ACONTECEU NO FIM DO SÉCULO XIX

A Carta desta Semana está baseada em um artigo de José Murilo de Carvalho, publicado na Folha de São Paulo de 21/02/1999.

Há cento e nove anos, em 15 de novembro de 1898, Campos Sales assumiu a Presidência da República, segundo presidente civil eleito pelo voto popular após os governos militares do início do novo regime. A situação financeira do país era calamitosa. Caracterizava-se pelo grande déficit orçamentário, pela alta inflação, pela crise cambial e pela queda internacional do preço do café.

O déficit tinha levado a acumulação de grande dívida externa. A desvalorização do mil-réis e a queda do preço do café tinham tornado essa dívida impagável. A insolvência materializou-se em junho de 1898. Em Londres, negociando em nome do governo, Campos Sales, já eleito, assinou rapidamente o acordo de moratória.

O acordo incluía um empréstimo de 10 milhões de libras esterlinas destinado ao pagamento dos juros da dívida. Adiava-se até 1911 o início do pagamento da amortização do principal. Em troca, o governo brasileiro hipotecava as rendas da alfândega do Rio, sua principal fonte de receita e, subsidiariamente, a das outras alfândegas. Além disso, comprometia-se a executar um programa de valorização do mil réis, de corte de gastos públicos e de aumento de impostos e submetia-se à fiscalização dos representantes no Rio de Janeiro do London and River Plate Bank, do London and Brazilian Bank e do Brazilianishe Bank fur Deutschland.

O objetivo principal de Campos Sales era recuperar a confiança dos banqueiros e investidores internacionais no país e trazer de volta os capitais externos.

Assim, contando com a eficiente ajuda do Ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho, um liberal convicto, que tachava de socialista a tradição brasileira de interferência do Estado na economia, executou o que propunha. Pelo lado do gasto, as despesas do governo foram reduzidas ao mínimo, as obras públicas foram suspensas, as estradas de ferro da União foram arrendadas. Pelo lado da receita, 10% das tarifas alfandegárias passaram a ser cobradas em ouro e foi criada uma infinidade de novos impostos sobre o consumo.

As conseqüências de tal política foram as que se podiam esperar: Inúmeras falências no comércio, na indústria, nos bancos e mesmo em setores da agricultura, seguidas do inevitável desemprego.

Do lado positivo, o governo conseguiu boa parte de seus objetivos. O mil-réis subiu de 8 dinheiros em 1898 para 12 em 1902; 100 mil contos em papel moeda foram retirados de circulação, valorizando o mil-réis; a execução do orçamento passou a apresentar excedentes; foram acumulados fundos em Londres para futuro pagamento de dívida externa. Por esses êxitos, o presidente recebeu telegrama de congratulações dos Rothschild ao final do seu governo, sinal inequívoco da recuperação da confiança dos banqueiros no país.

Fonte de acirradas e intermináveis controvérsias, o governo de Campos Sales teve de esperar pela história para que um julgamento menos apaixonado de seus êxitos e dos custos que acarretou para a população e para o país fosse feito. Em sua defesa alegou-se entre outras coisas, que ele não tinha sido o responsável pelos problemas que teve de enfrentar.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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