Não obstante a expressa garantia constitucional, o direito de greve dos servidores públicos continua inefetivo, a despeito de seu status de direito fundamental.
A inefetividade pode ser examinada em fases: a fase inicial após a promulgação da Constituição, ausente lei regulamentadora, e a fase pós-decisão do STF nos mandados de injunção n° 670, 708 e 712.
A) A fase inicial: a ausência de lei regulamentadora
A interpretação majoritária, tanto em doutrina como jurisprudência – em especial do Supremo Tribunal Federal – era no sentido de inexistência do direito de greve dos servidores públicos enquanto não editada a lei regulamentadora. Noutras palavras: a norma constitucional do Art. 37, VII era norma de eficácia limitada.
Isso não impediu que diversas categorias de servidores públicos deflagrassem movimentos paredistas, o que gerou enormes conflitos que chegaram muitas vezes a situações de grande tensão. Tais conflitos naturalmente desembocaram no Poder Judiciário.
Tornou-se muito comum a seguinte situação: servidores públicos se viam na necessidade de deflagrar o movimento grevista, diante da falta de estabelecimento de canais efetivos de negociação salarial e negociação por melhores condições de trabalho (a propósito, é importante registrar que o ordenamento jurídico brasileiro não prevê mecanismos efetivos de negociação coletiva entre servidores públicos e o Poder Público – como ocorre normalmente no âmbito das relações contratuais de emprego, por via de convenções coletivas, acordos coletivos e dissídio coletivo – tendo em vista a exigência constitucional de que qualquer vantagem remuneratória, como de resto qualquer regramento da vida funcional dos servidores públicos, deve ocorrer por meio de lei formal). Ou seja: realizava-se a greve como um instrumento de pressão política sobre o governo, na tentativa de chamar a atenção da sociedade para o problema e da necessidade de a sociedade acompanhar com maior atenção – porque beneficiária direta dos serviços públicos prestados – a problemática envolvida, a necessidade de uma melhor valorização dos servidores, porque isso teria, como decorrência lógica, a valorização e a melhor prestação do serviço público para essa mesma sociedade.
Os entes públicos envolvidos, em especial Estados e Municípios, mas também a União, diante de movimento grevista de seus servidores públicos, acionavam o Poder Judiciário, em pelo menos duas direções: a) pedir o reconhecimento da ilegalidade da greve, tendo em vista a ineficácia da norma constitucional que garante o seu exercício pelos servidores públicos enquanto não editada a lei específica a que se refere o dispositivo constitucional correlato (inciso VII do art. 37); b) pedir a concessão de medida liminar ou de antecipação de tutela para determinar o imediato retorno ao trabalho e o fim da greve, com requerimento de aplicação de multa diária aos respectivos sindicatos, como meio processual de coerção para o retorno imediato às atividades.
Em diversas ocasiões, os juízes de primeira instância e tribunais de justiça dos Estados acolheram esses pedidos, inviabilizando a efetividade da greve dos servidores públicos.
Na próxima semana, continuaremos a série de textos sobre a difícil concretização do direito de greve dos servidores públicos, abordando o julgamento, pelo STF, dos Mandados de Injunção n° 670, 708 e 712, em que tomou a decisão de que enquanto não for elaborada a lei específica, os servidores públicos poderão exercer o direito de greve, nos termos e limites tomados de empréstimo, por analogia, da Lei nº 7.783/89, que regula a greve no âmbito dos trabalhadores em geral.