Visto por bilhões de pessoas no mundo, o casamento do príncipe William com Kate Middleton, agora duquesa de Cambridge, foi o grande noticiário da semana.
Um casal de jovens bonitos e saudáveis, ilustrando a realidade de um conto de fadas, parece mudar o mundo com os sorrisos e promessas lançadas pelas ondas da comunicação sem fio.
E no desfiar do espetáculo, o glamour da pompa e circunstância reativa a memória do sonho, onde vige o amor pleno de compreensão e carinho.
Mas, a vida matrimonial, sempre iniciada com boas intenções e promessas, não é tão fácil quando despidos estão o fraque e o véu, porque o drama da vida não imita a arte, e o cortejo em abraços de carinho de familiares e padrinhos nunca permanece em contínua convivência de amores.
O comum, o corriqueiro, é: passado o momento dos afagos encenados para a fotografia estática ou dinâmica, tudo restar como uma saudosa passagem pela vida, onde promessas e carinhos mais das vezes são perdidos e mal lembrados.
Não fora assim não se veria tantos casamentos desfeitos, tantas uniões infelizes, tantas falências e fracassos.
Há homens que não nasceram para o casamento, que não se deixam prender pelo amor escolhido, que são incapazes de segurar, conquistar e manter a mulher amada, sendo-lhes infiéis e maus companheiros.
Mas, que não se fale somente dos homens. Porque há mulheres, e bote aí, aos montes e às carradas, fêmeas que não sabem prender seus maridos.
Falta-lhes o que a sociedade moderna baniu quando, por consequência funesta da independência feminina, erigiu como seu maior trunfo, a pouca vontade de constituir uma família.
Tal modernidade, às avessas, ditou como suprema realização da mulher a não necessidade do casamento como realização maior. Porque bem melhor é gozar a vida sem compromissos familiares, sem responsabilidade de procriação, rejeitando toda pudicícia fora de moda, preferindo gozar o efêmero, em descompromisso e com mal cheirosa promiscuidade.
Mas, o casamento como o dos príncipes ingleses renova o imaginário coletivo. Do homem conquistando a mulher que lhe parece mais bela, e da mulher que vê no príncipe o marido sonhado em proteção, fortuna e carinho.
E assim a história quer repetir os contos de fada em que vale até a Bela casar com a Fera, as Cinderelas e Gatas Borralheiras jogarem iscas de sapatinho de cristal, e até a bela menina beijar sapos, para engoli-los depois.
Porque o comum não é o sapo virar príncipe como no conto dos irmãos Grimm. O corriqueiro é o príncipe virar sapo por magia da princesinha decantada, quando desfolhada do véu e da grinalda e já transformada na megera sacramentada.
Trata-se de fato tão comum diante da fugacidade amorosa dos nubentes, que a legislação universal tem previsto contratos tentando prevenir os golpes e contragolpes a serem desferidos nos mútuos desentendimentos e atritos em vias do divórcio e da separação.
O casamento do príncipe inglês estará imune ao divórcio de seus pais; Charles, um príncipe de triste figura, tornado anuro pela sua bela Diana, a Lady Di sorridente, cuja vida fora radiosa e borbulhante, enquanto chamariz de brilho e cor, e cujo final se fizera tão momentoso e trágico, quão letal, para a monarquia inglesa em escândalo e turbulência?
Que dizer de nós, não tão nobres e tão plebeus de meia-casta, nós, mestiçados e amorenados, ou cafuzos, amulatados e mamelucos, frutos da miscigenação tesuda, quase equina por desembestada, mas que não imuniza o repasto dos tablóides, fuçando e desencavando as desavenças e os desencontros, os adultérios e as traições, os descaminhos provados, documentados e deleteriamente comentados, com a partilha dos bens, ensejando rapinagem e usura de tolos e sabidos?
Que dizer quando tais enganos sempre são tramados na jura de promessas, com o consentimento equivocado, em “sim” publico e altissonante, como ápice de pompa e circunstância, com o cônjuge bem nascido aceitando ser ferido, fisgado e aprisionado pelo anzol, às vezes mal intencionado, quão melhor e bem assestado?
Poderá tal conto de fadas ensejar a felicidade eterna de uma vida a dois, plena de riso e cor? Ou será a repetição de frustrações públicas e privadas, insatisfações múltiplas e divergências mal acomodadas?
Ora, a felicidade burguesa de um casamento passa necessariamente pelo entendimento e compreensão entre os cônjuges. É diferente do casamento no âmbito de uma sucessão monárquica.
Aqui, no contexto republicano de uma sociedade de iguais, o objetivo é a busca da felicidade, da preservação da espécie, e a criação dos filhos, sem um compromisso maior de linhagem.
Já o casamento do príncipe William com a plebéia Kate Middleton, possui uma finalidade sem a qual tudo falha. É preciso que nasça um sucessor, homem ou mulher, sem o qual a dinastia morre ou desvia de sua sequência natural; um grande problema institucional, mais das vezes traumático.
Poder-se-á dizer que agora a modernidade não mais repetirá as peripécias e contumácias de uma monarquia que passou. E tanto isso é verdade que o casamento da semana que seguiu, se deu entre um príncipe real e uma plebéia; um sinal de que os tempos mudaram.
Uma evidência de que com a falência das monarquias, a nobreza tem desaparecido na saudade dos escudos e panóplias esmaecidas. Ou seja: não se faz mais nobreza como antigamente.
A modernidade convulsionou e misturou tanto a sociedade, que mais parece mistura sólido-líquido, em decantação natural, permitindo aos bens nascidos afundarem, e aos mal providos flutuarem; o que é muito bom, tudo ao sabor de densidades próprias, e dos esforços individuais empreendidos.
Neste particular, vige o mote do poeta: “o que foi não é nada”, só restando a monarquia inglesa, cercada de água por todos os lados e em sobrevida quase exangue.
A festa, porém, foi bonita; belíssima! Como todo casamento deve ser; igual ao das estórias de trancoso, sobretudo entre desiguais, permitindo imaginar-se que o ingresso do sangue plebeu irá revigorar a monarquia.
Felizes, porém, são os casais que realmente se encontram e se doam em longevidade de carinhos. Como a Rainha Elizabeth II e Filipe, o seu Príncipe Consorte, exemplo maior, presença quase anônima na passagem, sem despertar nenhum comentário alinhavado, quando se fazia o melhor exemplo daquela festa.
Do casal real, uma quase paisagem no contexto do cenário, vinha o maior exemplo para circunstantes e espectadores mundo a fora; uma lição de carinho, de compreensão, de vida a dois, em longevidade, moderação e firmeza. Tudo o que os casais, novos e velhos, reais ou plebeus, deveriam ver, para admirar e imitar, uma lição permanente e única, a perdurar em seu maior valor.