A FACULDADE DE MEDICINA DE SERGIPE

Segundo Henrique Batista, médico e historiador, em trabalho de sua autoria intitulado “Sociedade Médica de Sergipe – 60 anos”, publicado na Revista Sergipana de Medicina, nº 01, de junho de 1997, a SOMESE passou por três fases distintas na sua evolução: a fase da “Intencionalidade”, a fase de “Concretização” e finalmente a de “Emancipação”. Ao se referir à fundação da Faculdade, diz Henrique: “…durante esta gestão (1960-1962 ), os esforços da classe médica para a criação e funcionamento da Faculdade de Medicina de Sergipe se intensificaram, salientando-se que os pioneiros dessa escola médica eram membros atuantes da SOMESE. A Faculdade de Medicina foi fundada em 1961, depois de uma longa luta, graças ao trabalho de um grupo de abnegados médicos, sendo que o presidente da SOMESE, Dr. Antonio Garcia Filho, pela sua dedicação e extenuado esforço, destacou-se como a mais importante figura na criação da Faculdade de Medicina”.

Prof.Antonio Garcia Filho discursa em solenidade da Faculdade de Medicina
Igual fenômeno, na minha opinião, ocorreu com a fundação da nossa Faculdade de Medicina, que este ano comemora seu 45º aniversário, com suas três fases.

A primeira, a fase do despertar,  de sensibilização, de intencionalidade, surge a partir de 1950 com a idéia visionária de Garcia Moreno, provocando as primeiras discussões sobre o tema, chegando a listar nomes de possíveis professores. Somente 3 anos após, ao lado de Benjamin Carvalho e Augusto Leite, funda a Sociedade Civil Faculdade de Medicina, precisamente em 12 de junho de 1953, como entidade mantenedora da futura escola. Estávamos no Governo de Arnaldo Rollemberg Garcez e o Chefe do Departamento de Saúde, o médico Walter Cardoso,  representou o governador na solenidade festiva de instalação da referida Sociedade, ocorrida no salão nobre do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe em  30 de junho e que contou com a presença de ilustres figuras representativas do mundo sergipano. Na oportunidade, foi empossado o cirurgião Augusto César Leite como presidente da entidade, cuja diretoria era formada ainda pelos médicos Garcia Moreno, como vice-presidente, Benjamin Carvalho, 1º Secretário, Juliano Simões, 2º Secretário, Felte Bezerra, 1º Tesoureiro e Basílio Amaral, 2º Tesoureiro. Comissão de Contas: Carlos Dantas, Gileno Lima e Ávila Nabuco; suplentes: Walter Cardoso, Euler Ribeiro e Elífio Rocha. Nessa solenidade, fizeram uso da palavra o Dr.Walter Cardoso, que presidiu a sessão representando o Governador, o Dr. Augusto Leite que, num discurso primoroso, disse da gênese da idéia de dar a Sergipe a sua Faculdade de Medicina, cabendo ao Dr.Benjamin Carvalho, a oração oficial. Falaram ainda o professor Gonçalo Rollemberg Leite e o Dr.Felte Bezerra, representando respectivamente as Faculdades de Direito e Católica de Filosofia. Representando os médicos do interior, fez uso da palavra o Dr. Jessé Fontes, decano dos médicos sergipanos. Foi uma noite gloriosa, recebendo amplo destaque da sociedade e da imprensa sergipanas. Os trabalhos da Sociedade Civil evoluíram na definição do que poderia ser a primeira lista de professores e conseguiu, com o governo do Estado, a doação do prédio da Escola Normal, atualmente Centro de Turismo, localizado no Parque Teófilo Dantas, para ser a sede da novel faculdade.

Não se sabe ao certo, mas o que seria o início da educação médica em Sergipe naquela oportunidade, de fato não acontece. Possivelmente problemas de natureza política e operacional, de falta de coesão e determinação para enfrentar os problemas, que não devem ter sido pequenos, determinaram o esfriamento da decisão e somente em 1961,  acontece realmente a fundação da Faculdade, com a realização do primeiro Concurso Vestibular, entrando o processo na sua segunda fase, a de Concretização. Para isso, foi fundamental a decisão do governador Luiz Garcia de fundar a faculdade de Medicina, curso que faltava para a viabilidade da nossa Universidade. Nesse contexto,  o nome do médico Antonio Garcia foi, de longe, o mais importante para a realização desse acalentado sonho, pela fibra, determinação em superar obstáculos e pelo apoio político irrestrito recebido do governador.

         Luiz poderia até ter optado pela criação de uma faculdade de engenharia, político empreendedor que era, mas preferiu atender aos apelos da classe médica, que manifestava na ocasião a extrema preocupação com a necessidade social de se abrir uma escola médica. Mesmo sem conseguir lograr êxito no intento maior que era a fundação da Faculdade, os pioneiros dessa tentativa foram de uma importância basilar para a vitória alcançada 8 anos depois. A utilização do Hospital de Cirurgia, com suas dependências e a destacada atuação do seu Centro de Estudos, foi também de fundamental importância  para o desenvolvimento da faculdade, até a sua substituição pelo Hospital Universitário.

