“Ah, se eu conseguisse realizar meu sonho!”
Esta é uma expressão que, de vez em quando, implícita, ou explicitamente, escutamos. Pessoas em plena forma e vigor sonhando acordadas em realizar algo, porém esbarram no “ah, se eu conseguisse!”
Via de regra, as suas aspirações estão tão próximas, são tão fáceis de realizar, são tão simples que dá uma vontade louca de se dizer em alto e bom som: vá em frente, faça. Arrisque, acerte e erre também, mas, por favor, faça. Se a proposta é honesta e está dentro dos padrões éticos e morais, não pense duas vezes, vá em frente, FAÇA.
Acredite: nada acontece do nada. Só há faísca no atrito. Quer conquistar? Tem que atritar. Sem ação não há construção; sem esforço, sem doação, não há vitória. Busque o seu sonho, pois tudo depende de um processo, um único e exclusivo processo: “fazer”.
Lembro agora um amigo, chamado Zé Carlos. Éramos colegas de trabalho: ele, chefe do “departamento pessoal;” e eu, gerente de uma das lojas. Isso lá pelo final da década de setenta.
Naquela época, além de laborar na administração daquela loja, eu era também instrutor do SENAC e ministrava treinamentos na área de “gerência e de vendas”.
O maior desejo do Zé Carlos era sair da área de pessoal, onde tinha um salário fixo razoável, mas bem inferior ao dos vendedores que, em alguns casos, poderia chegar a três ou quatro vezes mais. Por este e outros motivos, ele sonhava muito em mudar da função.
Porém, temia, tinha medos, se “pré-ocupava” com muitas coisas que poderiam acontecer, com esta mudança e, por tal razão, não tinha coragem de deixar o que chamava de certo pelo duvidoso.
Dizia sentir calafrios só em pensar em iniciar o mês quase “zerado” e ficar aguardando que aparecesse alguém para comprar, pois, como todos sabemos, o vendedor ganha um pequeno salário e o restante é composto pelas comissões: vendeu, terá uma boa retirada no final do mês; ao contrário, se não vender, haverá de se contentar com aquele “salariozinho” básico.
Esta situação o atormentava. Ele não acreditava que venderia. Achava que nós, da área de vendas éramos aventureiros. Porém, todo final de mês a sua função o obrigava a contabilizar as gordas retiradas dos “aventureiros”.
Nesta oportunidade, crescia, mais ainda, o seu desejo de mudar de função. Mas toda sua vontade esbarrava na maldita exclamação “e, se…”, e, se não der certo; e, se eu vender pouco; e, se eu não vender nada; e, se chover; e, se não chover; e, se eu adoecer, e, se, e, se…
Quando ele vinha com esta lengalenga, nós, eu e outros colegas, procurávamos convencê-lo de que essa sua “pré-ocupação” não deveria subsistir, pois ele era capaz, bastava que acreditasse e tivesse a coragem de se aventurar um pouco, pois, se era isso o que ele desejava deveria ir em frente.
Pois bem, nos encontramo-nos numa sala de aula do SENAC em Fortaleza e, aí, por ser conhecedor da sua história, assim que tive oportunidade, explorei a sua situação como exemplo. Iniciei por pedir-lhe que ele enumerasse, numa escala de “0 a 100”, quantos dos seus sonhos se efetivavam. Fiquei espantado quando ele disse que apenas uns 20% a 30%.
– Quer dizer que 70% dos seus sonhos não se realizam?
– Não. Foi a resposta.
Aí eu indaguei o porquê desta falta de realização pessoal.
– É porque eu tenho muito medo de tentar e me decepcionar, tudo que eu vou fazer, faço com muita preocupação, pensando sempre que o resultado poderá não ser o esperado.
Perguntei-lhe:
– E estes temores, no pouco que você experimentou realizar, usando a mesma escala de “0 a 100”, quanto se efetivaram.
Ele disse a mesma quantidade: entre 20% e 30%
– Quer dizer que os seus maus presságios, os seus medos, as suas pré-ocupações são também, absolutamente desprezíveis, você já percebeu isto? Você já parou para pensar que está necessitando se arriscar mais?
É, tenho percebido isso. Tudo o que idealizo, vejo que outros fazem e se dão bem. Você é um deles, Pascoal. Eu também sonhei muito em estar aí como você, ensinando os outros aquilo que sei. Porém, eu sequer tenho coragem de largar aquele escritório e me aventurar numa frente de loja como vendedor. Imagine dar aula sobre departamento de pessoal, assunto que domino com certa facilidade.
Depois daquela reflexão, todos percebemos a sua transformação: ele tomou coragem, controlou melhor os seus medos, pediu a mudança de função e foi aceito como vendedor na loja que eu gerenciava. Tornou-se um dos melhores vendedores, trabalhamos mais alguns anos juntos, aquela rede de lojas foi vendida para outro grupo. Saí e fui exercer outras profissões, ele continuou.
Perdemos, por longos anos, o contato e, somente em 2006, o reencontrei grisalho, avô e feliz empresário, com várias lojas em Fortaleza e até em outras cidades do interior do Ceará. Pelo visto, deve ter perdido os medos de perseguir seus sonhos.