Recebi uma mensagem da Frente Parlamentar Mista dos Direitos do Contribuinte, enviada por frenteparlamentar@edsonsiqueira.com.br, intitulada “Aumento de impostos são inconstitucionais”.
A temática da nota é pra dizer que os aumentos do IOF, Imposto de Operações Financeiras, e a CSLL, Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido, anunciados pelo governo federal para recompor a arrecadação perdida com a derrubada da CPMF, Contribuição por Movimentação Financeira, são inconstitucionais.
E a inconstitucionalidade foi pedida pelo DEM, o partido dos Democratas, isto é o ex-PFL, um ex-muita sigla, a perder de vista no tempo e no espaço dos últimos quase cinqüenta anos.
E aí eu me lembrei de uma frase de Sobral Pinto, o velho advogado de presos e perseguidos políticos. Não a sua peroração retórica invocando a lei de proteção aos animais para libertar Luís Carlos Prestes da cadeia. Mas a sua frase mais xistosa, contestando o Presidente Ernesto Geisel que queria discorrer sobre uma democracia relativa, uma democracia à brasileira: “Não existe democracia à brasileira, existe peru à brasileira”, disse Dr. Sobral.
Uso tal frase, porque entendo que ainda não sabemos a democracia que queremos. E assim o peru e a farofa brasileiros se misturam em confusão com a nossa democracia.
Senão, vejamos.
Temos uma infinidade de partidos, uma verdadeira miscelânea de siglas com ideologias e pregações indistinguíveis. Ninguém sabe o que são, o que desejam, e o que representam. Mas, muita gente acha que é bom assim, esta misturada louca, andando pros lados como siri, agarrando descerebradamente tudo ao derredor com muitas unhas e garras, dificultando a gerência do país, suscitando tudo, sobretudo achaques e “mensalões”.
Não bastando esta infinidade de siglas, surgem também, em geração própria as muitas frentes, como esta tal Frente Parlamentar Mista dos Direitos do Contribuinte, que é tão organizada que descobriu o meu e-mail, e está me enviando suas mensagens, entupindo minha caixa postal eletrônica.
E não podemos culpar a eletrônica. Melhor seria culpar esta nossa gnomônica república presidencialista, com gnomos presidentes, governadores e prefeitos fragilizados nos seus respectivos parlamentos. E ainda dizem, em discursos demagógicos, que temos uma presidência imperial.
Imperial, pelo porte e magnificência, é o pleito memorável em que os nossos Presidentes da República têm sido eleitos, com direito a votação em segundo turno, em maioria absoluta inclusive, só para confirmar legitima e insofismavelmente o eleito, no entanto na mesma eleição já sabemos quem é o congresso que lhe retirará todo o poder e a capacidade de governar.
Os presidentes, portanto, se tornam uma espécie de gnomos, por miúdos e desprovidos de força, mal conseguindo segurar os tesouros e os cargos que lhe querem tomar.
E assim os “aliados” são adquiridos nas negociações posteriores às eleições, nunca muito claras e sempre denunciadas de suspeições.
De modo que a democracia à brasileira se confunde com o peru à brasileira também nisso, com seu canto bobo, o seu vôo rasteiro e a sua farofa de muitos miúdos. Porque com tantas rasteiras e asneiras o peru e a democracia pátrias, não se confundem com o de outras pátrias, embora ali tenham as mesmas penas, características e excelência de voz. O que muda é o “à brasileira”, com farinha e miúdos de galinha.
E há quem diga que tudo vira uma “galinhagem”, enquanto outros falam de “rapinagem”, coisa de raposas ou pilantragens, ou de bandido nunca punido.
Como seria bom se tudo isso fosse banido, e que ali não se falasse tanto de corrupção e de bandidos.
Mas, se é difícil extirpar o malfeitor e o mau gestor, acho que uma melhoria substancial poderia ocorrer se as eleições majoritárias acontecessem antes das legislativas. Em muitos países é assim.
Na França, por exemplo, após sucessivas crises nas duas repúblicas pós-grandes guerras, com governos fracos oscilantes ao sabor de maiorias inconsistentes e agitações sucessivas, de
Concebida segundo o pensamento do General Charles de Gaulle, herói de guerra, e aprovada por um esmagador referendum, a França tem nesta V República um regime misto, conciliando o melhor ou o pior dos regimes presidencialista e parlamentarista.
Ali o Presidente é eleito como aqui, em pleito universal direto e em maioria absoluta, mas é o congresso quem elege o 1º Ministro e o seu ministério. Havendo inclusive a figura da coabitação, isto é, o Presidente e o 1º Ministro de partidos distintos, dividindo o governo. Para isso as eleições acontecem de forma majoritária nos distritos, bem diferente daqui onde o pleito é proporcional e tudo é permitido como a promiscuidade de coligações e mudanças partidárias sem qualquer compromisso com o eleitor.
