“Cuidado! De “inho” em “inho”, você pode perder o caminho”.

O EFEITO SEDUTOR DO DIMINUTIVO

 

 

 

“Cuidado! De “inho” em “inho”, você pode perder o caminho”.

 

 

 

Quando viajo de Sergipe a Salvador pela bucólica “Linha Verde”, sempre paro num posto de combustíveis que fica na beira da estrada, no Município de Massarandupió.

 

Nesse posto há um restaurante, uma lanchonete. E, como o espaço é muito grande, o proprietário coloca à venda muitas coisas: artesanatos, frutas da região, feijão verde, sapatos, chinelos e sandálias feitas de couro cru e produzidas ali mesmo, nas redondezas tudo exposto em grandes bandejas de cipó.

 

Estava eu observando aquelas novidades e parei em frente ao balaio dos calçados. Ao meu lado um rapazola, com sotaque bem baiano, com uma latinha de cerveja na mão, pegou um sapato, flexionou-o pra lá, dobrou-o para cá e exclamou: deve ser muito bom para tomar uma geladinha no final de semana.

 

Assustei-me! Fiquei curioso e indaguei dele. Como? Você coloca uma geladinha dentro do sapato e bebe?

 

“Não”. Respondeu ele. E, bem calmamente, me explicou: Não, meu rei, é o seguinte: abre-se uma cervejinha bem geladinha, coloca-se este sapatinho no pé e…”.

 

Nossa, imaginei. Que ginástica!

 

Porém, não é bem isso o que gostaria de evidenciar.

 

Também, nada contra o gentil adolescente que, na verdade, sequer deveria estar usando bebida alcoólica.

Mas, mesmo assim, foi muito educado ao esclarecer-me tão enredada situação.

 

O que quero mesmo é evidenciar o quanto representa, no nosso cotidiano, o uso do diminutivo e a sua força sedutora. Sempre o usamos, às vezes até sem pressentirmos, quando queremos, sub-repticiamente, elevar o valor de algo ou alguém.

 

Por exemplo: quando verdadeiramente gostamos de uma pessoa, manifestamos o nosso enternecer com palavras carinhosas como: amorzinho, queridinha, filhinha, mãinha, etc.

 

Porém, utilizamos ainda quando queremos menosprezar, esnobar ou ridicularizar alguém ou alguma situação: quem fez esta besteira? “Foi o rapazinho aí”. Quem é aquelazinha ali? “Ela é uma mimada, filhinha de papai”…

 

Além, é claro, das alcunhas jocosas de: “patricinha”, “mauricinho”, “essezinho”, entre muitas outras.

 

O efeito sedutor do diminutivo não demorou a ser percebido como forma de vender produtos das mais variadas espécies.

 

Contudo, na sua grande maioria, os produtos tidos como politicamente incorretos, são os que mais se apropriam deste viés publicitário para subliminarmente aparentar coisa boa. Entre eles os que mais se destacam são os relacionados às bebidas alcoólicas, alucinógenos e similares.

 

Os marqueteiros tentam, e conseguem com muita facilidade, demonstrar, diminutivamente esses produtos dando-lhes um sentido mais intimista, carinhoso e atraente, realizando, assim, uma inversão, transformando o deletério em salubre e operando abrandamento dos seus maléficos efeitos.

 

Pense bem. Você escuta com freqüência convites como estes:

 

“Fulano, vamos dar uma saída, tomar uma caipira”?

 

Ou: Vamos dar um “rolé”, tomar um “chopão”, uma “cervejona” ou um “uíscão”?

 

Ou, ainda, vamos dar uma saída, passar num bar, escutar uma música, tomar uma gelada, dar uma dançada?.

 

É claro que não. 

 

Quando há este tipo de convite para as farras da vida, para quem faz, é claro, acontece mais ou menos assim:

 

Fulano, vamos dar uma saidinha, passar num barzinho, tomar uma caipirinha, escutar uma musiquinha, dar uma dançadinha…

 

E, por aí vai. De diminutivo em diminutivo, chega-se ao longe. Ou ao nada.

 

O alerta fica. Cuidado com alguns sonoros e diminutivos termos que podem, ilusoriamente, levá-lo a situações irreversíveis.

 

Os grandes viciados e alcoólatras começam tomando “umazinha”, numa “festinha”, ou quando dão uma ingênua “saidinha”, passam num “barzinho” e tomam mais um “chopinho”, um “uisquinho”…  E, de “inho” em “inho”, quando vê, já perdeu o caminho. Não sabe mais voltar.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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