Economia, Guerra e Moda

Andreza Maynard

Doutoranda em História/Unesp

Membro do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)

Imagem: Maio de 1940 em Londres. Fonte:QUÉTEL, Claude. As mulheres na guerra, 1939-1945. Trad. Ciro Mioranza. São Paulo: Larrouse do Brasil, 2009, p.39. 

Entre 1939 e 1945 a rivalidade política entre as grandes potências se refletiu no enfrentamento nos campos de batalha, mas também numa adaptação geral àquele momento espinhoso. O fornecimento de matérias-primas e a produção industrial ficaram comprometidos em várias esferas. Até mesmo a moda teve que lidar com dias difíceis, o que não quer dizer que o setor tenha deixado de existir.

No mundo ocidental, os países europeus sofreram mais intensamente com as mudanças impostas pela Guerra. A batalha da produção era crucial para ajudar os países a atingirem seus objetivos. Nesse sentido, a Alemanha foi a primeira a racionar os produtos têxteis. Em pouco tempo a maior parte da população alemã passou a conseguir uma roupa diferente por meio da troca, não mais pela compra de um vestido ou casaco.

As restrições têxteis descontentaram a população na Grã-Bretanha. Para manter sua tradicional elegância, as inglesas fizeram várias adaptações em seu vestuário. Por exemplo, as meias de seda eram um artigo comum ao dia-a-dia, mas elas praticamente desapareceram durante a Guerra. E já que uma inglesa respeitável não ousaria sair com as pernas “nuas”, mesmo durante o verão, uma solução encontrada foi colorir as pernas com uma tinta à base de cebola e depois desenhar uma falsa costura com um lápis de sobrancelha, conforme é possível observar na imagem acima.

Na França as meias de seda também escassearam, dando margem à utilização de “meias falsas”, bem como fomentou a criação de um “mercado negro” que comercializava as verdadeiras meias de seda a preços altíssimos. Em países como a Grã-Bretanha e a França, a Guerra estimulou novas expressões no mundo da moda.

Simone de Beauvoir tinha 32 anos em 1940. Ela vivia em Paris com seu companheiro Jean-Paul Sartre, quando até mesmo os chapéus se tornaram um artigo raro e obviamente caro. Nesse período sair sem chapéu era considerado um hábito de mau gosto. Simone de Beauvoir conta que em virtude da dificuldade para conseguir novos chapéus, os turbantes se tornaram moda. A filósofa disse que passou a adotar os turbantes e que manteve hábito depois da Guerra, pois o acessório lhe caía bem.

O quase desaparecimento do couro, um componente aparentemente indispensável à fabricação de sapatos, fez surgir os solados de madeira. Em pouco tempo os calçados com sola de madeira se tornaram moda. A novidade também se tornou um item desejado pelas mulheres no continente americano.

Nos editoriais de moda das revistas ilustradas que circulavam no Brasil à época, a exemplo de O Cruzeiro, Fon Fon e Vida Doméstica, é possível notar mudanças no vestuário, sobretudo no feminino. Os turbantes e os calçados com solado de madeira são exibidos no corpo de modelos que parecem bonecas. Elas são tão perfeitas e sorridentes, que nem de longe lembram a Guerra em curso. A mensagem visual que elas passam é a de que são felizes. E a propaganda induzia as leitoras a acreditarem que o contentamento vinha do uso dos trajes e acessórios, que estavam disponíveis nas lojas.

A experiência do Brasil com a Segunda Guerra Mundial teve suas particularidades. Mas as mudanças no vestuário, em virtude da Guerra, foram experimentadas por vários países. Em alguns casos, as alterações na economia dos países se traduziam também numa mudança de comportamento. Como não lembrar dos extravagantes turbantes de Carmen Miranda? Afinal de contas, em tempos de guerra ou de paz, um afago na aparência levanta a moral de qualquer um.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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