Carta para a Boba

Aracaju, 05 de março de 2010

 

 

Boba,

 

Perfídia. Você até prestou para alguma coisa, mas hoje, depois das suas últimas ações percebi que não, como as demais, você também não tem caráter nem tampouco consideração. Mas minha cara, consideração é algo digno dos nobres e seu jovem coração de 21 anos cresce em seu peito, brotando em meio ao despeito por eu ter acabado nosso amor. Pensei que você tinha superado isso!

Acabamos do melhor jeito possível. Sendo amigos. Nos cumprimentando aos poucos, nos poucos lugares que nos encontrávamos. Não existem barreiras sociais quando o assunto é cultura, e nunca olhei para você de outra forma, a não ser com amor. É engraçado como essas coisas mudam, num patamar de ações e reações que a vida nos impõe, e o amor dá vazão ao nada, né? Se me perguntassem há algum tempo se existia a mínima vocação para realizar outra vez nosso amor, certamente diria que ainda restava um sentimento pequeno, porém bonito. Mas você, com sua sede de me atingir, mais uma vez fez merda. Na verdade falou bobagens e sem se importar em macular meu nome espalhou mentiras, que provavelmente devem ter algum fundo de verdade, nem que seja para você própria.

Olha só, o lixo antes de virar lixo tinha serventia. Muitas vezes não jogamos tralhas fora, não é totalmente por apego, mas porque consideramos que esses trecos, quem sabe um dia, possam voltar a ter utilidade para nós. Amor quando acaba não necessariamente tem que virar ódio, pode se transformar em amizade. Muitos casais, quando se separam permanecem ligados, extra laços de filhos, mas porque desejam cultivar sementes. Ninguém sabe o dia de amanhã, Boba. Por isso tínhamos nossa relação acabada, porém sã, o que provavelmente não deixava você satisfeita.

Sei que não fui o mais honesto dos homens, porém nunca lhe traí, nem tinha motivos para tal. Nosso término, como cansei de repeti aos prantos, olhando para você, veio no momento certo porque tínhamos caminhos distintos, coisa que pesavam muito quando se tem uma diferença de dez anos de idade entre duas pessoas. Você era jovem demais para entender que em meu peito, o amor já se consagrava algo distinto e significativo. Não queria, nem nunca quis um amor jovial de novela vespertina para preencher lacunas vindas de traumas familiares. Meu amor era algo totalmente filosófico e dentro da poesia cabia discutir a relação da mesma forma em que ficávamos dias, noites transando compulsivamente como dois maníacos.

Tenho desses distúrbios de sensações de prazer contínuo. Você não entendia que mesmo te amando, chegaria o momento em que não poderia mais pegar em suas mãos e lhe encaminhar para vida, porque aí seria fazer o papel de seu pai, e não queria isso para não acabar com a excitação. Quando vi que não tínhamos mais chance, que você precisava de um pai, percorri um labirinto em minha cabeça para lhe mostrar que o melhor era cada um seguir seu caminho.

Claro que depois, como em todo namoro, quis reconquistar você, mas percebi pouco tempo depois que isso era capricho e não mais amor. Quando me vi tendo de aguentar seus amigos, todos chatos, diga-se de passagem (salvo umas duas exceções), e tendo de fazer o jogo do contente para mostrar-lhe que estava disposto a lhe ter de que forma fosse, acabei me perdendo de mim. Mas capricorniano que sou, pés no chão, total, reconsiderei que nosso término foi uma atitude adulta e por tempo, irrevogável.

Claro que percebi logo após meu silêncio, meu exílio, que você estava mandando seus recados de forma direta, através dos meus amigos – que mesmo indispostos sempre davam um jeito de me contar suas últimas grandes novidades juvenis. Um tédio total, reconheço hoje, porém tudo fazia parte do seu pacote: estou-bem-sem-você-e-com-minha-vida-progredindo. O que você jamais compreendeu é que, mesmo de longe, afastado, eu torcia por sua felicidade, vibrava na minha por todas as suas vitórias: o primeiro trabalho, o computador novo, as viagens, tudo era motivo de felicidade para mim. Só não sabia que você queria mais. Que você queria toda a minha atenção para ti. Isso não existe, é doença!

