Atitudes e lições

Fundição
Depois da Emancipação Política, decorrente da Carta Régia de 8 de Julho de 1820, confirmada com a Constituição do Império do Brasil, em 1824, Sergipe deu saltos de gigante, na organização de uma administração voltada aos interesses da população emancipada. Por qualquer ângulo que seja visto e acompanhado, no curso de 50 anos, Sergipe surpreende pela capacidade de sustentar uma economia própria e próspera, com ênfase para a produção e exportação açucareira, cuidando de projetos que visavam integrar o território e a população, construir uma riqueza local e organizar uma sociedade sintonizada com o resto do País.

 

No capítulo das obras estruturantes, que contaram com engenheiros civis e militares, como o Tenente-Coronel Euzébio Gomes Barreiras, Carlos de Mornay, Sebastião José Basílio Pirro, Wilagram Cabrita, Marcelino Rodrigues da Costa, Eusébio Steveaux, Pereira da Silva, Pedro Pereira de Andrade, responsáveis por canais, pontes, prédios, melhoramentos em geral, elas estavam em toda a Província e muito especialmente na construção de Aracaju, que a partir de 1855, se transformou no maior canteiro de obras de Sergipe, em todos os tempos. Abona aquela realidade, o testemunho do Imperador Pedro II, que visitou e fez inspeção em grande número de obras públicas em andamento, em janeiro de 1860. Aracaju como a capital da Província consolidou ações protetoras da economia e da vida social. O cuidado com as barras fluviais, que levavam ao mar a produção de açúcar, precedeu a montagem de uma base industrial dirigida a proteger aquela geração de riqueza, que chegou a ultrapassar, por volta de 1860, o número de 800 engenhos.

 

Para a manutenção da indústria açucareira, Sergipe contou com empresas estrangeiras, instaladas em Aracaju e em Laranjeiras, desde 1860, contando com incentivos (então chamados de privilégios) do Governo. Surgiram as fundições, para conserto de máquinas à vapor, rodas de ferro de moer em água, fabrico de todas as ferragens e instrumentos agrícolas, seguidas de outras destinadas, a partir de 1865, a fabricação de máquinas à vapor para engenhos, moendas, caldeiras, rodas hidráulicas e instrumentos agrícolas. Ganham fama as fundições de Camerom & Smith, de Horácio Urpia, em Aracaju, e do Capitão Francisco das Chagas Lima, em Maroim. Mais tarde iria surgir, em Laranjeiras, a fundição de Otto Jungllausen, alemão que também era proprietário da Usina Bismarck.

 

Como cidade e como capital, Aracaju contou com a visão dos Presidentes da Província, a começar por Inácio Joaquim Barbosa, que, dentre outras coisas,  convocou os poucos capitalistas da época, dando a eles a tarefa de construir casas, para a população oriunda da velha capital, São Cristóvão, e de outras zonas da Província.. Mais que isto, Inácio Barbosa cumpriu o que mandava a Resolução 432, de 31 de julho de 1855, fazendo as despesas com limpeza e demarcação das ruas e praças da cidade, e, por fim, resolveu adiantar, aos funcionários públicos da Província, os salários mensais, em até um ano, para que eles pudessem mudar para Aracaju, adquirindo a casa própria. Ruas centrais –  do Barão (depois Japaratuba, atual João Pessoa), Laranjeiras, São Cristóvão, Maroim, Pacatuba, Itabaiana, e praças, nasceram e cresceram graças ao apoio do Poder Público (Resolução 444, de 26 de agosto de 1856).

 

No âmbito da cultura anota-se a feitura do Hino de Sergipe, com letra de Manoel Joaquim de Oliveira Campos e música do Frei José de Santa Cecília, adaptação de obra erudita, para ser, desde 1836, um símbolo da liberdade política da Província. Em 1838, em São Cristóvão, é criada a Tipografia Provincial, que logo depois passa a editar os pequenos jornais que faziam vezes de folha oficial. Em 1847 é criado e logo instalado o Liceu Sergipense, citado algumas vezes como Liceu Sancristovense, que funcionou até 1855, quando a capital foi transferida para Aracaju. Para atender aos estudantes do Liceu, o seu Diretor e professor Vigário Barroso liderou a criação da Biblioteca Pública, que funcionou numa das salas do velho Convento Santa Cruz, hoje conhecido como  São Francisco. Com a mudança da capital, a Biblioteca foi instalada em Aracaju, percorrendo várias dependências em prédios públicos, até ganhar sua sede, na atual praça Olímpio Campos, onde está funcionando a Câmara Municipal de Aracaju, nova sede na praça Fausto Cardoso, onde está instalado o Arquivo Público do Estado de Sergipe, também criado, pela primeira vez, em 1848, como uma seção da Biblioteca e recriado em 1923, por Graccho Cardoso, extinto em 1926, “por medida de economia” por Ciro de Azevedo, para ser mais uma vez recriado, pelo Interventor Augusto Maynard Gomes, e a sede atual, moderna, construída na continuação da rua Vila Cristina, hoje rua Leonardo Leite. Em 1870, coroando as ações culturais, foi criado o Ateneu, instalado no ano seguinte para ser, pelo tempo afora, um modelo de escola pública, secundária, indispensável à formação dos jovens sergipanos.

 

Foram 50 anos, compactados na densidade dos seus efeitos, desde a Emancipação Política de 1820 e o início do funcionamento do Ateneu, sem dúvida os mais ricos da vida pública sergipana. Atitudes e  lições que  são guardadas pela história, como um patrimônio político, social e cultural dos sergipanos, cuja exemplaridade nem sempre foi correspondida, nas décadas seguintes, ainda no século XIX e por todo o século XX, mesmo que alguns dos governantes ousassem promover ações que ultrapassaram as rotinas da administração.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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