A semana que passou foi dedicada à “Consciência Negra”, uma temática que traz consigo algo que nunca percebi nem exerci: o preconceito racial.
Que eu me lembre, nunca exerci qualquer rejeição a amigos por conta de tez, raça, credo, cor de olhos, madeixas lisas, cacheadas ou pixaim, como se dizia então, e que se pensava vantajoso por impermeável, e sobremodo por dispensar brilhantinas, gumex, fixadores vários, aquela tortura da minha adolescência, querendo exibir um pimpão à Elvis Presley.
Coisas que a Biologia explica e a Física constata, enquanto característica individual de cada ser e de sua linhagem, e outros alinhamentos e caminhos, como preferências clubísticas, bloco carnavalesco, hemiplegias ideológicas, e até mesmo preferências de gênero, hoje a ensejar tanta frustração e denúncia.
Nunca conheci alguém que descesse uma calçada para não cruzar com um negro.
Vi e ouvi, muitas vezes, a cor do homem e da mulher servirem como chacota, piada tola, como se faz com português burro, loura imbecil e mineirinho tabaréu.
Causou-me surpresa o apresentador televisivo William Waack ser execrado por um comentário infeliz, dito na intimidade que todos possuímos e precisamos dela dispor, mas que foi flagrado e divulgado urbi et orbi, um ano depois, por indivíduos zelosos pelo bom convívio das raças.
Uma surpresa, porque William Waack era o que tínhamos de melhor, enquanto comentarista politico das relações internacionais.
E de repente, foi jogado às feras, algo que só se explica, porque o seu sucesso incomodava a muitos.
O tema me vem agora, porque ouso pensar diferente.
Não me sinto feliz com este aflorar de inquietude, este grude que agarra mancha e contamina, este excesso de acritude nas relações humanas.
De repente alguém nos lança o mangual querendo nos ferretear, no agir e no pensar, afinal quem negro não é, está sendo coagido a se responsabilizar pelos séculos de escravização, ocorrido na civilização ocidental.
Se antes Rudyard Kipling poetava sobre “Fardo do homem branco”, listando o esforço civilizatório do Inglês, Fernando Pessoa via no sal do mar só lágrimas de Portugal, tudo porque seria preciso “passar além da dor” por aqueles que ousassem e quisessem ir “além do Bojador”.
Esta coisa em que “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”, afinal o luso povo precisava navegar, dar vasão a sua força e garra dilatando a fé e o império, e na certeza que “Navegar é preciso, e viver não é preciso”.
Navegar é ciência, é carta, é matemática.
Já viver é ousar, é prosseguir, seguir em frente sem temer o impreciso de Scila, Caríbdis, e de tantos monstros que nos atravessam o caminho, sobretudo as incompreensões e preconceitos.
Como agora esta novidade de enaltecer um sofrimento nunca remido, a requerer empoderamentos e vantagens, fora da livre concorrência e do mérito, quando este nosso país precisa se levar, sobretudo, a sério, no seu agir e pensar.
Houve um tempo, poder-se-á dizer não tão distante, em que se fazia uma louvação incomparável do gingado da morena, do seu bamboleio, regurgitando lascívia em cheiros de cravo, canela, em multi perdões de pecados.
“Como a cor não pega(va)”, cantava-se a mulata de quem Lamartine Babo bem queria o amor.
Naquele, e em muitos carnavais, por gerações, a mulata tinha o verdadeiro sabor do Brasil.
Neste contexto, Oswaldo Sargenteli, sobrinho da Lamartine, foi além do tio. Definia-se como “mulatólogo”, introduzindo um show famoso, enquanto lenda viva de “ziriguidum”. Mostrava ao mundo “as mulatas que estavam no mapa”.
Mas, aí estou divagando, adentrando paraísos orgíacos de saudades remidas.
Volto ao tema porque desejo falar de um artigo que apareceu na revista francesa Le Figaro Magazine de sexta-feira, 24 de novembro, sobre “Os pastores combatentes do Vale do Omo”, matéria de cuja figura segue abaixo.
A matéria acima foi exibida por Le Figaro Magazine de 24 de novembro de 2017, com texto de Julien Harel e Fotografias de Jean-Michel Turpin. |
Os Suris são uma tribo de pastores do sudoeste da Etiópia, no vale do Omo.
Segundo a matéria, rica em fotografias de Jean-Michel Turpin, os Suris têm o gado como seu sustento e companheirismo. Aquecem os seus rebanhos com fogueiras nas noites frias. Não se alimentam da sua carne, só o sacrificando em rituais, quando o sangue é aspergido em banho coletivo.
Os homens só se casam quando possuem dezenas de vacas, que são dadas à família da noiva.
A matéria da revista enaltece o modo de vida dos Suris, sobretudo uma luta que travam nus, para despertar o interesse das mulheres.
Os Suris somam 30.000 indivíduos, cerca de 0,03% da população etíope, e vivem no vale do Omo, hoje seu último refúgio.
O gado é vigiado com fuzis Kalashnikov, afinal os Suris têm inimigos ancestrais que lhes roubam o rebanho.
A reportagem não fala em exploração, nem escravização por parte do homem branco, mas sabe-se que as tribos africanas se dizimam mutuamente, sem falar que o trabalho escravo entre os negros é milenar.
De Jean Jaques Rousseau, sabe-se, que enaltecia o bom selvagem. Para ele, o silvícola nascera santo e a civilização o corrompia.
Rousseau ainda hoje tem seus seguidores e fanáticos.
Teve cinco filhos com sua amante de Paris.
Ironicamente escreveu Emílio, sobre como educar as crianças, mas destinou a sua prole aos cuidados de um orfanato. Não alimentou nem agradou nenhum filho. Seria hoje condenado pela lei brasileira.
A matéria de Le Figaro enaltece um costume tribal bárbaro, que não fosse a civilização ocidental ainda campearia na África. Trata-se de uma luta feroz, os homens querendo conquistar suas esposas na base da luta sem regras. É isso que devemos louvar?
Acho que bem melhor do que falar na Consciência Negra, deveríamos falar da Consciência Humana, o que pelo menos, nos concentrássemos na Consciência Brasileira!