Boba, uma coisa é servir de alvo para que eu vislumbrasse em você um significado bom, outra coisa é querer se infiltrar em minha vida, de forma direta, através de quem é do meu convívio. Você não compreendeu que existe uma linha entre eu (seu ex) e você, com sua vida e seus contatos íntimos particulares?

Você não compreendeu ainda que ficando com algum amigo meu, em nenhum momento vai conseguir seu propósito que é me atingir e me mostrar que é capaz de fazer parte de minha vida, mesmo que seja de forma desonesta, na surdina? Minha cara-ex-amada, Boba, se alguém do meu círculo de amizade ficar com você será simplesmente pelo súbito desejo de lhe comer e pronto. E você passará de minha ex para a maníaca-que-fode-com-os-amigos-dele-para-atingi-lo-numa-tentatova-idiota-de-se-fazer-perceber. Nada mais que isso, até porque nenhum dos meus amigos até hoje se mostrou capaz de querer amar você. Inclusive, até já me confidenciaram certo nojo por sua pessoa.

Claro que deva existir algum que adore se aproveitar da carniça, porque como seres humanos que somos, muitas vezes queremos o que para o outro já reluziu. Mas garanto que seja muito difícil, algum dos meus amigos se interessar por você verdadeiramente e ainda que isso aconteça, jamais deixaria que você surtisse efeito sobre minhas amizades. Claro que terei que levar em análise as atitudes deste tal amigo e em que momento isso foi construído.

Mas por que espalhar que estou chateado por você ter ficado com um amigo meu? Minha Boba, melhore! Não é porque você comprou um computador, trabalha para pagar suas parcelas e tem internet que você será como eu. Isso é loucura. Não é porque você pode transar com quem quer que seja, dentro ou fora de um carro, num estacionamento qualquer que você estará perto de mim. Isso é loucura. Não foi porque durante um ano e seis meses a gente se relacionou e você leu todas as minhas anotações e histórias passadas, que você tem por obrigação de fazer tudo igual ao que estava escrito em meus papéis. Calma, muita coisa ali era ficção e você em meio a sua imaturidade não separou o grão e a palha. Ah, quando escrevo aqui ficção não signifique que a base não seja verdadeira. Nunca menti para você, Boba.

Olha só, vamos combinar o seguinte: Nem eu falo mais em seu nome, nem você tenta me imitar ok? Meus amigos, pelos menos os sinceros, são as coisas mais importantes que tenho na vida. Claro que quando cito a palavra sincero, vejo diminuir drasticamente a lista de amigos, mas aí já são outros poréns… e não lhe importa em nada. Boba, procura suas próprias histórias, cria seus próprios contos e me deixa em paz. Sempre evitei ter pena de você, porque é um sentimentozinho banal e traiçoeiro, mas depois do seu último recado fiquei recalcado sim, não por ciúmes (porque você conseguiu destruir as boas lembranças que tinha de você), mas por ver o quanto um ser humano pode descer tão baixo para tentar chegar naquilo que lhe interessa.

Boba, olha só, procura envelhecer dentro de padrões estéticos legais, lendo, estudando, melhorando como pessoa, não desiste de fazer um curso superior. Ser secretária um dia cansa. Não pense você que transando com todos os meus amigos chegará a algum lugar em minha vida. Nada! Isso é bobagem, ok? Não tem aonde chegar porque a partir de hoje lhe tirei totalmente de minha vida.

Pois é, está vendo? Agora estou com pena de você e isso me deixa chateado e envergonhado ao mesmo tempo. Putz, você fudeu com tudo. Tenho nojo de você também. Não desejo nada de ruim para você. Apenas não quero mais saber de sua presença. Em nada me importo mais com sua vida. Acabou definitivamente para mim!

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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