A impessoalidade na Administração Pública

Um dos princípios constitucionais regentes da Administração Pública é o princípio da impessoalidade (Art. 37, caput). Impessoalidade que se apresenta em duas vertentes: a) proibir que os agentes públicos se valham da coisa pública (vale dizer, do dinheiro público e dos bens públicos) para fins de promoção pessoal; b) impedir que os agentes públicos concedam privilégios a poucos em detrimento do interesse geral da coletividade. O princípio da impessoalidade na Administração Pública é, portanto, face evidente do princípio republicano (Art. 1°, caput da Constituição Federal).

 

Pois bem, o objetivo dessa breve introdução é contextualizar, no presente artigo, sob a ótica da Constituição, a (in)validade jurídica da prática brasileira de atribuição de nomes de pessoas vivas a bens públicos.

 

Trata-se de uma conduta reiterada, a pretexto de homenagem a pessoas que prestaram (e/ou ainda prestam) relevantes serviços à coletividade.

 

Contudo, essa postura agride frontalmente o princípio constitucional da impessoalidade na Administração Pública. Os bens e logradouros públicos não podem ser denominados com o nome de pessoas vivas, pois esse comportamento “pessoaliza” a coisa pública, fazendo da homenagem um modo de promoção pessoal que se realiza às custas do patrimônio que pertence à coletividade.

 

Foi exatamente com o objetivo de coibir essa prática inconstitucional – no âmbito da Administração Pública dos órgãos do Poder Judiciário – que o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n° 52, de 08 de abril de 2008, que “regulamenta a atribuição de nomes de pessoas vivas aos bens públicos sob a Administração do Poder Judiciário Nacional”.

 

Dentre os “considerandos” dessa resolução, destacam-se os seguintes trechos:

 

Considerando que o § 1o do artigo 37 da Constituição Federal estabelece que “a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas de órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”;

Considerando que o intuito daquele comando constitucional é o de evitar a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos, de sorte que o regramento está vinculado à atividade, ao exercício de cargo ou função; (grifou-se)

 

 

Eis o texto integral da referida resolução:

 

Art. 1º É proibido, em todo o território nacional, atribuir nome de pessoa viva a bem público sob a administração do Poder Judiciário nacional, salvo se o homenageado for ex-integrante do Poder Público, e se encontre na inatividade, em face da aposentadoria decorrente de tempo de serviço ou por força da idade.

Parágrafo único. O nome do homenageado poderá ser retirado de bem público, desde que, em processo administrativo, se conclua que a homenagem se mostra desfavorável ao resguardo da integridade do Poder Judiciário.

Art. 2o Os tribunais deverão, no prazo de sessenta (60) dias, adotar todas as providências para a retirada de placas, letreiros ou outras referências aos nomes de pessoas que não se enquadrem na situação referida no artigo anterior.

Art. 3o Permanecem válidas as atribuições de nomes firmadas até o período de um (01) ano antes da data da sessão do dia 10 de abril de 2007 do Conselho Nacional de Justiça, no Procedimemo de Controle Administrativo  n°  344, desde  que  em  sintonia  com  o  artigo 1º desta Resolução.

Art. 4º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

 

Como se percebe, o Conselho Nacional de Justiça, no exercício de sua competência constitucional de exercer o controle da atuação administrativa dos órgãos do Poder Judiciário e de zelar pela observância do Art. 37 da Constituição, proibiu expressamente a atribuição de nome de pessoa viva a bem público sob administração do Poder Judiciário, com a única ressalva no caso de o homenageado ser ex-integrante do Poder Público e se encontre na inatividade, em face da aposentadoria decorrente de tempo de serviço ou por força de idade.

 

Essa resolução do Conselho Nacional de Justiça somente se aplica diretamente aos órgãos do Poder Judiciário, porque o Conselho Nacional de Justiça não possui competência para exercer o controle da atuação administrativa dos órgãos vinculados aos outros Poderes da República. Todavia, a Resolução n° 52/2008 do CNJ não passa de explicitação, no âmbito administrativo do Poder Judiciário, de valores constitucionais da mais alta envergadura (princípios republicano e da impessoalidade) que se aplicam a todos os âmbitos púbicos.

 

Há diversas formas de realizar homenagens. Os entes públicos, aliás, possuem as suas comendas honoríficas, que representam forma criativa e inteligente de homenagear, sem qualquer ferimento aos princípios constitucionais e sem qualquer aviltamento à impessoalidade administrativa.

 

Reserva Indígena Raposa Serra do Sol

 

Na pauta da sessão de hoje (18/03/09) do Supremo Tribunal Federal, a continuidade do julgamento das ações que questionam a demarcação da reserva indígena “Raposa Serra do Sol”.

 

O mérito da controvérsia começou a ser examinado pelo STF no segundo semestre de 2008 (em 27 de agosto), com a prolação do voto do Ministro Relator, Carlos Ayres Britto. Com o pedido de vista do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, o julgamento foi suspenso e retomado em 10 de dezembro. Oito Ministros já se manifestaram a favor da demarcação tal como efetuada, com algumas considerações profiláticas. O julgamento, porém, foi mais uma vez suspenso em decorrência do pedido de vista do Ministro Marco Aurélio.

 

Tudo indica que na sessão de hoje, após o voto-vista do Ministro Marco Aurélio, os Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes profiram os seus votos, com o que se terá uma decisão definitiva sobre a matéria.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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