Litisconsórcio
Advocacia pública x escritórios contratados
Há um litígio antigo entre os advogados públicos e os escritórios contratados pelo poder público. Há anos que esse imbróglio vinha tomando um curso ruim entre os pares. Os advogados públicos – procuradores estaduais e municipais – buscam fortalecer a classe exigindo concurso para procurador nos municípios, mesmo sabendo que a legislação exige este certame apenas para os municípios com mais de100 mil habitantes. Contrário à esse entendimento os escritórios contratados entendem que o serviço prestados por eles além de serem bem acessíveis são melhores do que o público. Este entendimento rendeu processos contra escritórios e reuniões na Ordem que vararam noites sem uma solução plausíveis para as partes.
Não há dúvidas que a contratação de escritórios de advocacia por prefeituras ganhou relevo nos últimos anos em razão do número elevado de ocorrências, os valores pactuados, a discussão sobre a possibilidade ou não destas licitações excepcionais e os aspectos subjetivos que permeiam estas relações. O art. 37 da Constituição Federal de 1988 foi redigido de forma a impor, como regra geral no processo licitatório, a primazia da competição e os requisitos mínimos elencados no art. 37, inciso XXI. Mas, mesmo o dispositivo citado prevê ressalvas em casos específicos na legislação, hipóteses em que a licitação pública seria dispensada ou inexigida, a fim de cumprir as especialidades dos objetivos requeridos, o que levanta a polêmica acerca das licitações ou dispensa delas nas contratações de escritórios de advocacia por prefeituras.
Retornando à Administração Municipal, o tema possui particular interesse em razão da imensa gama de contratações de serviços de assessoria jurídica, pareceres (consultoria) e advocacia contenciosa e o Supremo Tribunal Federal já sinalizou pela possibilidade de contratação direta de serviços de consultoria jurídica. Por sua vez o STF tratou, com proficiência, de questão semelhante. Os dois acórdãos permitem a observação de questões centrais sedimentadas na jurisprudência do STF e que não raro são negligenciadas nas ações judiciais propostas pelo MP e nas tomadas de contas instauradas pelos tribunais de contas.
Ratificando o pensamento acima o Plenário do Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP – no último dia 14, aprovou a proposta de recomendação sobre o assunto, recomendando assim aos promotores e procuradores que, caso entendam ser irregular a contratação de advogado sem licitação, descrevam na eventual ação a ser proposta por que os requisitos da Lei de Licitações foram descumpridos no caso. Essa aprovação evita o excessos por parte dos MPs, que em alguns casos pede providências inquisitórias contra advogados sem a observância da legislação correspondente.
Os Acórdãos acima e o propositura do CNMP põe fim às divergentes disputas interpretativas e com a criação de requisitos não impostos pelo ordenamento é conhecer as circunstâncias de cada contratação. Precisa-se sim avaliar motivadamente a conduta dos agentes envolvidos em cada caso, os benefícios que a Administração objetivou e/ou colheu pela execução dos serviços e a compatibilidade dos valores ajustados com os praticados no mercado. No mais, deve-se afastar em definitivo a punição dos “delitos de exegese”. Acredita-se que muitas das ações propostas pelo MPE no interior do Estado devem chegar ao fim, evitando que escritórios de advocacia sejam acionados aleatoriamente. Outro ponto é que os escritórios contratados tenham o mesmo direito dos advogados públicos que é o simples exercício a profissão tanto na área privada quanto na pública.
ARTIGO
Flávio Augusto Araújo Cardoso, advogado, especialista em direito público, pós-graduando em direito do consumidor.
VALOR MÍNIMO PARA COMPRA COM CARTÃO É PRÁTICA ABUSIVA
As compras realizadas com cartões de crédito e débito sempre causam muitas dúvidas entre consumidores e lojistas, especialmente no que diz respeito aos direitos e deveres de cada um nesta relação.
Muitos consumidores não sabem, mas as lojas não são obrigadas a aceitar outra forma além de dinheiro em espécie. No entanto, uma vez que se disponha a receber cheque ou cartão de crédito, o estabelecimento não pode criar restrições para a sua utilização — exceto no caso de cheque administrativo ou de terceiros, que o lojista pode se recusar a receber. A loja não pode exigir valor mínimo de compras para pagamento com cartão de débito ou crédito, nem fixar preços diferentes conforme o meio de pagamento (cheque, cartão ou dinheiro).
