Desafios para os novos prefeitos: Saúde Pública

Pesquisas antes das eleições indicaram que a saúde pública era um dos assuntos aos quais os eleitores estavam mais atentos. Agora os prefeitos vão assumir e devem definir prioridades e cumprir os compromissos com a população, principalmente em relação à situação da ATENÇÃO BÁSICA OU ATENÇÃO PRIMÁRIA.
Como sanitarista realizando ações de prevenção às DST/AIDS nos municípios, sempre me deparo com situações que me entristecem:
1 – Apesar dos Ministros da Saúde e Educação terem anunciado que as equipes de saúde da família deveriam ir atender nas escolas, sempre quando chego a uma escola para realizar uma palestra, pergunto, por exemplo: Qual o aluno que se vacinou contra a hepatite B? A resposta é a mesma: quase ninguém. E a vacina está disponível nas unidades de saúde. Os ministros se esquecerem de visitar, localmente, as equipes de saúde da família e conhecer as suas dificuldades e desafios, antes de realizarem o anuncio na mídia nacional. As ações de prevenção nem sempre são realizadas na própria UBS, imaginem a equipe sair para as escolas? Poucas equipes conseguem desenvolver ações educativas dentro das escolas, por vários motivos: equipes de saúde da família incompletas (quando tem o médico, às vezes não tem a enfermeira, quando tem a enfermeira, poucas equipes possuem o médico). Outras equipes contam com o médico uma vez por semana ou uma vez no mês; equipes de saúde desmotivadas ou por questões salariais ou por falta de condição de trabalho ou pela falta de apoio dos próprios secretários de saúde. Enquanto as equipes estão incompletas, anualmente, é grande o número de formandos em medicina e enfermagem em Sergipe. Para onde estão indo os formandos?  Só os salários que não atraem?  Os cursos  universitários estão valorizando saúde pública?
2 – Verifico, quando vou a um município ou até mesmo um povoado mais distante, que as pessoas ainda reclamam que um grande problema local é o alto consumo do crack principalmente pelos jovens. Sei que o problema do crack é complexo. Mas não tenho dúvida de que a prevenção chegou tarde tanto na capital como no interior. Os gestores não valorizaram a prevenção e os traficantes tomaram conta. Fato semelhante ocorreu com a Dengue. Os gestores não se preocuparam com a prevenção e os mosquitos tomaram conta das cidades. Hoje o crack é epidêmico. Já que a batalha da prevenção foi perdida, resta agora cuidar de reduzir os danos provocados pelo crack e as drogas lícitas como o álcool.  Os jovens estão consumindo grande quantidade de bebidas alcoólicas, muitas vezes com apoio ou negligência dos pais e das escolas. As meninas estão usando mais bebidas alcoólicas do que os meninos.  Acho que os prefeitos devem colocar como uma das prioridades o enfrentamento ao crack e ao uso abusivo das bebidas alcoólicas pelos jovens de cada município. Observo poucas ações de prevenção com foco no problema do álcool junto aos jovens. As consequências do uso abusivo do álcool já são bastante conhecidas no trânsito, na violência física e sexual e na gravidez na adolescência.  O problema do crack não é uma questão simples, de recolhimento dos usuários. Envolve ações junto às Secretarias de Educação e, principalmente, integração com as Secretarias de Ação Social, Esporte, Ministério Público, Conselhos Estaduais e Municipais, Órgãos de Comunicação e parcerias com Empresas Privadas e a própria sociedade.
3 – Quando investigo um caso de sífilis em gestantes ou em crianças (Sífilis Congênita), verifico onde ocorreram as falhas: em alguns casos, a gestante iniciou o pré-natal tardiamente. Além de motivos da própria gestante e do parceiro, ela não foi “captada” pela equipe de saúde da família. Existem municípios cuja cobertura das equipes de saúde da família é pequena e não atinge muitos povoados, afetando na captação das gestantes e parceiros. Às vezes o próprio diagnóstico da gravidez é tardio por falta de acesso aos exames de gravidez. Também dificuldades na agilidade dos exames do pré-natal (agora devido à REDE CEGONHA, os municípios terão o teste rápido para HIV e Sífilis). Com grande frequência, verifiquei falhas no tratamento da gestante com sífilis e sem o parceiro ser submetido também ao tratamento. São falhas de atitude dos profissionais de saúde. O mais grave problema da Sífilis Congênita está em Aracaju.
4 – Em muitos municípios que frequento para ministrar palestras educativas, verifico que existem camisinhas sobrando nas unidades de saúde. Os profissionais de saúde dizem que “as pessoas não querem usar camisinha”.  Eu sempre questiono: o que as equipes de saúde da família estão fazendo para reverter esta situação? Os agentes de saúde estão levando camisinhas na sua sacola e conversando com as famílias sobre a vulnerabilidade às DST/AIDS? Nem sempre fazem. O diagnóstico tardio da AIDS também é um problema nos municípios, principalmente de pequeno porte. A Secretaria de Estado da Saúde capacitou os municípios para a realização  do teste rápido de Sífilis e AIDS. Mais de vinte municípios não enviaram  profissionais de saúde para a capacitação. Falta de interesse? A Secretaria de Estado da Saúde estará disponibilizando, aos municípios, uma unidade móvel, com apoio da Viação Tropical,  para a realização dos testes rápidos nos locais de difícil acesso das populações mais vulneráveis.

BOA ESCOLHA DOS SECRETÁRIOS DE SAÚDE É FUNDAMENTAL
O sucesso da gestão do Prefeito com relação à Saúde Pública depende inicialmente da escolha de um bom Secretário de Saúde. Para mim, bom secretário é aquele que demonstra compromisso, conhecimento da realidade local e disposição para trabalhar e que tenha descido do palanque eleitoral. Alguns secretários permanecem no palanque e só querem atender às demandas dos que votaram no prefeito. Que não seja apenas uma pessoa que tenha sido cabo eleitoral na última campanha ou que seja apenas uma pessoa da família ou  que o prefeito goste. Sem querer desmerecer a atividade de porteiro, mas em uma determinada cidade de Sergipe, em anos anteriores, o prefeito escolheu o porteiro da prefeitura para ser seu Secretário da Saúde e ficou difícil dialogar com essa pessoa sobre os problemas de saúde do município. Às vezes a indicação é de um partido aliado e que o próprio prefeito não gosta e, consequentemente, não vai dar apoio.
Resta torcer para que os novos prefeitos indiquem Secretários de Saúde que correspondam às expectativas de suas propostas e dos anseios da sociedade. É importante que os secretários valorizem ações de prevenção, isto é, que se comprometam com ações que impeçam ou dificultem as pessoas ficarem doentes.
Os municípios precisam estar bem articulados para que os serviços de saúde de uma região sejam eficientes para toda a população. Deve existir compromisso dos prefeitos para com a saúde não apenas em seu município, mas em sua região, já que a população não usa os serviços de saúde apenas em seu município.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais