ANESTESISTAS NÃO SÃO CRIMINOSOS

       Audiência ocorrida na semana que passou no Ministério Público Estadual colocou frente a  frente  anestesistas e gestores de saúde do estado de Sergipe. Sob a absurda acusação de formação de cartel, a laboriosa classe dos anestesistas do estado, liderada por sua cooperativa, foi chamada a prestar esclarecimentos sobre determinadas condutas ditas corporativas e a suspensão do atendimento no Hospital São José, bem como a recusa em fechar contratos ou participar de concursos promovidos pelo gestor estadual da saúde.

      Anestesistas são trabalhadores  como outros quaisquer,  que têm não só o direito de lutar para receber salários e remuneração dignas, como o dever de exigir condições adequadas e seguras para exercer o seu nobre e sagrado ofício. E em Sergipe, que não é diferente do Brasil, não são poucos os locais que apresentam condições inseguras para a prática de um ato anestésico.        

       Anestesistas, como qualquer categoria, podem e devem também buscar, através do órgão que os represente, a formalização de contratos e convênios que vão ao encontro de seus interesses. A opção de não participar de concursos públicos que não contemplem seus anseios pessoais também é um direito de qualquer cidadão e também o é dos anestesistas. Não atender planos  de saúde que não acatam a CBHPM (Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos), editada pela Associação Médica Brasileira e defendida pelas demais  entidades médicas, também é um sagrado direito do médico de toda e qualquer especialidade. Ninguém é  obrigado a trabalhar para quem não quer e quando trabalha, tem na greve um instrumento legítimo quando não vê  atendida as suas reinvidicações.  

       Por tudo isso, os anestesistas não praticam cartel, não são criminosos, são médicos trabalhadores que dão um exemplo de luta, coesão, determinação, força e união. A luta dos anestesistas é a luta de todos os médicos do Brasil por uma mudança radical nesse modelo cruel, onde todos se julgam no direito de explorar e condenar o médico, quer seja o poder público estadual, municipal, federal e até mesmo o judiciário.

      Recentemente os médicos de Aracaju fizeram uma greve justa, que perdurou por mais de 30 dias e só voltaram ao trabalho porque o poder judiciário  obrigou, sob o protesto dos próprios procuradores do município de Aracaju que não concordaram publicamente com o pedido do procurador chefe para a decretação da ilegalidade da greve. Não faltam médicos no Brasil. Faltam médicos no SUS, porque os gestores não querem remunerar adequadamente. Com isso, expulsam cada vez mais os médicos do SUS. Melhor para eles é fazer Medicina sem médicos.

      É para esse fato que o Ministério Público tem que estar atento. Ninguém tem o poder de obrigar médicos a trabalhar em condições inadequadas e remuneração aviltante, pondo em risco a qualidade do atendimento à população. Os médicos estão desencantados com o serviço público  e a prova disso foi a manifestação ocorrida em São Paulo na sexta-feira última,  quando foram às ruas para não só dar  um basta,  mas clamar por socorro.

     Volto a dizer. Os anestesistas não praticam cartel, porque são livres para tomar decisões. Lutam coesos sim, por dignidade, por segurança e conforto nos seus delicados e arriscados procedimentos, pela possibilidade de poder cuidar bem dos pacientes que entregam a vida em suas mãos, lutam para ter condições de se atualizar convenientemente, participar de cursos e congressos, propiciar vida decente para a sua família. 

     Por isso, o Ministério Público não tem o direito de punir esses valorosos trabalhadores da saúde, cedendo às pressões de interesses bem definidos. Deve sim exigir  dos dirigentes mais respeito e consideração e uma remuneração justa para esses profissionais, na busca de uma isonomia que contemple todos os atores envolvidos nesse processo. Os médicos gostariam muito de ganhar o que ganham os procuradores ou os juízes, mas sabem que nunca chegarão a tanto. Ficarão no entanto satisfeitos em receber apenas salários justos e compatíveis com a sua longa formação, elevado risco, complexidade extrema e alto grau de atenção e conhecimento, condições que coexistem no exercício de tão nobilitante profissão.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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