Mas voltemos aos primórdios da fundação da nossa faculdade. A fundação da Sociedade Civil Faculdade de Medicina trouxe para a discussão do momento a necessidade social de formar médicos. Na década de 50, somente 4 municípios tinham médicos residentes. Existia um médico para cada 8.000 habitantes. Aracaju contava com aproximadamente 60 médicos. Por outro lado, em todo o Estado começava a se espalhar escolas de ensino primário e cursos de ensino secundário. Abriam-se ginásios e Escolas Normais. Vieram o ITPS e a Escola Superior de Química e em seguida a Faculdade de Ciências Econômicas, a Católica de Filosofia, a Faculdade de Direito. Na área de saúde, havia o Hospital de Cirurgia e o Santa Isabel e alguns no interior do Estado e  a Fundação Manoel Cruz, que  empreendia ações destinadas a deficientes físicos. A fundação da Faculdade de Medicina era, pois, uma decisão inadiável. Entretanto, de 1953  a 1959, as coisas não evoluíram. É de Augusto Leite, em A Faculdade de Medicina de Sergipe, primeiro capítulo de sua história, as seguintes palavras: “…As criações do espírito humano, como as da natureza, dependem do meio. Só vingam e medram no bom terreno e na estação própria”. Finalmente o sonho de Garcia Moreno e Benjamim Carvalho e outros começariam a se materializar, quando numa sessão do Centro de Estudos do Hospital de Cirurgia, Benjamim Carvalho, num inflamado discurso, conclama todos para a luta pela criação da Faculdade e o Governo de Luiz Garcia encampa definitivamente a idéia.

Em 1959, agora com Benjamim Carvalho à frente da Sociedade Civil e com Antonio Garcia no comando de todo o processo, como primeiro diretor da Faculdade, o processo retoma com toda a pujança. Com o auxílio dos estudantes José Moreira Matos e Jairo Fontes, passa a organizar os primeiros currículos e levantar toda a documentação exigida pelo Conselho Federal de Educação. Paralelamente, o governador Luiz Garcia envia à Assembléia Legislativa projeto orçamentário com substanciosa subvenção que garantiria o funcionamento dos primeiros anos da faculdade e oficializa o  Termo de Escritura Pública do antigo prédio da Escola Normal Rui Barbosa, doado anteriormente  pelo governo de Arnaldo Garcez, no valor de 20 milhões de cruzeiros para o patrimônio da Faculdade. A Sociedade Civil, sob a presidência do Dr.Benjamin Carvalho mantém-se solícita a tudo que se fazia mister. O Hospital de Cirurgia, o Santa Isabel e o IPH fornecem documentos, pondo suas dependências e material à disposição da Escola. O governador faz construir um pavilhão com 6 salas, na área do IPH, para o funcionamento provisório da Faculdade, enquanto se tratava da adaptação do edifício doado e que seriam utilizados para as aulas das disciplinas básicas. Traz o professor Silvano Isquerdo Laguna da Universidade de Salamandra, na Espanha, para lecionar Anatomia para as primeiras turmas, às expensas do Governo do Estado. Garcia e Lourival seguem para Recife onde se aperfeiçoam nas disciplinas básicas de Bioquímica e Biofísica. As dificuldades iniciais tinham que ser muito grandes. A morosidade de alguns nos preparos de seus currículos, as exigências burocráticas por parte do Ministério da Educação, a ausência total de instalações adequadas, tudo isso era o desafio do meio. Mas com o apoio irrestrito do Governador, as coisas davam um novo impulso. Ressalta Antonio: “Quando o processo emperrava no Ministério, eu levava o governador comigo para resolver os problemas e isso normalmente funcionava”. “… Sofri algumas injustiças e teria desistido da função não fora o ideal e o apelo que recebia dos vestibulandos, dos operários – através de seus sindicatos de classe e do povo em geral. A própria criação da secretaria de Educação, Cultura e Saúde, previamente oferecida a mim, sofreu adiamentos inexplicáveis na aprovação do Projeto de Lei que a criava, como que forças ocultas se arregimentassem contra a Faculdade, apesar dos entrechoques provincianos que as afastavam.

Estrategicamente, Antonio Garcia estimula a criação do NEPUS – Núcleo Estudantil Pró-Universidade Federal de Sergipe, congregando acadêmicos de todas as escolas superiores, pois um segundo objetivo da fundação da Faculdade de Medicina era propiciar as condições para a instalação da Universidade, uma vez que uma das exigências na época era a existência de um curso de Medicina ou de Engenharia integrado aos já existentes. Sob sua orientação, o NEPUS organiza, em abril de 1960, um curso pré-vestibular de Medicina denominado “Oscar Nascimento”, reunindo cerca de 30 alunos efetivos, sem contar os que desistiram em meio do caminho ou se transportaram para outros centros.

O Decreto Presidencial de criação da Faculdade de Medicina de Sergipe é de janeiro de 1961 e já em fevereiro ocorre o primeiro concurso vestibular, com a aula inaugural acontecendo em março do mesmo ano, oportunidade em que Antonio Garcia emocionado proclama: “ – Sergipanos, eis a vossa Faculdade de Medicina”!

 

 Bibliografia consultada:

1.       Revista Sergipana de Medicina – Nº 1 –  junho de 1997 – páginas 6 a 16.

2.       A Faculdade de Medicina de Sergipe – Primeiro Capítulo de sua história –      Augusto   Leite, Aracaju, 1966 – Editora da Livraria Regina

3.       História da Saúde Pública de Sergipe – Walter Cardoso, 1966 – Publicação nº 3 da Secretaria da Saúde e Assistência Social de Sergipe.

4.       Arquivos do Centro de Estudos da Fundação do Ensino Médico de Sergipe – vol 14 – 1967 – Aracaju-SE

5.      Um pensamento na Praça, de Antonio Garcia Filho – 1991

6.      Jornais da época – Sergipe Jornal, Correio de Aracaju, A Cruzada e o Diário Oficial de Sergipe

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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