Cambalhotas!

Noventa anos atrás, Dom José Ortega Y Gasset questionava em “A Rebelião das Massas”: Quem manda no mundo?

Hoje, após a derrota de Donald Trump para o anódino Joe Biden, em reflexos mal deglutidos da COVID-19, espera-se que o mundo e a democracia estejam assegurados.

Pelo menos foi assim o propagado por vasto pensamento externado pelos jornais, mundo afora.

Para estes, se Trump fosse eleito, e não o foi, a democracia estaria em risco.

Em risco, todavia, está o catastrofismo exibido pelos formadores de opinião, em pessimismo exagerado, só porque lhes sobra o contemplado em pouco agrado.

E neste desagrado, houve até um pensamento de louvação a Deus por nos ter trazido da China, porque foi de lá que veio, o vírus letal da universal pandemia.

O preito agradecido foi firmado por uma mulher de peito, Jane Fonda, a bela e inesquecível Barbarela, astronauta de belos seios e curvas, hoje vovó, quiçá bisavó, queimando incensos à Deus por nos ter mandado, “providente”, o tal corona vírus.

Justo ao Deus que alegra a nossa juventude, como diz o Salmista, e que dá a muitos a senectude sem maturidade?

“Senectus est moribus”, repetia meu amigo Luiz Lima, reclamando das oiças que lhe falhavam, sendo refutado por meu pai, bem mais idoso que ele, isso do alto de seus noventa e mais anos, enxergando pouquíssimo, mas lúcido e luminoso, que a velhice não é uma enfermidade: “Senectus est vitae”. É vida!

O diálogo bem vale na reflexão sobre o que falou Ortega, simples e claro, como de seu feitio, ele, um homem de muitas claridades, que contemplava uma Europa se degradando em flertes autoritários, precisando crer em algo permanente e reflexivo e que não fosse a desordem, simplesmente.

E que não fosse a simples “rebelião das massas, enquanto radical desmoralização da humanidade”.

Quem manda no mundo? Perguntava.

No tempo de Milcíades, o general grego que venceu os Persas em Maratona, o mundo mediterrâneo desconhecia o além-Indo, oriental, e até ao ocidente pensava-se não ser vadeável a nado, por ser uma terra plana, mas replena de assombros e mistérios como Caríbdis e Cila, reinantes nas gargantas do estreito de Messina.

Não fora ali bem perto, que Ulysses o herói homérico, ao voltar da Guerra de Tróia para a sua Ítaca de muitos amores, fora atacado por Cila e Caríbdis, entre a Itália e a Sicília, perdendo navios e homens, por eles devorados, sendo poupado apenas porque conseguira agarrar-se a um pequeno arbusto que o permitiu safar-se a muito custo?

Não havendo mais o desconhecido como dantes, até a Idade Moderna, virou “nome cinzento e inexpressivo de uma hegemonia europeia” que quis se impor no mando e no comando da opinião pública.

Um tempo em que valia repetir de Talleyrand de Perigot o conselho ao Napoleão Bonaparte, imperador: “Com as baionetas, sire, pode-se fazer tudo, exceto uma coisa, sentar nelas.”

E mandar, infere Ortega Y Gasset, por corolário: “mandar  não é gesto de arrebatar o poder, mas seu tranquilo exercício”.

Em suma, “mandar era se sentar no trono, na cadeira, no curul acento de marfim destinado aos magistrados romanos, ou no banco azul reservado ao parlamento espanhol”, ao seu tempo.

E no aqui e agora, por quê não acrescentar; a cátedra do mestre, do professor, do pedagogo, do protestante profitente, se “mandar é menos uma questão de punhos que de nádegas?”

E de salário, dirão alguns, porque bem cabe por acréscimo, mesmo em recuos de piso, por eco e équos de contra-pisos!

Ah, salário! Quantos, pisos e sobre-pisos olvidados!

Quantos tetos, subtetos e fura tetos! E haja tetos sem cobertura e cumeeira de telhados!

Quantos auferem aos montes, pouco olhados, milionários escondidos, em seu gozo masturbado, por estéril, mas não conseguem amealhar o respeito do mestre-escola simples, que só instrui o mundo e o educa!

Aqueles outros já possuem a sua paga; o seu encanto todo estragado em eca ruim, por pior cheiro.

Mas, querendo um outro aroma suscitar, falo do mestre agora, porque Ortega não denunciou a seu tempo os nossos tão decantados “operário da educação”, hoje instigados a despir-se da beca e proficiência, porque sensíveis e inscientes estão bailando ao canto de sereias sindicais, balada que os enleia, aniquila e emascula, unidos sem ser fortes, coletiva e consentidamente derrotados, o que lhes deveria ser doloroso!

Porque ao falar tanto em decadência da docência, muitos chegam a se achar assim, de fato e de direito!

Daí eu repetir uma passagem citada por Gasset, de exemplar puerilidade como o mundo se apresentava no seu tempo, e agora, sobremodo: “Na escola, quando alguém avisa que o professor saiu, a criançada se levanta e bagunça. Cada um sente a delícia de escapar da pressão que a presença do mestre impunha, de se livrar do jugo de normas, de virar de ponta-cabeça, de se sentir dono do seu destino. Mas uma vez extinta a norma que fixava as ocupações e as tarefas, a criançada não tem uma função própria, uma ocupação formal, uma tarefa com sentido, continuidade e trajetória, acaba que só pode executar uma coisa: a cambalhota”.

E é isso que estamos a ver: cambalhotas!

Cambalhota no noticiário, refletindo uma eleição que devia ser vista como simples alternância de poder, mas que se apresenta como mudança perigosa e insondável, a requerer cabriolagens e reviravoltas mundo afora, aqui sobremodo, porque Bolsonaro é o que não poderia ter sido, em tantos males denunciados e pouco compreendidos.

Compreender para quê, se a notícia publicada anima os povos-massa resolutos a rebelar-se contra os grandes povos criadores, minoria de estirpes humanas que organizaram a história?

Aos ecos sequentes à denuncia de Dom Ortega Y Gasset, os povos enveredaram no autoritarismo, com Hitler, Mussolini, Stalin, Franco e Salazar, e por aqui com Getúlio e sua ditadura de bombachas sorridente.

Agora, há uma falta cada vez maior de ordem, de comando, e de mando, porque se as democracias estão em crise, e a COVID chegou como paga, a praga continua, sem vacina, estimulando o texto que alucina.

Se a eleição americana avessará o mundo de ponta-cabeça, por aqui já se bota na cabeça enquanto velha mania republiqueta de macacos e bananas, usar de qualquer treta para dar um golpe-de-estado, só mais um, para repeti-lo mais uma vez.

Que não continuemos a dar cambalhotas, digo eu na nossa circunstância, ecoando aquela do, jamais esquecido, Ortega y Gasset, por sempre lúcido!

Que as cambalhotas não mandem no mundo!

E que cheguem o Biden, não tão desejado, e sua Vice, Kamala Harris, em melhor cabala almejada, enaltecida e exaltada por ser mulher e aguerrida, ativista como Fonda, e até Dilma, guerrilheira, que nos foi leme por seis anos!

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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