Costumes reprimidos em Sergipe

O Presidente da Província de Sergipe, Manoel da Silva Lisboa, o primeiro a mandar para a Assembléia Provincial, instalada em 1835, uma Fala com o Relatório de todos os atos do Governo da Província de Sergipe, encerrando a Primeira Sessão da Primeira Legislatura da Assembléia Provincial, em 4 de março de 1835, deixou algumas observações curiosas sobre costumes sergipanos, reprimindo-os, como se verá a seguir. Uns estão contidos no texto da Fala, outros são documentos formais do Governo, dirigidos a autoridades locais.

         O primeiro, sobre a forma de cumprimentos entre amigos e parentes de sacristãos, que deixa em suspense uma “intimidade” condenável, ele diz:

                   “Presenciei ontem nesta cidade (São Cristóvão) a singular maneira

                   de saudar-se os parentes e amigos dos Sacristães e Confrades

                   (quando depois de alguma ausência regressam a ela) com os mesmos

                   sinais com que os Fieis anunciam as funções do Culto Divino, ou

                   tributam os respeitos exclusivamente outorgados aos Prelados em

                   suas Dioceses; vindo-se deste modo a equiparar-se um ato de

                   recomendada veneração a outro de particular e temporal regozijo.

                   Convencido de que essa inconsiderada prática de cumprimentar a

                   amizade do assaz repreensível abuso das coisas pias, e da

                   intolerância estranhável da autoridade Eclesiástica desta Cidade;

                   Recomendo por isto a V.S. que desde hoje se mande proibir como

                   Atos inedificantes e irreligiosos. Palácio do Governo de Sergipe, 26

                   De março de 1835. Manoel Ribeiro da Silva Lisboa. Ao Senhor

                   Cônego Vigário Geral desta Província.”

         O segundo, mais generalizado, trata dos banhos públicos. Eis o texto:

                   “Sendo constante o escândalo, com que em ofensa da Moral Pública

                   costumam banhar-se nuas nas fontes desta Cidade pessoas de um e

                   outro sexo; para impedir semelhante abuso tão repugnante, e contrário

                   ao pudor, que naturalmente distingue todo homem bem educado e

                   constituído no estado social, ordeno a V.M. passe já e já a dar todas

                   as providências ao seu alcance, a fim de se fazer de ora em diante

                   efetiva a Disposição do artigo 280 de Código Penal, sobre os que com

                   manifesta violação das leis e costumes menoscabando a ordem desse

                   Juízo a respeito que dever-se-á fazer pública, por Edital no Distrito da

                   sua compreensão. Deus guarde a v.m. Palácio do Governo de Sergipe,

                   28 de abril de 1835. Doutor Manoel Ribeiro da Silva Lisboa. Ao Senhor

                   Juiz de Paz do Distrito da Matriz desta Cidade.”

         O esforço moralizante da autoridade provincial fluía em novos atos, com os quais pretendia corrigir os desvios da população sergipana, principalmente aquela residente na Capital, São Cristóvão.

         Tratando da educação, diz o Presidente Lisboa:

                   “O Presidente da Província desejando promover quanto em si é, e por

                   por todos os meios ao seu alcance, a civilização da mocidade

                   brasileira, na parte que foi confiada à sua vigilância e solicitude,

                   ordens aos Mestres e Mestras da Província por nenhuma forma

                   consinta que freqüentem a sua aula, estudante algum descalço, ou em

                   camisa, fazendo os maiores esforços a fim de que se apresentem ao

                   ensino com a mesma decência, asseio e alinho, que lhe permitirem

                   suas faculdades domésticas; e da mesma forma que faça por extirpar

                   da sua escola o repreensível abuso de estudarem os meninos suas

                   lições entoando ou por modo de cantoria, costume altamente

                   reprovado pelos preceptores de melhor nota: o que cumpra na forma

                   determinada, e conforme se deve esperar do seu zelo pelo serviço

                   público. Palácio do Governo de Sergipe, 14 de fevereiro de 1835. Doutor

                   Manoel Ribeiro da Silva Lisboa.

         Ele trata, ainda, de educação, quando proíbe a circulação, nas escolas, do folheto Fonte da Verdade, mandando usar o Catecismo de Montpelier para o ensino da Doutrina Cristã. O Presidente Lisboa tratou de Feira e tocou em outros pontos, antes de ser transferido para presidir a Província do Rio Grande do Norte, sendo assassinado, em Natal, num crime pouco esclarecido. Seus atos, Falas, Relatórios, que são dos primeiros tempos de Sergipe independente, servem ao conhecimento crítico, ajudando na compreensão dos fatos que marcaram a vida provincial e integraram o processo civilizador e cultural, ao qual é possível recorrer, no sentido de melhorar e ampliar o entendimento do cotidiano dos sergipanos.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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