Dois Livros sobre a Mesma Saga

A figura de Virgulino Ferreira da Silva, de sua mulher Maria Bonita, e dos rapazes que formaram um pequeno exército popular no sertão nordestino, continuam despertando interesse de estudos, como são exemplos os lançamentos dos livros LAMPEÃO O MATA SETE, de autoria de Pedro de Morais, e BONITA MARIA DO CAPITÃO, assinado por Vera Ferreira e por Germana Gonçalves de Araújo. Os dois livros demonstram a atualidade do ciclo do cangaço, que em parte se desenvolveu em Sergipe, com a participação de sergipanos e sendo o local da morte do temido cangaceiro. Outros sergipanos escreveram livros sobre Lampeão, sendo que dois deles se transformaram em clássicos: LAMPEÃO, de Ranulfo Prata e LAMPEÃO, O ÚLTIMO CANGACEIRO, de Joaquim Goes. Mais recentemente Alcino Costa vem realizando pesquisas e publicando livros, fornecendo informações privilegiadas, colhidas da sua própria vivência no sertão sergipano.

O livro de Pedro de Morais está no centro de uma questão judicial. Uma liminar suspendeu o lançamento do livro LAMPEÃO O MATA SETE, que depende ainda de julgamento no Tribunal de Justiça. Tirando o problema jurídico, ou mesmo por conta dele, houve uma grande expectativa pelo lançamento do instigante livro de pedro de Morais, que é um Juiz de Direito aposentado, interessado na pesquisa sobre o cangaço, que saiu pelo interior nordestino a ouvir vestígios de história e a anotar fatos narrados por muitos personagens que circularam no ambiente instigante de duas décadas, mais que outras, e que guardaram memória, conotada, dos fatos. Sem entrar no mérito das afirmações e suposições que o livro provoca no leitor, não se pode negar que é um texto bem elaborado, que certamente sucitará amplo debate, cuja amostra já vimos nas mídias nacionais.

O livro sobre Maria Bonita reune uma pesquisadora – Vera Ferreira – responsável por muito da imagem do cangaceiro e de sua mulher,  e uma professora – Germana Gonçalves de Araujo -, da Universidade Federal de Sergipe, é bonito, bem editado, e certamente terá boa acolhida da crítica e dos leitores. Maria Bonita, diferentemente de Lampeão, deixou uma imagem lúdica, de uma companheira solidária, que parecia ser o ponto de equilíbrio do grupo errante que varrou as catingas de Sergipe e dos demais Estados nordestinos. Neste sentido os dois livros são antagônicos e provocarão, sem dúvida, acirrado debate, do qual parte já fluiu na mídia local e nacional. O livro de Pedro de Morais provoca reações diversas, pelo que contém de ótica nova na visão do ciclo do cangaço. O livro de Vera e Germana tem outra direção, e quer resgatar a individualidade de Maria Bonita e seu papel, inclusive estético, entre os rapazes do bando.

Ranulfo Prata, nascido em Lagarto, escritor consagrado por obras como NAVIOS ILUMINADOS, foi quem primeiro escreveu, em livro, sobre Lampeão. Como todos os livros que tratam do cangaço, o livro de Ranulfo Prata – LAMPEÃO – é partidário, repleto de adjetivos, parecendo repetir Silvio Romero quando em Estância, em 1874, deu notícia de que estava por alí o célebre Antonio Conselheiro, então conhecido como Antonio dos Mares. Com a fama e a consagração pela sua obra ficcional, Ranulfo Prata deu legitimidade ao seu livro, que no correr do tempo apequenou-se, passando quase a ser um documentário sem a análise e a reflexão que os fatos ensejavam e ainda ensejam hoje, quando a temática parece ainda não esgotada.  O livro LAMPEÃO, de Ranulfo Prata, foi lançado anos antes da morte do Capitão Virgulino, e envelheceu como fonte, substituindo or centenas de outras contribuições, que ainda surpreendem, na atualidade. O próprio Alcino Costa, morador de poço Redondo, cenário de visitas e da morte de Lampeão, acaba de ter seu terceiro livro sobre o assunto, publicado pela Editora do Diário Oficial.

Joaquim Gois, sertanejo das bandas de Simão Dias, foi Investigador de Polícia, e integrante das Forças Volantes, formadas para  combater Lampeão, então protegido de coiteiros, homens indinheirados, que pagavam proteção e amizade. Com sua experiência escreveu um livro – LAMPEÃO O ÚLTIMO CANGACEIRO – editado em 1963, pela SCAS – Sociedade de Cultura Artística de Sergipe. É um clássico sobre o cangaço, pela construção da narrativa, elaborando páginas antológicas de literatura. Mas é duro com Lampeão, adjetivado, muitas vezes, de sanguinário. O livro de Joaquim Gois é hoje uma raridade bibliográfica, disputada nos sebos do Brasil e desconhecido de muitos interessados, principalmente no capítulo sobre Maria Bonita, que ele escreve com conhecimento de causa, por ter localizado a família da mulher de Lampeão. Há, ainda, um livro inédito de autoria do Padre Artur Passos, vigário de Porto da Folha, que rezava missa mensal em Poço Redondo, quando chegou Lampeão e seus rapazes, assistiram missa, conversaram, discutiram, deixando uma forte impressão no Padre. Ao final do encontro, Lampeão entregou ao Padre uma folha de papel pautado, com o nome dos rapazes do Grupo, suas idades e apelidos, e com uma declaração na qual o Capitão Virgulino acusava as Forças (Volantes) pelas atrocidades cometidas em seu nome.  E datou: 29 de abril de 1929.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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