Enquanto fatos relacionados a algum tipo de violência ocorridos em outros estados e até mesmo em outros países são debatidos à exaustão na mídia e comentados amplamente nas redes sociais, outros episódios de natureza semelhante que acontecem em nosso bairro, em nossa cidade e em nosso estado, passam, muitas vezes, quase que despercebidos no debate público. Na semana passada, por exemplo, um fato ocorrido em Aracaju deveria ser, em minha opinião, objeto de maior discussão, atenção e comoção entre nós que aqui vivemos. Um fato que trata de um tipo bem particular de violência, a violência de Estado praticada por instituições de (in)segurança, mais precisamente pela Guarda Municipal de Aracaju.
Me refiro à última sexta-feira, dia 9, quando jovens e estudantes – que realizavam uma manifestação contra o absurdo e injustificável reajuste da tarifa de ônibus para R$ 2,70 – foram agredidos por agentes da Guarda Municipal de Aracaju. Para alguns, balas de borracha pelo corpo. Para outros, cassetetes nos ombros e costas. Como se não bastasse o uso das armas, uma mulher trabalhadora que participativa da atividade de bicicleta foi atropelada por um carro da Guarda.
Importante ressaltar, de início, que a manifestação de violência da GMA na última semana não foi a primeira e, muito provável e infelizmente, não será a última.
Relembremos outras situações, apenas nesses dois anos de gestão João Alves, em que a Guarda Municipal de Aracaju agiu de forma semelhante: em 2013, estudantes e trabalhadores que tentavam acompanhar uma sessão da Câmara de Vereadores que discutiria o reajuste da tarifa no transporte coletivo foram recepcionados na porta da Câmara com spray de pimenta e cassetetes; e em maio do ano passado, agentes da Guarda e policiais militares repetiram a cena e tentaram impedir o ato “rolezinho contra a Copa”. Por "impedir", entenda usar e abusar da força para reprimir.
Para quem esteve atento à campanha eleitoral de João Alves, infelizmente, não há surpresa nessa forma militarizada e truculenta de atuação da GMA. Candidato, João prometeu que, em sua gestão, a Guarda Municipal iria dispor de “inteligência”, “tecnologia” e “armas letais e não-letais”. Trocando em miúdos, uma Polícia Militar em nível municipal. E se tem uma proposta que João está implementando é, justamente, essa. Os efeitos dessa concepção de Guarda Municipal e do investimento da Prefeitura já são sentidos por aqueles que ousam ir às ruas em Aracaju exercer o seu direito de manifestação e expressão.
Para agravar, essa concepção de Guarda Municipal autoritária e repressora que tem João Alves está longe de ser exceção na cabeça dos agentes públicos. Pelo contrário, é uma visão que foi legitimada e reforçada com a criação do Estatuto Geral das Guardas Municipais, aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pela Presidência da República, em agosto de 2014, que dá poder de polícia às Guardas Municipais e permite que seus integrantes usem armas de fogo.
Ou seja, enquanto setores democráticos e progressistas da sociedade propõem a desmilitarização das polícias já existentes, o que temos é a militarização das Guardas Municipais, fortalecendo, assim, a repressão e a violência, além de permitir que cada prefeito, como João Alves, tenha uma polícia sob o seu comando direto.
Em artigo recente sobre o Estatuto Geral das Guardas Municipais, o ex-presidente da OAB/RJ, Wadih Damous, afirmou que "é uma enorme irresponsabilidade permitir que, num país com as dimensões e a diversidade do Brasil, prefeitos ao longo de todo o território nacional tenham sua própria polícia. As arbitrariedades serão incontáveis. Estaremos diante de um retrocesso digno da República Velha".
A realidade de Aracaju não deixa dúvidas sobre a precisão do que escreveu Wadih: as arbitrariedades da Guarda Municipal de João Alves já são incontáveis, tanto quanto injustificáveis e inconcebíveis.