O presidente Nicolas Sarkozy, por exemplo, foi eleito em 2º turno com 53,06 % dos sufrágios em seis de maio de 2007. Assumiu a presidência dez dias depois, a 16 de maio, nomeando seu Primeiro Ministro e todo o ministério. Entre 14 e 18 de maio foram inscritos os candidatos ao legislativo. No dia 21 de maio foi aberta oficialmente a campanha eleitoral. O pleito se deu em dois turnos, nos dias 10 e 17 de junho, precisamente.
O resultado final concedeu uma maioria a Sarkozy de 343 cadeiras contra 234 no parlamento. O partido de Sarkozy teve uma maioria maiúscula de 320 cadeiras enquanto o partido socialista, seu maior opositor fez 204 deputados. Esta maioria confortável por certo permitirá o seu governo sem maiores restrições no parlamento.
Aqui nunca foi assim. O Presidente Lula, por exemplo, foi eleito no 2º turno em 2006, com mais de 60% dos votos válidos, no entanto o seu partido o PT fez apenas 83 deputados num total de 513. Não é à toa que Lula tem que cooptar muitos deputados para poder aprovar alguma coisa na Câmara. Sem falar no Senado que ainda é pior.
O mesmo se deu com Sarney, Collor, Itamar e Fernando Henrique. As coligações que os elegeram não representavam maioria no parlamento, daí as célebres e notórias alianças, e as sempre discutidas adesões.
Agora mesmo o Governo Lula foi derrotado na CPMF. Sua base aliada pelo jeito quis mais do que lhe foi prometido, ou então, e isso eu não acredito, tudo foi por amor febril ao Brasil.
Com desamor sempre vil à História do Brasil, canta-se como o canto da perua; um só: gluglu!
Vivemos sempre em crise. Todos os governos são corruptos ou ineptos.
Messias, nós os fazemos muitos. Salvadores da pátria também. Mas, é sempre assim, repetidamente o canto é um só: gluglu!
Quando o país melhora os seus níveis de desenvolvimento, progresso e ordem, surge um incendiário querendo mudar tudo. Igual a estes que derrubaram a CPMF. E aí o país volta a ser miúdo e carente de tudo com desemprego e inflação.
Quando eu era menino todo político de oposição subia pra colina do 28º Batalhão de Caçadores pra pedir providências de suas querências ao coronel de plantão. E então a tropa tomou gosto e foi à rua. Saiu derrubando tudo que era político, cassando muita gente, tomando gosto do arbítrio e do poder.
Só aconteceu isso porque nunca tivemos instituições políticas sérias e duradouras.
Hoje tudo isso passou. Dizem que estamos vacinados de golpes e ditaduras. Será? Tenho minhas dúvidas quando vejo estas tais “frentes” (existem mais de cinqüenta frentes na Câmara) ,querendo ser mais que o povo, enganando-o mascaradamente no multi-variado universo partidário.
O que posso afirmar é que o Governo Lula vinha bem. Mas a CPMF virou ponto de discórdia de gregos e troianos.
Agora querem impedi-lo de recuperar o prejuízo causado com esta perda de arrecadação. Querem que seu governo fique a míngua. Que saia cortando despesa. Só que ninguém diz aonde, porque é difícil cortar qualquer despesa.
Na verdade, já se sabe o objetivo; cortar na pele do funcionário público e dos aposentados e acabar com a bolsa-família, fuzilar na parte mais fraca. Muita gente tem raiva dos mais fracos. E a oposição pensa conseguir o poder botando todo mundo protestando na rua, babando furor e paralisação.
Bom seria que a nossa constituição previsse a antecipação de eleições, como é o caso da França! Renovaríamos o congresso e até o governo podia mudar.
Mas, se a constituição foi feita norteada no interesse dos políticos, como pensá-la diferente?
Enquanto isso, preferiram usar um referendo para ditar uma política de desarmamento que torna o cidadão refém de bandidos.
Mas, tudo isso é história. É assunto de memória. E aí tem que permanecer, afinal ninguém progride andando de costa, e não adianta brigar com os fatos; só os lamentar.
Agora, que o Brasil estava indo muito bem com a CPMF. Isso estava. Se piorar, não culpemos a nossa democracia. Não fica bem falar mal dela.
Peçamos desculpas também aos miúdos do peru e a sua farofa. Estes é que não têm culpa de nada.
O problema é que só sabemos cantar gluglu!!! Ou então, dançar a dança do siri.