada desmaiou. Refeita, no entanto, encarou amavelmente aquele rapaz e num tom delicado disse: “muito obrigada moço, você é muito gentil. Aí foi o rapaz quem desmaiou”. Exageros à parte, mas, a cada dia estão mais escassas as gentilezas. Onde andam as saudações tão rotineiras, nos tempos idos, os sorrisos de felicitações, “o bom dia”, o “obrigado”, o “com licença”, o “desculpe”, o ”por favor”, o “posso ajudar”? O “Pode passar” ou, “a senhora primeiro”… Pequenas palavras, frases curtas, gestos simples, atitudes indolores, mas de um efeito incomensurável. Ah, que saudade do tempo em que o filho respeitava o pai, os mais moços respeitavam os mais velhos, os alunos respeitavam os professores, os fiéis respeitavam seus pastores, os bandidos respeitavam a polícia e, sobretudo, todos se respeitavam mutuamente. Que pena esse tempo, infelizmente, passou. É bom esclarecer que não nos é difícil constatar de onde vem esta subversão da ordem e dos bons costumes. Estamos na verdade vivendo um paradoxo lastimável, onde os reais valores estão invertidos: é o filho quem “educa” o pai, a vítima conta menos que o delinqüente, o professor não pode reprovar o aluno para não traumatizar o mau estudante, o bandido está solto armado perigoso e impune, enquanto o cidadão padece desprotegido atrás de grades em seus cubículos, os chamados “direitos humanos” não se prestam aos que sofrem o dano e sim àqueles que o praticam. Acabaram com a nossa educação de excelência, as escolas boas são aquelas que dão os melhores “bizus”, as melhores dicas; no lugar da escola de excelência ficou a do “jeitinho”, a do “remendo”, foram-se as aulas de etiquetas, de boas maneiras, de artes manuais, de filosofia, de sociologia. Em seu lugar, ficaram as “colas”, as “pescas”, as “recuperações”, as “re-recuperações” e as “re-re-recuperações”. Estão fabricando modos de aprovação para o preenchimento de estatísticas, não para preparar cidadãos. É bem visível a distância de um jovem dos anos setenta/oitenta e um atual. Quem não se recorda da disciplina familiar à custa da regra ditada pelo Pai ou pela Mãe. Onde que um aluno daquela época poderia tratar, por exemplo, um professor pela alcunha de “cara” ou “coroa” ou, pior ainda de “velho”, ou “velha”. Havia, sim, o respeito à hierarquia, à obediência e, sobretudo, à disciplina. Lembram-se que sabíamos cantar o hino nacional, o da bandeira, e o da independência? A onda desenvolvimentista dos últimos anos, ainda na ressaca da desenfreada busca pelo tempo perdido das décadas de recessão, a Constituição Cidadã surgida no vácuo da falta de liberdade, a tecnologia que ultrapassa a ela própria em ciclos de tempo cada vez menor, nos jogando de encontro a uma realidade onde não conseguimos entender nem o próprio presente. E o futuro? Bem, o futuro este é absolutamente imprevisível. No campo comportamental, não há como prevermos aonde chegaremos nos próximos cinco ou dez anos. De repente, fomos jogados muito para frente no tempo. As coisas andaram depressa e, como disse aquele índio que pegou carona num possante automóvel: “… Pare, por favor, pare, pois você andou depressa demais e a minha alma não conseguiu acompanhar”. Estou ciente de que esta lengalenga é coisa antiga. Desde os primórdios dos tempos os mais idosos reclamam do procedimento rebelde dos que estão chegando. É natural, eu entendo, mas, não me conformo. Portanto, destilarei a minha insatisfação e a minha intranqüilidade. Assim, preocupa-me, até, o que ocorrerá a esta geração, quando chegar a sua hora de reclamar dos que virão de suas próprias entranhas. O que alegarão em suas defesas? Dirão, por exemplo: “no meu tempo éramos respeitosos com os mais velhos, os professores e as autoridades”? Se esta for a afirmação, todos saberão que não condiz com a verdade. Terão, então, coragem e autoridade para dizê-la, sem remorsos?
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