ÉTICA E O BEM COMUM

A palavra ética significa por em prática os valores que foram escolhidos por uma pessoa ou um grupo de pessoas, considerando-se também que todos os atos humanos são primeiramente gerados no pensamento e depois postos em prática e, “via de regra, têm um contexto relacional, ou seja, são atos que se realizam em função do relacionamento com o outro ou com os outros” (1).

 

Há alguns meses conheci, em um trabalho que nossas instituições realizaram juntas, um jovem administrador cearense chamado Egidio Guerra (2) e desse encontro aprendi, ao acompanhar um jogo experiencial utilizado pelo mesmo, a observar um processo bastante sutil chamado “ética do interesse próprio”. Ou seja, é um processo que só acontece quando proporcionamos algo a outra pessoa porque é do nosso interesse fazê-lo. E essa ética do interesse próprio é muito comum hoje em dia no mundo organizacional quando as empresas, por exemplo, se preocupam com os empregados, com a qualidade, com o bem estar da comunidade e tudo o é feito para terceiros (comunidades, instituições e etc) – única e exclusivamente – quando todas essas ações têm apenas por sustentação aumentar o lucro da empresa.

 

Constatamos continuamente em revistas e em jornais milhares de propagandas dessas empresas. Todavia, vale salientar que o que estou afirmando agora não pode nem deve ser considerado como uma regra geral, apenas sabemos que muitas dessas propagandas não são tão verdadeiras quanto se apresentam. Vale a pena salientar que não estamos querendo afirmar que uma empresa não precisa ter lucros, ou se programar para telo; é claro que precisa, é tendo lucro que ela remunera o capital investido e poderá – se quiser – reservar uma parte desse lucro para os seus programas sociais. O errado nesses procedimentos é quando essa tal “responsabilidade social“ é desenvolvida ou até mesmo aplicada com o intuito de vender mais ou sensibilizar os clientes.

 

Voltando ao jogo, um aspecto similar e destacado pelo jovem Egidio no referido jogo, que na verdade era bastante simples, pois se tratava de tirar um chocolate em uma caixa estrategicamente posta no cento de um circulo de pessoas e cada participante do círculo teria que oferecer o chocolate a uma determinada pessoa que estava também no circulo e explicar o motivo do oferecimento. A ação por trás de tudo, pelo que percebi, era justamente observar as possíveis relações de poder que se tornavam transparentes nesse momento e para quem eram dados (ou ofertados) os chocolates. Parece uma coisa bastante tola, mas ao final observando o processo constatamos que realmente não só se estabelecia uma sutil rede de poder (3), mas principalmente – parecia mesmo – que alguns chocolates eram entregues justamente com a finalidade de se obter como conseqüência algum mérito.

 

A escola de Chicago e do capitalismo do laissez-faire prega que a responsabilidade social da empresa consiste única e exclusivamente em aumentar o seu lucro e maximizar os seus negócios (4). Logo, tudo o que é feito na empresa visa única e exclusivamente se atingir esse objetivo; desde que – evidentemente – esteja “coberto” pela lei.

 

Todavia, quando falamos na ética orientada para os outros se muda circunstancialmente de contexto porque a meta é bastante diferente já que “se tem por objetivos à valorização do outro para o benefício do todo”.

 

Há alguns anos a FBC presta consultoria a um empresário sergipano que utiliza muito bem esse processo. A cada ano fazemos um seminário de fim de semana com os seus empregados e é patente a transformação interna dos seus empregados e também o quanto a sua empresa prospera como conseqüência. Daí se constata que o objetivo principal desse empresário não é o lucro apenas, e o lucro vem naturalmente como conseqüência de um trabalho muito cuidadoso, estruturado, respeitoso e digno.

 

Hoje em dia já consigo observar uma luz no fim do túnel e constato que empresários de “mente aberta” estão – cada vez mais – optando por esse caminho o qual parecem para muitos outros que se consideram “preparados e certos” inexplicável e confuso. A ética do bem comum tem como princípio fundamental à certeza de que “ao se fazer outra pessoa feliz, vou me realizar e ao me realizar me sinto feliz e ao me sentir feliz contamino de felicidade tudo o que está à minha volta”. Portanto, trata-se na verdade de uma grande teia que vai se disseminando paulatinamente.


Ou seja, o que estabelece a ética do bem comum é que à medida que os outros crescem, todo o grupo cresce e conseqüentemente toda a empresa cresce ou toda a comunidade cresce. Como diferença constato que a minha realização, portanto, depende da realização da comunidade e da realização de cada membro dessa comunidade. Na verdade o que estou construindo é uma rede de felicidade em torno de mim que irá se expandindo atingindo outras pessoas e aumentando o nível de felicidade à minha volta.

 

Pode ser um sonho, pode ser utopia, mas isso pode perceber e comprovar acontecendo em pequena escala e se é verdadeiro em pequenas escalas poderá ser verdadeira em grandes escalas, é necessário apenas que as pessoas sejam e permaneçam contaminadas por esse processo.

 

(1) – Peter Nadas – Ética na Administração – in Coletânea de Textos: Responsabilidade e Balanço Social – FIES , SESI FIDES, IBASE, setembro 2004.

(2) – Administrador, Coordenador da Instituição “Empreendedores de Sonhos”, Fortaleza, CE.
(3) – Por exemplo, a agilidade em ir para o centro para tirar um chocolate e oferecê-lo ao chefe imediato, ou a um outro graduado…
(4) – Milton Friedman

 

* Fernando Viana é diretor presidente da Fundação Brasil Criativo
presidente@fbcriativo.org.br

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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