Antônio Francisco de Jesus |
Itabaiana guarda rica memória, capitaneada pelo mito da riqueza que havia em sua grande serra, alimentada pelos currais que estão na base da pecuária sergipana, e por outras singularidades, ainda hoje notáveis, como o fabrico e a comercialização de jóias e bijuterias, sem falar da vocação do povo para atividades econômicas, como são exemplo empresários vitoriosos em seus negócios, enriquecidos pelo trabalho. A idéia, circulante no Brasil e em parte do mundo, levou a criação do Regimento Geral das Minas do Brasil, confiado ao experiente Dom Rodrigo Castelo Branco, que morou cerca de quatro anos em Itabaiana. Os currais de gado fascinaram os holandeses, como a notícia das minas. A comercialização, a partir das feiras nos diversos povoamentos da região, responde pelo sucesso de homens como Oviêdo Teixeira, os irmãos Paes Mendonça – Pedro, Mamede e Euclides – Albino Silva da Fonseca, José Silva, José Cunha, e outros.
Vez por outra, no contraponto do cotidiano político, surgem movimentos que põem Itabaiana em destaque. A força eleitoral dos itabaianenses tem garantido assentos no Senado – Passos Porto, Albino Silva – na Câmara Federal – Airton Teles, Euclides Paes Mendonça, José Carlos Teixeira, José Carlos Machado, José Queiroz, José Teles – na Assembléia Legislativa – Sílvio Teixeira, Oviêdo Teixeira, os irmãos José, Antonio e Maria Mendonça, Arnaldo Bispo -, dentre outros que cumpriram mandatos, representando, nos diversos partidos e pleitos eleitorais, a massa de votantes, radicalizada em disputas que marcaram a história política do Estado. A fundação do jornal O Serrano, por exemplo, serviu à organização de um movimento em defesa de Itabaiana, politizando a população mais jovem, legando ao município uma corrente nova de pensamento e de prática, de grande efeito.
Sob o ponto de vista cultural, convém registrar os nomes de Francisco Carvalho Lima Júnior, Sebrão, sobrinho, Alberto Carvalho, Antonio Oliveira, Vladimir Souza Carvalho, dentre outros, que lançaram obras importantes, que projetaram a terra e a sociedade itabaianense. Evidente é que era, então, e assim permaneceu por décadas, muito lenta a discussão cultural, em decorrência, certamente, da distribuição da população, que mantinha dois terços dela no campo e apenas um terço na zona urbana. Ainda assim, ampliou-se em muito a presença de jovens de Itabaiana nas salas de aulas da Universidade e das escolas superiores. O Colégio Murilo Braga, criado no final dos anos 1940 pelo governador José Rollemberg Leite, manteve-se responsável pela preparação dos jovens, prestando relevantes serviços.
É nesse ambiente acadêmico, que surge uma geração de pesquisadores, seguindo as picadas abertas por Vladimir Souza Carvalho, historiador por excelência, com obra de ficção que aumenta seu prestígio e reconhecimento. Nomes como os de Almeida, talvez o mais velho do grupo, José Augusto Machado, autor de um livro de “causos”, Vanderley, Robério, Riva, revolvem a poeira dos documentos e organizam uma base de dados da maior e melhor qualidade, para servir à compreensão dos fatos da história local. A eles se soma, o mesmo Vladimir Souza Carvalho, guia e mestre, cuja obra publicada é de porte essencial para Itabaiana e para Sergipe. Pelo menos mais dois nomes, de professores da UFS, Lindivaldo e Giliard, elevam o nível do fazer cultural serrano, que conta, ainda, com a interlocução de Antonio Samarone, também da terra, doublé de pesquisador e de político, cuja alma itabaianense exalta a cidadania.
Outro nome, do mesmo naipe, chama a atenção dos leitores para a sua obra, representada hoje por dois títulos bem recebidos pelos leitores: Os tabaréus do sítio Saracura e Meninos que não queriam ser padres, dois livros maduros, bem estruturados, em linguagem correta, que surpreende aos que têm oportunidade de leitura. Antonio Francisco de Jesus, economista de formação, jornalista experiente, crítico de cinema, revela-se ficcionista, tomando lembranças simples, recolhidas do dia a dia das casas de sua família e de seus amigos, e erguendo monumentos memoriais, que, no mínimo, são fontes da história. Os livros de Antonio Francisco dão dimensão de relevo ao esforço dos escritores itabaianenses, comprometidos com o viver local, seu humor, suas lembranças, guardadas ou anotadas por cada um, como se estivesse em curso um grande Anais, como espelho onde cada pessoa de Itabaiana pudesse buscar mais do que sua imagem, sua identidade.
Como ocorre com a literatura, a memória contribui para que a história faça a exegese dos fatos e das circunstâncias que explicam o comportamento humano. As literaturas dos povos guardam explicações preciosas, das quais os escritores se valem como verdadeiras fontes, inesgotáveis. Itabaiana, assim, sai na frente e toma a dianteira de um movimento revelador, a partir de pesquisas, documentos, ficção, que mais do que merecer a atenção do Estado e dos sergipanos, fixa uma atitude, que agrega pelo que oferece de compromisso em busca da identidade.