Na última quinta-feira (21/02/08), o Ministro Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal, deferiu pedido de medida liminar formulado na Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 130-7, proposta pelo Partido Democrático Trabalhista-PDT, para o fim de determinar que juízes e tribunais de todo o Brasil suspendam o andamento de processos e os efeitos de decisões judiciais que versem sobre diversos dispositivos da “Lei de Imprensa” (Lei nº 5.250/67). Isso porque considerou, acatando argumentação do partido requerente, que a mencionada “Lei de Imprensa” foi elaborada sob a ótica de uma ordem jurídica constitucional (Constituição de 1967 e Emenda nº 01/1969) que “praticamente não tem nada a ver com a atual”, citando precedentes do próprio Supremo Tribunal Federal nessa diretriz. A especificidade dessa festejada decisão do sergipano Carlos Ayres Britto, a meu ver, consiste na sua interpretação segundo a qual, no atual modelo constitucional inaugurado com a Constituição-cidadã de 1988, liberdade de imprensa e democracia são conceitos relacionais inseparáveis, ou, em suas próprias palavras, “irmãs siamesas”. É dizer: os diversos dispositivos da “Lei de Imprensa” são incompatíveis com a Constituição de 1988 não apenas por conta de normas como a do Art. 220 (“A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”) e do seu § 1º (“Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV”), mas também e sobretudo porque incompatíveis com o que o Ministro Carlos Ayres Britto sustenta ser o princípio dos princípios da Constituição: a democracia. Democracia que se apóia em “dois dos mais vistosos pilares: a) o da informação em plenitude e de máxima qualidade; b) o da transparência ou visibilidade do poder”. Pilares esses que somente podem ser eficazes e efetivos na medida em que exista uma imprensa livre e desembaraçada apta para deixar o povo – fonte maior de toda a soberania – qualitativamente informado sobre os meandros do poder. Essa aliás tem sido uma das características marcantes da atuação do Ministro Carlos Ayres Britto, não apenas em sua vida acadêmica, mas também em sua trajetória no Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, em março de 2004 o empresário Law Kin Chong impetrou mandado de segurança no STF pleiteando que fosse negado o acesso de câmeras de televisão, gravadores e máquinas fotográficas de particulares ou concessionárias, inclusive da TV Câmara e TV Senado, nas dependências do Congresso Nacional onde prestaria depoimento à “CPI da Pirataria”, com fundamento no direito à preservação da sua imagem, também assegurada constitucionalmente. Após intenso debate, o STF negou o pedido, e foi exatamente Carlos Britto que proferiu o voto majoritário, destacando-se o seguinte trecho: “Nós estamos vivendo uma Idade-Mídia, por paráfrase com a Idade Média. Nessa Idade-Mídia é natural que tudo venha a lume, porque é próprio da democracia que todos se tomem dessa curiosidade – santa curiosidade – pelas coisas do Poder, pelas coisas que dizem respeito à toda coletividade. A democracia é um regime de informação por excelência e, por isso mesmo, prima pela excelência da informação, e é claro que a informação televisada ganha essa tonalidade de excelência, de transparência. Então, no caso, eu entendo que não houve prejuízo ao direito líquido e certo do impetrante de ver sua imagem subtraída do televisamento direto”. Pois bem, o STF já incluiu o referido processo (ADPF 130-7) na pauta da sessão plenária de hoje à tarde, para fins de ratificação ou não da decisão do Ministro Carlos Britto. A expectativa da sociedade é de que a decisão seja confirmada pelos demais Ministros, até mesmo em decorrência dos precedentes da própria Corte. Cabe agora ao Poder Legislativo cumprir o papel que lhe pertence, qual seja o de encarar seriamente a necessidade de elaboração de uma nova lei de imprensa – que sirva, sim, de proteção de outras garantias constitucionais fundamentais contra eventuais abusos – mas que de modo algum represente embaraço à plena liberdade de comunicação social e de informação, inerentes ao Estado Democrático de Direito.
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