Dandara Vive!

Vivemos uma guerra. Você não sabia? Claro que não, você só olha a beleza que o insta prega pra você, seu otário de smartphone! Todo dia tem uma criança morta na porta de um habib's só porque pediu comida. Guerra é isso, é matar uma criança só porque ela “incomodou” alguns alguéns. Toda hora tem uma transexual morta servido de chacota e sendo filmada para que nunca mais se esqueça de que aqui, no Brasil, “viado bom é viado morto”. Viado em pó, “poeira de nada”, “sujeira da sociedade!”

Para que eu escreva aqui, para que você apresentador de televisão possa usar seu terno justo e muita maquiagem na cara, para que ela chegue ao melhor cargo na empresa, para que ele possa ser prefeito ou governador de qualquer lugar, para que ela possa gritar na rua que ser sapatona é legal foi e é preciso que muitas Dandaras morram a cada segundo. Mas o que você tem dado em troca do sangue de Dandara? Apenas seu silêncio e algumas curtidas no post! Não precisa ser gay, bi, trans para comprar briga desse porte, basta abrir o zap e esperar que seu pacote de dados mediano abra o vídeo. Tá lá e pode ser compartilhado e é: Dandara morreu, virou meme e foi compartilhada – foi rasgada e seu sangue escorre e me cobre enquanto escrevo isto aqui também.

Poderia ser minha amiga, minha irmã, eu e você, mas ainda a seta da boca do inferno não foi apontada pra nós. Ainda não, mas poderá acontecer a qualquer momento. Eu, Dandara que sou, morri ali sendo levada no carrinho de mão só Deus sabe pra onde. É preciso que nós saiamos da frente dos computadores e passamos a cobrar respostas de quem está ali sentado, suando o rabo, fazendo leis sem utilidade nenhuma na prática. Homofobia precisa virar crime hediondo, precisa ser entendida como a forma de crime mais grave possível. Enquanto não é… assinamos abaixo-assinado digital sem serventia de porra de nada!

Dandara pediu para morrer, você pode dizer, mas saiba que seu silêncio cairia melhor neste caso. Não pense assim! É pequeno e confortável. Não se justifica a morte de outra pessoa só porque ela se envolveu com x ou y. Ninguém tem o direito de usar pedras, paus e armas para matar ninguém. Se no Brasil, diariamente, várias transexuais, gays ou sapatas são mortas é justamente porque pessoas como eu e você achamos coisas demais sobre os “possíveis perigos em que tais pessoas se meteram” e esquecemos que não, não é por aí… o fluxo de pensamento precisa partir de que o outro não tem o direito, jamais, de matar o outro. Vivo uma guerra e não estou pronto pra lutar (ainda).

Evitei ver Dandara sofrer, mas foram tantos vídeos compartilhados que preferi olhar e senti o que ela passou. Claro que sem muito sangue envolvido, nem dor propriamente dita. É fácil ser Dandara pela tela do meu celular, quando sei que trabalho pra pagar minhas contas e posso emitir minha opinião sem ser atingindo por um tiro (ainda). Ser Dandara na vida real é mais punk, exige coragem de sair pra vender aquilo que se tem, seja o sorriso, o cu ou a boca/ dar a cara a tapa pra sociedade apontar, rir, bater e matar. Dandara não pediu pra morrer, ela é vítima. Ela foi vítima. VÍTIMA! e por mais que todos os meus amigos viados engrossem a voz pra dizer que “deu vacilo”, “se envolveu com héteros”, eu defenderei Dandara porque antes de emitir um comentário assim, é preciso saber ninguém tem o direito de tirar a vida de ninguém, ninguém tem esse poder. Mas emitamos nossos frágeis pronunciamentos de redes sociais, postando Dandara em nossas timelines para que ela sirva de exemplo, de que não se deve se envolver com héteros. Dessa forma, somos a pedra que atingiu Dandara, somos seu último suspiro… só estamos reproduzindo o modus de vivência do hétero assassino. Perceba isso, amigo viado, você é a bala que mata Dandaras, Jenniferns, Patys, Jaimes, Lindas, Marias, Madona (com um n só) e afins. Você é a faca que corta!

A pior raça que pode existir de gay é o gay intelectualizado com smartphone na mão, que, por não ser mais apontado na sociedade, acha que tem direito a alguma coisa. Você não tem direito, “amigue”! Apenas te toleram pela sua família, pelo status comprado, pela roupa que você pode comprar ou a conta do restaurante fino que saiu no jornal como o melhor de todos, no último mês. Você é como o negro rico, que virou branco quando a conta bancária inflou. Só é aceito porque pode comprar essa aceitação. Nunca se engane, se eles pudessem, você não teria espaço e estaria na cozinha servido de comida para o patrão e seus filhinhos (viados jamais assumidos), estaria apenas maquiando a dondoca no salão três estrelas, estaria sendo bicha da noite pra dar por uns trocados. Eles não toleram você, eu, nem ninguém que pense diferente, que seja diferente (incluindo negros, índios, afroreligiosos).

O Brasil é o lugar que mais mata LGBT no mundo.
O Brasil é o lugar que mais mata LGBT no mundo.
O Brasil é o lugar que mais mata LGBT no mundo.
O Brasil é o lugar que mais mata LGBT no mundo.
O Brasil é o lugar que mais mata LGBT no mundo.

Não adianta escrever isso e nada mudar. Não adianta saber disso e matar. Não adianta nossos políticos nada fazerem e você escolher o pior dos piores para te representar. A morte de Dandara traz muito mais do atual Brasil que você nem pode imaginar. Traz a triste notícia de que você, enganado pelo mundinho rosa que o cerca, será a próxima vítima. Se me perguntarem se tenho medo de morrer, respondo no ato, gozando: já morro todo dia, quando uma Dandara é morta, eu morro junto. Não tenho esperanças de melhoria em nada no Brasil. Só vejo o pior se aproximando. A única coisa que posso fazer é escrever, demonstrar em minhas ações que não estou satisfeito, que não faço parte dos que matam. A minha luta não é pra não ser morto, mas sim pra não matar Dandara com o meu silêncio.

Dandara Vive!
Dandara Vive!
Dandara Vive!
Dandara Vive!
Dandara Vive!
Dandara Vive!
Dandara Vive!
Dandara Vive!
Dandara Vive!

E aí lembrou da Madona (preta, pobre) que vivia pelas ruas de Ará? Ela também morreu por pedradas, até hoje um crime sem solução. E quem vai cobrar por um corpo sem luxo? Madona morreu apedrejada. Jesus também não foi apedrejado. Eu continuarei vomitando (palavras de medo) sempre que uma Dandara morrer. Vomitarei minha verdade, vomitarei o que acredito, farei parte de grupos de defesas sim, falarei sobre os que não podem ser falados, sim, mas por que não, queridos? Dandara sou eu também!

Dandara dos Santos viverá em mim, pra sempre!

Vamos pra guerra?

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O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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