O Fórum Econômico Mundial é a feira oficial do lobby das grandes empresas e financeiras globais que ocorre anualmente em Davos, na Suíça. Por vezes longe dos olhares do grande público, esse encontro na pequena cidade dos Alpes é um dos principais palcos para a discussão de políticas econômicas dos países e promoção/promessas de reformas nos regimes de comércio/investimentos. Todo o contexto e palco são criados para a venda por parte dos líderes políticos dos países para que consigam promover seus países como foco de investimentos e capital.
O encontro desse ano era de grande expectativa, em especial pelo primeiro discurso de Donald Trump, como presidente dos Estados Unidos, para os líderes globais e empresários. A já conhecida retórica de Trump sofreu certo arrefecimento na presença de grandes capitalistas. Se no ano anterior, o presidente atacou de maneira enfática o livre-comércio por um viés nacionalista, ele mesmo buscou aportar dentro de seu discurso uma compatibilização de seu tom protecionista com a tradicional promoção do livre-câmbio estadunidense. É previsível essa mudança de tonalidade: de frente com aqueles que podem investir em seu país, o melhor é jogar com os interesses deles. A problemática, para Trump, não é o comércio internacional, mas sim a culpa de alguns “países erráticos” que burlam as regras do comércio via presença do Estado na economia ou descumprindo as normas da governança do comércio global. Para o tipo de encontro que estava sendo realizado, seu discurso realizou o que se esperava: uma aproximação maior com os interesses de mobilidade de capital de grandes stakeholders ao mesmo tempo em que destilou crítica a aqueles que utilizam de mecanismos econômicos que divergem daqueles da cartilha ortodoxa do comércio. Vale notar aqui que nem os Estados Unidos e nem a política de seu presidente não se encaixam naquilo que o seu discurso pregava em sentido literal.
Se um Trump mais ameno do que aquele que discursava bravatas contra o livre-comércio repercutiu de maneira aceitável aos ouvidos dos empresários, o que seria de se esperar de um país que luta por reformas cujos principais beneficiários estariam reunidos no mesmo espaço? Apesar da pequena comitiva e pouca atenção pública, o governo brasileiro agiu de maneira precisa e focada nos grupos econômicos que detinham interesses específicos e pleitos. O presidente Temer, logo ao chegar na Suíça, anunciou que o evento era ideal para “vender o Brasil” para novos investimentos e ganhar apoio internacional para as suas reformas. O tom do grupo político brasileiro foi exatamente este: forte otimismo na economia nacional e fé de que os avanços nas reformas da previdência, fiscal e trabalhista serão os motores do crescimento nos próximos anos.
Esse panfleto de venda incluiu como principais interessados a Goldman and Sachs, Nestlé, Inbev e Coca-Cola. As pautas, apesar de não terem sido divulgadas, convergiriam para que novas legislações fossem aprovadas e que o ritmo de liberalização e novas concessões públicas e privatizações se mantivessem. É de interesse mister de parte dessas empresas que se avance, por exemplo, o mercado de previdência privada com a queda do repasse público par o contribuinte e, de outras, que se modifique a legislação acerca de direitos e concessões de exploração de recursos naturais para a produção e distribuição de bebidas e implementação de indústrias. São nessas reuniões que o presidente e seus ministros pautam parte de sua política econômica, não apenas por conta do próprio discurso doméstico do direcionamento da política econômica para a atração de investimento, como também garantir o acesso a esses investidores daquilo que eles querem “comprar”.
Portanto, nota-se a diferença de caráter do discurso e de objetivos específicos de Estados poderosos e Estados mais debilitados dentro do encontro em Davos. Apesar de ambos buscarem agradar os grandes investidores, os grandes ditam o fluxo da maré e sua tendência enquanto os mais debilitados nadam e remam para poder sobreviver dentro dos fluxos de capital. O Brasil hoje joga como pequeno e implora pela atenção dos detentores do poder econômico que o notem, mesmo que o quê esteja sendo vendido seja o futuro do já quase sepultado Estado de bem-estar social do país.