Solitate

Morre uma heroína. Exatamente. Toda a sociedade acadêmica acordou com a tristonha notícia do suspiro da Maior Professora de Língua Portuguesa do Estado de Sergipe, Ofenísia Freire.

Conhecemos a professora de maneira próxima. Não podemos esquecer os almoços em casa de Ofenísia, regados com muita fartura e doces, ela adorava, com sobremesas de bons papos e do humor invejável daquela senhora, que, aos oitenta e poucos anos, mantinha lucidez totalitária para tirar as dúvidas deste humilde e curioso conhecedor da língua portuguesa, a respeito das múltiplas matérias, redação, gramática e literatura e de que maneira aplicar a didática de assuntos aparentemente complexos como partícula apassivadora e indeterminação do sujeito para os meus alunos, no afã de que eles não tivessem as minhas dúvidas. Como fico feliz, faz duas semanas , apenas, que falamos sobre este conteúdo e ao passarmos o mesmo e a facilidade respectiva, os alunos dizem que eu consegui. Eu e Ofenísia Freire.

O legado de Professora Ofenísa é imenso . Transmitiu conhecimentos a várias personalidades sergipanas, dentre elas: Anderson Nascimento, Leonardo Alencar, Albano Franco, João Alves, Antônio Valadares, João Augusto Gama, Francisco Rollemberg, Luiz Antônio Barreto, Gilson Cajueiro, Eduardo Garcia, Clodoaldo Alencar, Professor Fernando Soutello, Vladimir Carvalho, Hunald de Alencar. Na biografia, redundante, de vida, escreveu uma grande história e a própria história sem pretensão, mas como mulher , pensadora, à frente do próprio tempo. Posto isto, a Professora Doutora Ofenísia Freire foi a primeira mulher comunista a concorrer a uma vaga na Assembléia Legislativa como também a primeira a ocupar a presidência da Academia Sergipana de Letras, servindo como alicerce para encorajar outras mulheres sergipanas de porte como Tânia Soares, Lenalda Dias, Ana Lücia e a substituta , competente, Lígia Sales, dentre outras mulheres articuladas que fazem o Sergipe de hoje acontecer.

Indubitavelmente, sentíamo-nos lisonjeados quando chegava ao sábados para tomar um café com a família Freire na Mansão Michel Angelo  e Ela , com voz sutil, porém determinada, dizia ter lido a crônica, isto já aos noventa anos, e explicava que o parágrafo ficaria melhor, a idéia mais enfatizada,  se tivesse operado na construção de maneira tal. Fantástico! Ter privado da companhia da professora e ouvi-la dizer de forma delicada “Dênison, como vai? “ era maravilhoso, pois devemos reconhecer o carinho precioso destas pessoas. Assim, foi-se o corpo; entretanto, continua vivíssima entre os que gostam e sabem a importância da língua portuguesa , não para os concursos e coisas desta esfera, mas para o ser humano poder descobrir a si próprio por intermédio, também, das palavras.

A obra da professora estará sempre presente em estudos, teses de mestrado, inclusive a nossa será sobre a própria, idéia já desenvolvida ,anteriormente, pelo Prof. Doutor Ponciano, na jornada da professora e nos trabalhos desenvolvidos ao longo dos 50 anos de educação intensiva. Em um dos seus grandes artigos “A presença feminina em Os Lusíadas”, presente não só na Academia Sergipana como também em uma das Universidades mais importantes da Europa, Universidade de Coimbra- Portugal- comprova-se a vasta abalização da profissional acerca da análise literária e gramatical da obra.

Com Ofenísia não vão os sonhos de as pessoas amarem a própria língua para , através dela, criar a identidade com o próprio país; ficam todos eles e as críticas , para reflexão, quando a professora dizia da decepção de ver os professores cedendo resumos de obras. Dizia ela “que tristeza!”, acreditem , com a voz de quem tinha autonomia para saber que livros existem para serem lidos e não resumidos. Os ícones, fisicamente, vão, as grandiosidades produzidas por eles ficam. E, agora, professora, em meio a este admirador, aluno/privilegiado/em caráter de aulas particulares, ficam alguns versos, em sua homenagem, por Cecília Meireles “sei que canto e a canção é tudo.Tem sangue eterno a asa ritmada …”

*Solitate = Saudades.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.

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