Flávio Augusto Araújo Cardoso, advogado, especialista em direito público, pós-graduando em direito do consumidor. |
Caracteriza prática abusiva no mercado de consumo a cobrança de valor mínimo para compra com cartão de crédito. Essa proposição se ampara na constatação de que, nas compras realizadas em cartão de crédito, é necessária uma distinção das relações jurídica entre consumidor, emissor (eventualmente, administrador) e fornecedor. Na primeira situação, existe uma relação jurídica entre a instituição financeira (emissora) e o titular do cartão (consumidor), o qual obtém crédito e transfere àquela a responsabilização pela compra autorizada mediante o pagamento da taxa de administração ou mesmo de juros oriundos do parcelamento da fatura. Na segunda situação, há uma relação jurídica entre a instituição financeira (empresa emissora e, eventualmente, administradora do cartão de crédito) e o estabelecimento comercial credenciado (fornecedor). A emissora do cartão credencia o estabelecimento comercial e assume o risco integral do crédito e de possíveis fraudes. Para que essa assunção de risco ocorra, o estabelecimento comercial repassa à emissora, a cada venda feita em cartão de crédito, um percentual dessa operação, previamente contratado. Na terceira situação, também existe uma relação jurídica entre o consumidor e o estabelecimento comercial credenciado (fornecedor). Aqui, o estabelecimento comercial, quando possibilita aos consumidores efetuarem a compra mediante cartão de crédito, incrementa a atividade comercial, aumenta as vendas e obtém lucros, haja vista a praticidade do cartão de crédito, que o torna uma modalidade de pagamento cada vez mais costumeira. Observa-se, assim, diante dessa análise, que o estabelecimento comercial tem a garantia do pagamento das compras efetuadas pelo consumidor por meio de cartão de credito, pois a administradora assume inteiramente a responsabilidade pelos riscos do crédito, incluindo as possíveis fraudes. O pagamento por cartão de crédito, uma vez autorizada a transação, libera o consumidor de qualquer obrigação ou vinculação junto ao fornecedor, pois este dará ao comprador total quitação. Assim, o pagamento por cartão de crédito é modalidade de pagamento à vista, pro soluto, porquanto implica, automaticamente, a extinção da obrigação do consumidor perante o fornecedor, revelando-se prática abusiva no mercado de consumo, a qual é nociva ao equilíbrio contratual, a cobrança de valor mínimo em compras com cartão de crédito. É, nesse ponto, a exegese do art. 39, V, do CDC: "Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (…) V – exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva. Ademais, o art. 36, X e XI, da Lei 12.529/2011, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, considera infração à ordem econômica, a despeito de culpa ou de ocorrência de efeitos nocivos, a discriminação de adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços mediante imposição de condições operacionais de venda, ou seja, valor mínimo para compra com cartão de crédito, bem como a recusa à venda de bens ou à prestação de serviços em condições de pagamento corriqueiras na prática comercial. Por sua vez, o CDC é zeloso quanto à preservação do equilíbrio contratual, da equidade contratual e, enfim, da justiça contratual, os quais não coexistem ante a existência de cláusulas abusivas.
Desse modo, o consumidor que for coagido a incluir mais produtos na compra para atingir o valor mínimo deve exigir seus direitos. Caso não seja atendido, não precisa aceitar a imposição e assim, deverá escolher outra loja para realizar suas compras. O consumidor pode ainda fazer a denúncia ao PROCON de sua cidade.
Processo Civil? É com o professor Arnaldo Machado!
A FASE DE SANEAMENTO NO CPC DE 2015: SERÁ QUE DESTA VEZ A LEVAREMOS A SÉRIO?
Arnaldo de A. Machado Jr. é advogado cível, especialista e mestre em processo civil, professor e subchefe do Departamento de Direito da UFS e Conselheiro Federal da OAB/SE. |
A fase de saneamento desempenha um papel fundamental para a eficiência do processo. Por meio dela, nas causas a serem submetidas à fase probatória, o magistrado deve, sobretudo, delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos, e definir as questões de direito relevantes para a decisão de mérito. O objetivo é claro: demarcar o espectro da instrução, em perfeita consonância com os princípios da duração razoável do processo e da economia processual.
Ocorre que um percentual significativo de processos não experimenta a aludida fase, mesmo havendo previsão legal para isso. Esta triste realidade experimentada desde o Código de 1973 tende a se repetir com o novo Código, a menos que haja um esforço, em sentido contrário, de todos os operadores. Por diversas razões, audiências de instrução são designadas, sem que antes os feitos tenham sido saneados, proporcionando atividades probatórias sobejamente desnecessárias ao deslinde dos feitos, em flagrante atentado ao devido processo legal.
O Código de 2015, consciente da importância do saneamento, permite agora que as partes apresentem ao juiz, para homologação, proposta de delimitação consensual das questões de fato e de direito, a qual, se homologada, vincula as partes e o juiz (§2º do art. 357). Trata-se de providência inovadora (hipótese de negócio jurídico processual típico), que atende perfeitamente às premissas do nosso modelo cooperativo de processo.
Entendo que a atuação das partes é primordial para que tal intento seja alcançado, mormente por conta do protagonismo assumido por elas nesta quadra histórica do processo civil. Desse modo, espero que as partes (e os seus advogados) possam compreender corretamente este cenário, apresentando, sempre que possível, a referida proposta de delimitação consensual, providência apta a melhorar substancialmente a qualidade do procedimento e da própria prestação jurisdicional.